Bate-papo com Getúlio Abelha, o forrozeiro que mistura Calcinha Preta e cultura pop, atração do Balbúrdia

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O cantor está ganhando fama no Brasil inteiro com um jeito inusitado de refazer o ritmo nordestino (Foto: Jonatan Oliveira)

O cantor Getúlio Abelha é um dos nomes de prometem agitar a festa Balbúrdia, uma parceria entre o Festival Rec-Beat e a Terça do Vinil, com estreia neste sábado (28), a partir das 22h, reunindo ainda Heavy Baile, Shevchenko e Elloco, DJ 440 e DJ Milena Cinismo.

Abelha é um cantor de forró. Quando ele saiu de um bar às pressas, decidido a escrever o hit do verão, ele mirava no grupo Calcinha Preta. A composição da letra, da melodia, a performance do clipe, tudo vem dos forrós que ele escutava na infância de bandas como Limão com Mel, Tropikália e Mastruz com Leite. Até seu nome artístico foi composto usando o sobrenome da cantora Paulinha Abelha, vocalista da Calcinha.

O cantor nasceu no Piauí e mora em Fortaleza desde 2012. Ele é conhecido por participar de festivais na capital cearense. No currículo, Abelha tem diversos videoclipes e conseguiu maior destaque após o lançamento de Laricado, música do próprio cantor. “Às vezes, precisamos de rótulos para o público entender, eu colocaria como uma nova tropicália”, pontua ele sobre o atual momento da música brasileira. Confira o bate-papo que batemos com o artista:

Seu trabalho transita entre o forró e o pop. Você acha que sua música possa mudar algum entendimento (ou ideias pré-concebidas) sobre esses dois gêneros musicais?
Sim, aqui mesmo em Fortaleza eu já consigo perceber uma diferença brutal da relação da comunidade LGBT, por exemplo, com o gênero, há dois anos comecei cantando num bar da cidade e só tocava pop e, hoje em dia, no mesmo bar se toca um set inteiro de Forró, nos meus primeiros shows foi assustador pra muita gente ver que com a imagem que eu carrego eu era cantor de Forró e outras acham que não sou cantor de Forró, mas quando vão ao show ouvem clássicos de forró, enfim, é uma delícia mexer com a cabeça do povo. No Rec-beat via pessoas cantando clássicos comigo, na multidão, como se fosse inacreditável aquilo, mas era só uma bicha cantando forró.

Gênero e identidade são caros à sua música e vejo que existe um diálogo hoje na música popular brasileira de se falar sobre o assunto. Existe um diálogo entre você e outros artistas? Como enxerga essa cena?
Tem vários artistas no Brasil que tenho contato, nos respeitamos e nos apoiamos pelo que fazemos. Provavelmente gravarei colaborações com algumas pessoas depois do meu primeiro álbum. Não gosto muito do termo “A nova…” mas, às vezes, precisamos de rótulos para o público entender, eu colocaria como uma nova tropicália, vejo artistas que estão falando criativamente de questões politicas que estão em alta na conjuntura política do Brasil, misturando ritmos e estéticas.

Qual estética você usa para compor o visual das suas apresentações?
A estética do não ter dinheiro pra isso e se virar com o que tem.

Sua trajetória lembra John Waters e Divine. Vindos de um lugar tido como sem graça nos EUA, eles se utilizavam da estética mais quadrada e conservadora para expor conteúdos perturbadores e tidos como imorais. Você concorda?
Amei, é isso o que faço. Inclusive tenho uma ligação forte com essa Cultura.

Qual a memória mais recente de você querer trabalhar com música, se apresentar?
Desde criança eu queria isso, eu ia para bares e karaokês com meu pai, estava em lugar de adulto e o que me restava era cantar e dançar. Cheguei a gravar um single, se existisse internet na época eu seria tipo uma Mc Melody.

De onde vem esse gosto por abordar uma crise da masculinidade?
Do lugar que me encontrei enquanto artista e humano dentro do momento que estamos vivendo no Brasil.

Em seu clipe Tamanco de Fogo você faz uma dura crítica ao fanatismo religioso, que mostra o artista sendo agredido, sequestrado e transformado para um ritual religioso até ser abandonado pelo grupo. É sintomático para o Brasil atual com a ascensão de um pensamento conservador?
Sim. Ao mesmo tempo em que temos a liberdade de se posicionar, de dizer quem somos, existe hoje no Brasil um aumento muito grande de ataques reacionários, que muitas vezes parte para agressões físicas e psicológicas.

Como você lida com isso? Já sofreu algum ataque mais sério desde que começou a atuar como artista?
Eu lido com deboche, imito demônios, me jogo no chão e começo a me tremer, dou risadas, grito em línguas. Na internet já sofri ameaças grotescas, mas não cheguei a mudar nada em minha vida por causa disso. Em alguns casos sou mais didático e amoroso, depende da abordagem.

Como vê os ataques recentes de censura às artes no país?

Vejo como algo doloroso pra nossa história e cultura e me faz querer continuar com mais força o que já estou fazendo. Me faz querer ser incansável. Só não podemos desistir, pois momentos como esse acontecerão sempre na história.

Você fez um show super explosivo no Rec-Beat deste ano no Recife, no Carnaval. Agora se prepara para a primeira edição do Balbúrdia novamente na capital pernambucana. Qual a expectativa para esse evento?
Quero jogar meu corpo com força no palco.