A Moranga Sagrada
J.C. Marçal
Cepe Editora, 110 páginas, R$ 45,00 | 2024.
Com A Moranga Sagrada, publicado pela Cepe Editora, o escritor pernambucano J.C. Marçal apresenta uma coletânea de onze contos que, de forma poética e reflexiva, abordam os desafios da pós-modernidade. A obra reúne temas como empoderamento feminino, tecnociência, os impactos da pandemia, a memória da ditadura militar e o papel da arte em momentos de crise, configurando-se como um trabalho literário robusto e sensível, que conecta diferentes perspectivas sobre o mundo contemporâneo.
O título do livro, extraído do conto Obá, reflete a simbologia presente em toda a coletânea. Nesta narrativa, a protagonista enfrenta reflexões sobre os limites e o poder da linguagem, evocando a figura de Lélia Gonzalez como um símbolo de inspiração e resistência.
Entre os contos mais marcantes, destacam-se “Tortura e Fezes“, que revisita os horrores da ditadura militar, reforçando a relevância da preservação da memória histórica como uma forma de prevenir o retorno de regimes autoritários, e “Nós, os Infectados“, escrito sob o impacto da pandemia de covid-19, que explora a arte como alicerce para superar momentos de adversidade.

J.C. Marçal demonstra habilidade ao equilibrar uma escrita sofisticada com narrativas de intensa carga emocional. Seus contos conseguem ser profundamente filosóficos sem perder a conexão com temas universais, como a solidão, a busca pelo sentido da vida e a relação entre tecnologia e humanidade. O conto “O Caligrafista“, por exemplo, reflete sobre a escrita manual e sua relevância em um mundo cada vez mais digital, oferecendo uma perspectiva nostálgica das transformações culturais.
A riqueza da obra reside em sua capacidade de transitar entre diferentes referências culturais e artísticas, sem deixar de abordar questões contemporâneas de maneira incisiva. O autor constrói um panorama que dialoga tanto com o passado quanto com o presente, incitando reflexões fundamentais sobre os rumos da sociedade. Sua prosa mantém o leitor cativado ao longo da leitura.
A Moranga Sagrada reafirma o papel da literatura como espaço privilegiado para questionamento e transformação. J.C. Marçal entrega uma obra madura e relevante, que não apenas provoca reflexões, mas também desperta emoções. O autor cumpre, assim, a função de instigar o leitor a observar criticamente o mundo ao seu redor e a engajar-se com as complexidades da sociedade contemporânea.
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