Meu Nome é Gal reverencia uma das maiores vozes da música brasileira, mas resultado final soa acanhado

Longa brilha com Sophie Charlotte e acerta ao evidenciar a transformação da tímida Gracinha na imponente Gal Costa

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Em cena, Sophie Charlotte, intérprete de Gal, canta "Divino Maravilhoso". (Foto: Stella Carvalho/Divulgação).
Meu Nome é Gal reverencia uma das maiores vozes da música brasileira, mas resultado final soa acanhado
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Meu Nome é Gal
Dandara Ferreira e Lô Politi

Brasil, 2023, 1h30, 16 anos. Distribuição: Paris Filmes
Com Sophie Charlotte, Dan Ferreira e Rodrigo Lelis
Em cartaz nos cinemas

Muito além de uma das maiores vozes da música popular brasileira, Gal Costa (1945-2022) foi uma força da natureza. Vendaval que, por onde passou, arrastou tudo ao redor, mas também chama que permanece ardendo em muitos corações. É por isso mesmo que qualquer projeto que se proponha a retratar uma artista dessa magnitude já vem naturalmente envolto de desafios e cercado de grandes expectativas por parte do público. É nessa atmosfera que Meu Nome é Gal, cinebiografia dirigida por Dandara Ferreira e Lô Politi, estreia nesta quinta (12).

Justamente para capturar a grandeza da cantora, que na trama é vivida pela atriz Sophie Charlotte, o longa foge do lugar comum das produções do gênero. Em vez de tentar inserir em poucas horas de tela praticamente toda a vida da biografada, faz um recorte justo dos anos iniciais da carreira de Gal. É uma escolha que se demonstra acertada, sobretudo quando se leva em consideração a proposta inicial de celebrar seu legado ainda em vida. Afinal, quando Gal faleceu, em novembro do ano passado, as gravações já tinham acontecido.

Com início em 1966, ano em que Gal chega ao Rio de Janeiro, o filme passeia pela vida e sucessos da cantora desde seu primeiro disco, Domingo (1967), com Caetano Veloso, até 1971, quando apresenta o revolucionário espetáculo Fa-tal – Gal a Todo Vapor durante os anos de ditadura militar. Desde o primeiro momento, fica evidente a trajetória de transformação da tímida e reservada Maria da Graça Costa Penna Burgos, ou Gracinha como era carinhosamente chamada, para a imponente Gal Costa, ícone daquele que viria se tornar o maior movimento da contracultura na época.

Portanto, o filme assume também o compromisso de recriar o clima de desbunde que caracterizou esse breve, porém efervescente, período da Tropicália, destrinchando também a relação de Gal Costa com Gilberto Gil (Dan Ferreira), Caetano Veloso (Rodrigo Lelis), Dedé Gadelha (Camila Márdila), o poeta Wally Salomão (George Sauma) e Maria Bethania. Embora esta última, vivida pela diretora Dandara Ferreira, apareça timidamente em cena.

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Sophie Charlotte e Rodrigo Lelis, intérpretes de Gal Costa e Caetano Veloso, posam para a capa de Domingo. (Foto: Stella Carvalho/Divulgação).

O problema é que o tratamento dado faz a trama carecer de sentimento e nuance. Através de uma montagem que mescla as cenas com imagens de arquivo da ditadura para contextualizar a época, o tempo do filme fica corrido e a sensação é de que o peso do período nunca é plenamente transmitido e, consequentemente, o significado de Gal e de suas canções e performances sobre a música e sobre o comportamento da época não chegam a ser completamente evocados. Muitas vezes, aliás, a cantora parece meramente orbitar em torno dos colegas do Tropicalismo, sobretudo Caetano.

Apesar disso, Meu Nome é Gal consegue oferecer momentos de sensibilidade e beleza. Neste aspecto, o que se destaca é a participação de Chica Carelli como Mariah, mãe de artista, que divide com Charlotte as cenas que evocam uma maior intimidade e fragilidade e exploram os dilemas de Gal para além da persona artística. Também merece menção a cena em que Gil põe a amiga embaixo do chuveiro e acalanta uma Gal amedrontada e paralisada diante da vida.

O fato é que, do início ao fim, fica evidente que o longa não seria o mesmo sem o protagonismo de Sophie Charlotte. A interpretação da atriz imprime força em uma narrativa que muitas vezes soa plana e superficial e, embora sua potência vocal não se equipare à de Gal, ela arrepia em cena quando empresta sua própria voz para entoar canções como o hit “Divino Maravilhoso“.

A sensação final, porém, é de que a trama não alcança seu potencial máximo e quando, enfim, parece chegar lá, é interrompida por um final abrupto e pouco satisfatório. De toda forma, apesar dos deslizes, Meu Nome é Gal consegue ainda assim reverenciar e homenagear uma das maiores cantoras da música brasileira. Sem exatamente entusiasmar, o filme deve emocionar. Para quem mal via a hora de matar a saudade da artista, fica o recado: prepare-se para segurar as lágrimas.

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