Cobertura No Ar 2017: Palco Sonic entre a experimentação e a jogação

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Foto de Curumin de Fernando de Albuquerque/O Grito!

Quem acompanhou todas as mudanças de formato da primeira edição do No Ar Coquetel Molotov até aqui sabe que uma das coisas que a curadoria faz muito bem é a escala de artistas. Se antes o Festival tentava propor uma linearidade – quando ainda se dividia em dois dias de evento – nas últimas edições, com mais de um palco funcionando simultaneamente, a única regra agora é a diversidade. Graças a essa sensibilidade e ousadia, o Palco Sonic, polo secundário, contou com um dos maiores públicos do No Ar 2017. A estrutura também fora favorecida pelo mapa do evento para o Caxangá Golf & Country Club. Ficando precisamente entre banheiros, foodtrucks, praça de alimentação e bares.

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A abertura, às 15h30h, ficou por conta de Giovani Cidreira. O baiano que tem como referências Milton Nascimento, Mac DeMarco até Legião Urbana, teve a ingrata tarefa de abrir a line-up da maratona que viria a seguir. A intensidade de faixas como “Vai Chover” e “Última Vida Submarina” de seu mais novo álbum Japanese Food (2017) preparou o palco para o instrumental de Kalouv, que lançou o também recente Elã (2017) e contou com a participação especial de Benke Ferraz (Boogarins).

A primeira grande surpresa desse palco se deu com a apresentação da paulistana E A Terra Nunca Me Pareceu Tão Distante. Com um trabalho que transita entre o hardcore e o post-rock, o grupo conquistou o público que se esforçou para estar presente mesmo com os primeiros sinais de que o dia seria de chuva. Enquanto o anoitecer escorria pelo céu de tons cinza-azulado, aplausos e gritos evidenciaram que, apesar do trabalho ser estritamente instrumental e os músicos optarem por uma paisagem sonora repleta de ruídos, muito além de bonitos arranjos e letras de um lirismo de dar inveja, a música precisa explorar o campo do sensorial.

Na sequência, é a vez do nome por trás de trabalhos como A Mulher do Fim do Mundo, de Elza Soares, e o grupo Metá Metá, o também paulistano Kiko Dinucci. A apresentação foi fiel ao álbum Cortes Curtos (2017) em que o artista explora o caos de uma das principais metrópoles do país. Kiko é desses gênios que noutros tempos chamamos de Jards Macalé, Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção e cia. O show por vezes cai um pouco na morbidez, mas para o público consciente do currículo do rapaz isso não pareceu importar. Destaque para a participação de Alessandra Leão na música “O Inferno Tem Sede”, originalmente interpretada por Dinucci e a cantora Tulipa Ruiz.

hinds no ar
Hinds estava em casa no festival. (Fernando de Albuquerque/O Grito!).

Com atraso, o quarteto espanhol Hinds desceu sua lona de oncinha com o nome da banda e arrebatou o público pela presença de palco, interação entre as integrantes e som de garagem que me fez imaginar uma combinação entre o clássico The Velvet Underground e álbum Doolittle, do Pixies. As meninas pareciam estar em casa. A Hinds contou com o bom humor extra de Carlotta Cosials e Ana García Perrote, que hora falavam espanhol, ora falavam inglês e ainda arriscaram expressões brasileiras como o “Ah, muleke!”.

Outro ponto forte do Palco Sonic foi a apresentação de Curumin, lançando seu quinto álbum de estúdio Boca (2017), considerado por muitos um dos discos do ano. O mapa de palco com o artista e sua bateria no centro cercado pelos demais membros do grupo, que o acompanhavam nos backing vocals, propôs uma atmosfera alquímica. O músico abriu o show com “Bora passear” e seguiu passeando pelo reggae, soul, batidas afro, samples e os versos provocadores de faixas como “Boca pequena 1 e 2”.

Passaram ainda pelo palco Alessandra Leão, o coletivo queer-afro Afrobapho, seguindo pela madrugada com o show fashion conceitual da dupla NoPorn (SP), com Liana Padilha e Luca Lauri apresentando o mais recente álbum, o segundo Boca (2016) da noite e a amostra da festa paulistana Mamba Negra, que no Coquetel Molotov teve à frente os DJs Entropia-Entalpia e Cashu (Carol Schutzer). Ambas as apresentações contaram com instalações de luzes vermelhas que formavam letras e até lembraram a cobra símbolo da Mamba Negra, além das performances de Euvira e Alma Negrot, artistas visuais de peso do cenário drag e queer do Brasil.

NoPorn e Mamba Negra foram as atrações mais aguardadas pelo público LGBTQ desta edição, com direito à mobilização na página de evento da No Ar 2017 desde agosto, quando a identidade visual foi lançada. Os shows com ar de after ou de “festa dentro da festa” tiveram seus ápices na música “Baile de Peruas”, do álbum homônimo do NoPorn – lançado há 11 anos –, e na performance das drags presentes durante a Mamba. Do início ao fim do Festival, o movimento de “cultura negra, periférica e urbana” BATEKOO REC, representado por Sarmurr (Samuel d’Saboia) e Milena Cinismo (Milena Paiva), ficou responsável pelos sets que sacudiu o público durante os intervalos.