Coquetel Molotov Negócios foca na descentralização com edição em Arcoverde

Festival promoveu diálogo entre produtores e imprensa do Recife com artista arcoverdenses

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Palco principal do No Ar Coquetel Molotov 2022. (Foto: Dani Ferreira/ Divulgação)

O Coquetel Molotov Negócios, evento produzido pelo festival No Ar Coquetel Molotov, é uma iniciativa que promove atividades de aprimoramento para artistas. Com edições produzidas no Recife e em Belo Jardim, o evento seguiu na estratégia da descentralização e levou a programação para Arcoverde, no Sertão, como parte da programação do Festival Sesc de Economia Criativa.

Ainda que seja diversa e madura, a cena cultural de Arcoverde não consegue uma circulação plena dos seus nomes por todo o Estado por conta da centralização dos serviços e oportunidades na Região Metropolitana do Recife. A intenção do evento proposto pelo Coquetel Molotov era de oferecer um contato maior entre imprensa e produtores culturais da RMR com artistas do interior de Pernambuco, principalmente os arcoverdenses.

Em parceria com a ONErpm, empresa especializada na distribuição e impulsionamento da música nas mídias digitais, o Coquetel Molotov Negócios ofereceu, na terça-feira (29), uma oficina de pitchings – um formato de apresentação da obra e história do artista em cinco minutos – e a apresentação dos pitchings aconteceu na noite de quarta-feira (30) no Sesc Arcoverde. Ao todo foram apresentados 14 pitchings, com representantes de bandas, associações culturais, coletivos artísticos e artistas solo em uma gama variada de manifestações artísticas.

“É um novo momento aqui em Arcoverde, com a parceria do Sesc, fazendo esse primeiro contato do Coquetel Negócios em formato de pitching, com uma formação, que é uma coisa que às vezes a gente sente falta: projeção dos artistas, e para entender por que eles não conseguem se divulgar, por que eles não aparecem. Tanto que a oficina no primeiro dia aconteceu muito no sentido de mostrar para os artistas que eles podem aproveitar as ferramentas digitais, que podem fazer com que uma divulgação mais forte aconteça, mesmo estando aqui no interior, e a partir daí conseguir conquistar o mundo. O festival desde sempre teve essa vontade de se comunicar com várias cenas, não só do mundo como também do interior de Pernambuco, da cena do Nordeste, então tudo está relacionado e a vinda a Arcoverde é só o primeiro passo de tentar fazer algo mais concreto nos próximos anos”, analisa Jarmeson de Lima, produtor e dos fundadores do No Ar Coquetel Molotov.

Samba de coco, o protagonista

Historicamente ligado a Arcoverde, o samba de coco teve o número mais expressivo de apresentações durante a noite. A presença da tradição popular fica perceptível pela diversidade de grupos e projetos ativos envolvendo o ritmo popular. Desde as famílias tradicionais como o Samba de Coco Irmãs Lopes, em atividade desde 1916 e reconhecido nacionalmente pela herança ligada ao samba de coco; o Coco Erêmin, grupo que faz parte da Associação Cultural Raízes do Sertão, e tem como objetivo apresentar o coco às crianças e perpetuar através delas a tradição. Nesse mesmo mote de fazer dos jovens brincantes populares, o coco Fulô do Barro sobe aos palcos com uma equipe composta por 12 jovens, mas tem ao todo 21 integrantes de idades variadas. 

A presença de novas gerações dentro dos grupos de cultura popular impulsiona, principalmente, a migração dos grupos para dentro das mídias digitais como mais uma estratégia para furar bloqueios territoriais e fazer com que a arte de Arcoverde alcance outros lugares.

“A gente vê que é necessário essa ideia de ocupar esses veículos de difusão, de mídia musical, que é importante gravar e catalogar nossas músicas. a gente propôs no grupo para que, quem quisesse, iria compor e gravar a primeira música. Precisamos disso, de estar nesses lugares, porque até então como é que a gente vai ser referência para o nosso lugar, para a nossa comunidade, se eles também não veem a gente nesses locais de visibilidade?”, reflete Marcelo Cavalcanti, uma das lideranças dentro do coco Fulô do Barro. 

