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Quadrinhos distópicos de Guido Buzzelli finalmente chegam ao Brasil

A antologia HP traz histórias de ficção científica que revelam a obsessão do autor italiano por universos pós-apocalípticos

Quadrinhos distópicos de Guido Buzzelli finalmente chegam ao Brasil
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HP
Guido Buzzelli
Comix Zone, 184 páginas, R$ 134,90, 2023.
Tradução de Fernando Paz

Imagine uma HQ de faroeste como o clássico gibi Tex misturada com um filme de ficção científica distópico tipo a série Mad Max. Isso é o que você vai encontrar no álbum publicado pela Comix Zone HP, de autoria do quadrinista italiano Guido Buzzelli. Falecido em 1992, Buzzelli deixou uma vasta obra em colaboração com revistas, sobretudo francesas, como Circus, Pilote, Métal Hurlant e À Suivre, e se destaca entre os grandes mestres da ilustração,por ter sido precursor do movimento dos quadrinhos independentes.

Buzzelli criou por conta própria, em 1966, a HQ La Rivolta dei Racchi (A Revolta dos Hediondos) e a ofereceu a diversos editores que não entenderam muito bem sua proposta. No entanto, ele foi acolhido pela revista Charlie Mensuel e, a partir de então, teve seu trabalho reconhecido como um autor que buscava não se submeter a vontade do mercado editorial. Essa escolha, porém, teve um preço, pois Buzzelli nem sempre conseguiu sobreviver de sua arte e morreu quase esquecido.

Revisitar a obra de Buzzelli é, portanto, uma excelente oportunidade para conhecer um autor cuja originalidade é incontestável, tanto no traço dos seus desenhos, quanto nas impressionantes histórias reveladoras de uma imaginação efervescente. Desde muito jovem, Buzzelli era admirador do gênero ficção científica. E quando trocou a pintura pelo desenho, boa parte do que produziu seguiu esse caminho. Neste volume da Comix Zone, estão compiladas três histórias que ilustram com perfeição o talento de Buzzelli: HP, Morganna e Ressurreição, produzidas entre 1973 e 1984 e totalmente inéditas no Brasil.

Guido Buzzelli.
Retrato de Buzzelli por Graziano Origa. (Reprodução).

A primeira delas, HP, com roteiro de Alexis Kostandi, tem como cenário um mundo pós-atômico, onde bandos de sobreviventes rebeldes vivem da caça e rapinagem dos destroços da guerra. Usam cavalos para se deslocarem e carcaças de carros velhos como carruagens. Eles, no entanto, moram próximos a uma cidade ultramoderna dirigida por uma oligarquia formada por militares e cientistas. A cidade tem barreiras de proteção e seus dirigentes combatem os exilados e, para atrai-los e controlar os seus movimentos, lançam um cavalo robô como isca para atacá-los com armas químicas.

HP (Horse Power) reúne os temas que compunham as obsessões de Buzzelli pelos universos pós-apocalípticos, as sociedades decadentes, os corpos deformados e monstruosos, ou seja, mundos alternativos, mas com uma visão bem pessoal na qual ele denuncia de forma contundente e vigorosa o quanto a sociedade é propensa a massacrar os indivíduos que não se enquadram nos padrões que ela determina. Vale lembrar que Buzelli foi desenhista de um número especial da famosa revista de faroeste italiana Tex e HP é como se a histórica revista, criada em 1948 por Gian Luigi Bonelli e o desenhista Aurelio Galleppini, fosse invadida por caubóis futuristas.

Morganna, com roteiro de Daniela Vianello, mistura ficção científica com esoterismo e também um toque de erotismo. A protagonista é uma jovem bruxa de olhos de réptil, frívola e irreverente, que faz feitiços medievais num mundo retrô-futurista. Nessa história o desenho é carregado de expressividade e Buzzelli une o realismo ao fantástico com um desenho dinâmico e carregado de sensualidade, construindo uma narrativa onírica em um mundo alucinado de visões ambíguas e inesperadas.

A terceira HQ da série – Ressurreição – é a mais curta das três, mas que retrata, talvez, de forma mais exata a visão pessimista de Buzzelli com relação a natureza do ser humano. O desenho é rude, carregado de sombras e os primeiros planos se destacam pela agressividade das figuras realçados pelo preto e branco para mostrar uma trama curta e trágica sobre um sobrevivente de uma experiência de congelamento de corpos.

Esses trabalhos, todavia, são apenas uma porta de entrada para a obra de Buzzelli que é vastíssima. Apesar de sua formação clássica, ele tinha uma visão iconoclasta do mundo e o estilo do desenho das figuras humanas e das figuras híbridas de humanos e animais lhe valeu a designação de Michelângelo dos Monstros. Suas histórias mais conhecidas, entre outras, são O Labirinto (1970), Zil Zelub (1972), Annalisa e o Diabo (1973), L’Agnone (1977), A Guerra Videológica (1978) e Zasafir (1985). Em 1973 ele foi agraciado com o prêmio Yellow Kid no festival Lucca Comics, na cidade de Lucca, na Itália.

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