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Florence Pugh, em ótima atuação, ao lado de Harry Styles. (Divulgação).

Crítica: “Não Se Preocupe, Querida” tenta criticar o estereótipo da mulher recatada, mas resultado é morno

Longa estrelado por Florence Pugh e Harry Styles não consegue se sustentar para além de seu argumento inovador e traz ritmo desconjuntado

Crítica: “Não Se Preocupe, Querida” tenta criticar o estereótipo da mulher recatada, mas resultado é morno
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Não Se Preocupe, Querida
Olivia Wilde
EUA, 2022, 14 anos, 2h20
Com Florence Pugh, Harry Styles, Olivia Wilde, Gemma Chan
Distribuição: Warner

O cenário é belo e recatado: uma vizinhança de casinhas brancas com detalhes em cores quentes, filhos perfeitos voltando da escola, roupas passadas todas as manhãs e chás da tarde em perfeita companhia de amigas ao som de canções cativantes em vitrolas antigas. É diante dessa tela que a diretora Olivia Wilde pinta seu mais novo longa metragem, Não se Preocupe, Querida

Com grandes atores como Florence Pugh (indicada ao Oscar por seu papel no filme Adoráveis Mulheres), Gemma Chan (Asiáticos Podres de Ricos) e Chris Pine (Mulher Maravilha, Star Trek e mais), além da estrela pop iniciante na atuação, Harry Styles, a obra chamou atenção desde seus primeiros anúncios. Para além da premissa inovadora, os bastidores da produção escaparam para o público em forma de alfinetadas e fofocas nas redes sociais e inimizades entre a estrela da obra, Pugh, e sua diretora, Wilde, o que atraiu ainda mais atenção para o longa.

A obra gira em torno de uma premissa interessante onde a protagonista Alice (Florence Pugh) vive em uma utópica cidade projetada e isolada do resto do mundo, batizada de Victory, junta a seu marido, Jack (Harry Styles). Enquanto ela vive uma vida tranquila dividida entre os afazeres domésticos, passeios com as amigas e vizinhas e festas grandiosas com os moradores da comunidade, seu esposo está trabalhando desenvolvendo ‘materiais progressistas” para a comunidade sobre a supervisão do criador e CEO do projeto, Frank (Chris Pine). 

Apesar da aparente vida perfeita dentro de uma sociedade onde todos os desejos e necessidades de seus moradores são cumpridos com um estalar de dedos, Alice começa a se deparar com estranhas e agonizantes visões que a fazem questionar a comunidade e o que exatamente seu marido e os demais estão fazendo na jornada de trabalho. 

Com uma premissa que tenta beber do experimentalismo para criar um thriller psicológico cativante e perturbador, a narrativa se desenvolve de uma maneira não tão eficiente e a boa ideia original acaba por se perder dentre as cenas do longa e o resultado final não consegue atender as expectativas.

Apesar dos cenários belíssimos e uma fotografia que entrega um filme esteticamente agradável, o roteiro não acompanha esse poder e a obra final é um produto com diálogos rasos, personagens inexplorados e que não pode ser salvo apenas pelo talento cinematográfico de sua diretora. Talento esse, que, por vezes, se repetem de forma exacerbada na trama, e mesmo como um dos pontos altos, chega muito próximo de ser algo preguiçoso. 

O grande destaque da obra realmente é a atuação de Florence Pugh, que se destaca em Hollywood cada vez mais e caminha para se tornar um dos maiores nomes de sua geração. A artista sabe incorporar a situação de estranheza que sua personagem vivencia de forma genuína e é possível ver o medo e o desespero crescerem em suas feições a cada cena que passa. 

Em contrapartida à atuação impecável de Pugh, o seu par romântico é interpretado por Harry Styles, que atua em uma camada claramente inferior, sem conseguir transpassar muitas emoções para o personagem, com poucas exceções. Fazendo um papel importante para a trama, o ator não consegue se destacar e isso fica ainda mais nítido ao lado da veterana, que fazem a sua inexperiência na atuação ficarem mais evidentes. 

Com situações curiosas se desenvolvendo ao redor dos protagonistas, a ambientação de um subúrbio (com muita organização e simetria) dos anos 195o conta também com figurinos impecáveis que criam uma atmosfera instigante, mas que ainda assim não é capaz de levar o filme por si só. 

Olivia Wilde, além de seu papel como diretora, também está presente no filme como uma das amigas de Alice, a carismática Bunny. Uma personagem ácida e irônica, mãe de dois filhos que adoram a protagonista e esposa de um dos colegas de trabalho de Jack, ela está sempre por perto, mas a atuação de Wilde também deixa a desejar. Por vezes ela ocupa o centro das câmeras e parece querer aparecer mais do que o necessário, em momentos onde todo o grupo se depara com situações e a reação dela é priorizada em relação à protagonista.

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A produção entrega um filme que visa questionar os papéis sociais da mulher na sociedade e em um relacionamento a dois, pondo em prova a ideia de que as esposas devem ser e se portar como “bela, recatada e do lar”. O grande clímax do filme soa deslocado e, principalmente neste momento, a atuação de Florence Pugh brilha bastante e consegue salvar os diálogos fracos. Além de passar ao espectador sua angústia ela consegue ainda transparecer a força que possui ao quebrar com esse estereótipo de mulher boazinha, que vive a serviço do marido e refém do desejo de ter filhos como forma de sentir completa. 

No longa, a protagonista bate de frente com as normas em que se vê inserida e luta por sua completude, que vai mais além do que estar em casa, sair para fazer compras com as amigas e esperar o marido voltar do trabalho para um beijo de boa noite. Não Se Preocupe, Querida é a prova de que, no cinema, nem sempre um bom argumento é o suficiente.