Entrevista You Can’t Win, Charlie Brown

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MELANCOLIA COLORIDA E SINCERA
A ausência de um conceito musical pré-definido e a junção do formato acústico e electrônico norteia o espírito da banda lisboeta

Por Pedro Salgado
Colaboração para a Revista O Grito!, em Lisboa
Foto de Pedro Gaspar e Nuno Souza Dias

Acompanhados, desde o começo, por uma estética solitária e triste, o núcleo central da banda, composto por Salvador Menezes e Afonso Cabral, buscou inspiração num livro de Peanuts, batizando o projecto lisboeta como You Can´t Win, Charlie Brown. Os músicos Luís Costa, David Santos, João Gil e Tomás Sousa completam o elenco.

Em Junho de 2009 compuseram o tema “Sad Song”, integrado na compilação de novos talentos da FNAC e a escalada ascencional do grupo assentaria em shows bem sucedidos, proporcionando a gravação, um ano mais tarde, de um EP para a série Optimus Discos. No final de uma actuação, na Music Box, de Lisboa, o atento e prolífico Mário Feliciano ofereceu-se para produzir o pimeiro disco do conjunto.

A originalidade e o edifício sonoro erguido pelo You Can´t Win, Charlie Brown, também não passou desapercebido, em Maio deste ano, aos públicos do Lock Tavern, em Londres e do The Great Escape Festival, em Brighton. Por largos momentos, os celulares desligaram-se, as conversas de circunstância pararam e as atenções voltaram-se totalmente para a energia produzida em palco. O álbum de estreia “Chromatic” e o hype da banda proporcionaram uma conversa com a Revista O Grito! , em Lisboa.

Quais foram as ideias fortes que estiveram na base da composição do álbum Chromatic?
A ideia foi sempre, como tem sido desde o princípio, fazer canções de que nos orgulhemos e dêem gozo. Nunca houve um conceito associado, de fazer um determinado tipo de música ou ter uma sonoridade parecida com outra banda. Quisemos conceber algo que sentíssemos que fosse nosso e bem feito. Essa noção implicava estar ao nível dos discos que gostamos de ouvir, ou seja, era o oposto do bom para quem está a começar ou para Portugal. É lógico que, quando os temas foram criados, apareceram novos pormenores e, a certa altura, percebemos que o objetivo era produzir algo que misturasse o acústico e o electrônico. O conceito surgiu naturalmente quando juntamos as bases que tinhamos e trabalhamos as que faziam mais sentido para o álbum. Havia a vontade de que o trabalho fosse coeso e tivesse alguma lógica. As músicas é que indicaram o caminho que nós deviamos seguir.

O single “Over The Sun / Under The Water” tem diversos sons interessantes e algumas harmonias vocais que lembram Simon & Garfunkel. Como é que conjugaram os vários elementos musicais ?
A música apareceu quando experimentávamos sons no computador e a primeira parte que surgiu foi uma componente electrônica de arpejo sempre em loop. A partir daí tentamos construir uma canção em torno dessa ideia e fizémos as harmonias de vozes. E talvez se possam encontrar nesses elementos o lado mais Simon & Garfunkel. Uma vez mais procuramos juntar o acústico com o electrônico. Sabíamos que não queriamos fazer um disco só com programação e como esse tema, na sua base, tinha essa componente, juntámos os motivos acústicos para o complementar e ficar dentro do espírito do Chromatic.
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“I´ve Been Lost” descola um pouco da habitual melancolia associada ao disco e ao vosso imaginário. Concordam?
Esta música foi composta pelo Afonso sozinho em casa. Inicialmente, era um tema muito melancólico, o mais de todos, só com guitarra e voz. Depois foi transformado, ficando na versão que está no disco. Se calhar descola um pouco das outras canções, propositadamente, porque queriamos que fosse uma música mais luminosa, que puxasse mais pelas pessoas. Se escutarmos bem, ela não é assim tão feliz quanto isso. Acaba por ser uma melodia bastante lenta sobre uma batida rápida e forte, com um final mais acelerado. Se retiramos esses elementos, a canção é mesmo melancólica.

Como encaram o fato do You Can´t Win, Charlie Brown ter despertado as atenções da crítica estrangeira ?
É ótimo. Nós lemos essas coisas, ficamos contentes, agimos com naturalidade e aproveitamos as oportunidades que nos são proporcionadas. A crítica da “Les Inrockuptibles” surgiu pouco depois de actuarmos no festival The Great Escape, em Brighton (Inglaterra), que é uma espécie de versão europeia de South by Southwest, com mais de 300 bandas. Um jornalista dessa revista francesa viu o nosso show, gostou e publicou uma notícia. Quase caímos para o lado (risos). Não podemos responder pelo interesse despertado, a música fala por si e felizmente tem qualidade suficiente para merecer atenção.

Sentem, de algum modo, que repescaram o indie internacional e lhe deram um cunho português?
Nunca pensámos nisso, nem na tal saudade do fado de que falam. Se está lá é porque existe em nós. Da mesma forma que dizemos não existir um conceito sonoro para as músicas, no disco, também não houve uma preocupação de ter, para cada canção, um conceito português, se é possível falar assim. Fazemos música inspirados no que ouvimos desde que nos conhecemos e isso engloba bandas inglesas, americanas e portuguesas. O produto dessa mistura define-nos enquanto músicos e compositores. Se isso transparece no nosso trabalho é óptimo e significa que conseguimos trazer para a nossa arte aquilo que aprendemos ao longo dos anos.

Numa entrevista recente, referiram que “Pretendem fazer algo atual e que tivesse a ver com o que se está a passar no mundo”. Para onde vão levar esse conceito ?
Fazer algo atual é tão simples como conceber algo que não seja datado. Temos muitas músicas guardadas para futura edição, mas a maneira como as vamos fazer ou usar, no futuro, ainda não está estabelecida. Uma coisa que seguramente não pretendemos é repetir ideias. É provável que os nossos próximos trabalhos tenham elementos diferentes, acompanhando o que for acontecendo. Mas, é complicado explicar para onde irá o conceito da banda, porque nem nós sabemos.