Inovação na tradição

Novas maneiras de se fazer cultura popular também apareceram nas apresentações. O Coco D’Malandro reúne elementos do coco trupé, que é a forma tradicional da região, do coco de praia, que está mais próximo do litoral, das canções e pontos de terreiro e do afoxé. Esse entrecruzamento de influências foi criado recentemente, em 2023. O grupo, que já tem 10 integrantes, já caminha com as primeiras músicas autorais e com o show Alô Seu Zé, já elaborado.

Outros brincantes

Ainda com o protagonismo do coco nos pitchings apresentados ao longo da noite, outras manifestações de cultura popular estiveram presentes no evento. A Banda de Pífano Santa Luzia é mais um exemplo de família que fez da cultura popular uma tradição sua, com cinco gerações da família Batista compondo a banda. 

Outra apresentação também inserida dentro da cultura popular foi mestre Alberoni Rabequeiro, que está junto da rabeca há 22 anos. O mestre atribuiu a sua aproximação à cultura popular junto ao movimento Mangue, que, segundo ele, funcionou como um catalisador dessa aproximação entre a cultura popular e estilos mais globalizados, mais urbanos de música em Pernambuco.

MPB

A MPB também é um elemento presente dentro das apresentações, mas, ao mesmo tempo, muito consciente da ligação que ela tem com a cidade e com o sertão pernambucano. Filipe Moraes e Leandro Vaz, que são cantores e violeiros da região e fazem música inspirada no estilo hegemônico da MPB, mas com toques da música regional na sua construção. Brennda Ferreira, a artista natural de Recife, mas se considera arcoverdense de coração, também é atriz, além de cantora e compositora – citou dentro das suas referências Elba Ramalho e outros grandes nomes da MPB. A cantora lançou seu single “Ser” em outubro deste ano.

Brennda também faz parte do coletivo Raízes Arcoverdenses, que é um coletivo de poetisas e promove saraus com a intenção de, nesses espaços, existir um ambiente para expressar artisticamente questões da existência enquanto mulher. 

A poesia também teve outro representante: Nação, é poeta, declamador, compositor e pifeiro. O artista – assim como Brennda Ferreira –  tem nas suas inspirações toda a simbologia da figura do sertanejo e da cultura popular, ativamente tentando se afastar do que se entende por “erudito”. 

Encerrado as apresentações musicais da MPB, Silvia Regina, cantora com 27 anos de carreira e também brincante popular. Anunciado pela artista na sessão de pitchings e lançado em junho desse ano, seu single “Yaiá” mostra um pouco da mescla entre o forró e o coco trupé. 

Underground arcoverdense

Também houve espaço para artistas de underground arcoverdense. A banda de death metal Ruttura, apresentada pelo músico Elton França no evento, se destaca pelo uso do death growl,ou vocal gutural, técnica de canto rouco emitido pela faringe e bem característica do gênero – interpretado na banda pela vocalista Raquel Lima. O grupo faz parte de uma Associação Underground Arcoverde & Região, que existe há 28 anos e reúne grupos e artistas de cidades próximas a Arcoverde que produzem música alternativa, estilo que é mais associado aos centros urbanos. 

“A gente já vem fazendo eventos aqui em Arcoverde, em Pesqueira, em Buíque também, estamos expandindo aos poucos. A cena não é só de Arcoverde, como o nome já diz, ela quer abranger mais, então já está chegando em Buíque, já chegou em Pesqueira, em Sertânia, tem uma galera Caruaru também, tanto é que agora vai ter o festival Curto Circuito; vai ser aqui em Arcoverde e em Caruaru, com uma banda de Recife, duas de Caruaru e duas daqui de Arcoverde, fazendo essa circulação. Enfim, a gente está começando mesmo, amadurecendo, estamos captando recursos para poder abrir o CNPJ, fazer projetos, oficinas, eventos, mais festivais.”, diz Elton França.