Teatro do Parque, Recife (PE)
O quarto dia de exibições de curtas e longas do Animage – 14º Festival Internacional de Animação de Pernambuco movimentou os cinemas da Fundação do Derby, da UFPE, e do Teatro do Parque nesta sexta-feira (04). Destaques para a Mostra de 100 anos da Animação Portuguesa – Nova Geração e aguardada sessão única do clássico japonês, Akira (1988) de Katsuhiro Otomo.
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O fim de semana também contou com a segunda rodada de sessões das tradicionais Mostra Infantil, Competitivas (as sessões 7 e 8), além da edição especial da Mostra Africana. O público tem comparecido em peso ao festival comprovando a sua importância no calendário de festivais de cinema em Pernambuco. Ajuda também a firmar o Animage como o mais importante de seu nicho no país.
Antes da exibição do longa Akira, o curador geral do Animage, Julio Cavani fez um balanço parcial desta edição de 2024. ” O festival está sendo um sucesso. O público está incrível. A impressão é que está crescendo. No primeiro dia, na terça-feira, o cinema da UFPE, um dos nossos locais de sessão deste ano, recebeu uma capacidade acima da média da casa ajudando a divulgar a própria sala de cinema que é nova e ainda não é muito conhecida pela população,” ressaltou Cavani à Revista O Grito!.
O evento está ampliando cada vez mais seu compromisso de descentralizar o cinema na cidade e as exibições também passam pelo Parque da Macaxeira e a Lagoa do Araçá. Além dos novos locais, uns dos diferenciais do Animage é a presença de realizadores e realizadoras do Brasil e do mundo durante as apresentações debatendo com o público e entre si. “Tivemos a oportunidade de contar com a aprovação de três editais para realização do evento este ano: a Lei Paulo Gustavo, o Funcultura, e da lei de Incentivo à Cultura do Recife. Isso permitiu que a gente conseguisse trazer para o Recife mais animadores de estados brasileiros do que em outras edições. Essa troca presencial é essencial para a construção do Animage e para o fortalecimento das relações e promoção dos animadores brasileiros,” completou Julio Cavani.
A nova geração da animação portuguesa
No Teatro do Parque, a noite começou com a Mostra 100 anos da Animação Portuguesa – Nova Geração, com a curadoria do animador português Fernando Galrito. Os curtas exibidos apresentaram a versatilidade da animação portuguesa indo de filmes feitos em stop motion ao tradicional 2D. Filmes como Entre Sombras de Alice Guimarães e Mônica Santos trouxeram o universo do gênero do cinema noir através de fotografias para contar uma história de romance, fantasia e comédia; já a Mãe de Sangue de Vier Nev chamou a atenção ao desafiar o público com uma animação feita através de testes de percepção visual contando uma história sobre o ciclo da vida e maternidade. A mostra portuguesa está dividida em duas partes, a segunda parte acontece neste sábado (05) e navega pelos filmes mais marcantes na história da animação portuguesa.
No último filme da noite, o Teatro do Parque, com a maior capacidade de público de todo o festival, presenciou a força que um filme clássico e amado tem para atrair entusiastas de todas as idades. Akira de Katsuhiro Otomo, um marco da animação japonesa de 1988, esgotou rapidamente todos os ingressos disponíveis para sessão única do filme adaptado do mangá homônimo também assinado pelo diretor da obra. Segundo Julio Cavani, o filme nunca foi exibido em salas de cinema do Recife. “Durante o lançamento original, Akira não passou nos cinemas daqui. Quem assistiu naquela época só poderia assistir em fitas VHS. A primeira distribuição do filme ainda era feita para ser vista na TV, numa tela menor, cortada e com o áudio dublado. Descobrimos que Akira foi remasterizado recentemente e, através de uma parceria com a distribuidora japonesa Sato Company, trouxemos o filme para o Animage. É uma experiência única assistir em uma tela grande, com som em alta definição, com sala cheia. Nós não poderíamos perder esta oportunidade de passar essa obra-prima,” frisou Cavani.
Akira, um marco do cinema de animação, enfim na tela grande
Akira segue sendo um assombro. Marco do cinema de animação, o longa chamou atenção quando foi lançado por seu preciosismo técnico e por sua atmosfera pessimista e angustiante que conseguiu capturar as tensões da Guerra Fria em um mundo sem esperança às voltas com ameaças nucleares.
Trata-se de um projeto ambicioso do ponto de vista de sua estrutura e direção, todo desenhado à mão sem uso de recursos digitais, o que traz uma imersão quase vertiginosa ao espectador. Quando visto em tela grande, essa sensação é ainda mais exacerbada, o que pôde ser percebido nessa exibição do Animage.
A trama pós-apocalíptica de Akira foca na relação de dois amigos, Kaneda e Tetsuo, membros de uma gangue de motoqueiros adolescentes na Neo-Tóquio futurista pós-Terceira Guerra Mundial. Tetsuo é capturado por uma facção secreta do governo, que visa desenvolver poderes psíquicos em humanos, o que eventualmente acaba saindo do controle. Em meio a isso, Kaneda se une à revolucionários políticos para tentar salvar seu amigo.
Akira é um exemplar perfeito de um conto cyberpunk, com todos os elementos desse subgênero da ficção científica, porém jamais se contenta em depender apenas de seus visuais estonteantes, sendo um longa complexo, repleto de camadas e nuances, que fazem dele um clássico atemporal. Também não cai na tentação de fazer metáforas vazias sobre os perigos do acúmulo de poder nuclear, pois o roteiro o tempo todo nos mostra que não há lados certos nessa história.
Estão no bojo do roteiro uma exasperante narrativa de ação, uma trama conspiracionista envolvendo políticos e militares, uma discussão filosófica sobre poder, a história de uma amizade fraterna e até um romance com doses de humor. Altamente imaginativo e com uma visão até hoje única sobre as possibilidades da arte da animação, Akira é um clássico que merece uma exibição de qualidade à altura de sua importância para o cinema. E o Animage proporcionou isso.
O penúltimo dia do Animage é neste sábado com destaque para a Mostra Erótica que promete lotar o Teatro do Parque às 20h20; a Mostra Pernambuco com um bate-papo com os realizadores também no Parque às 16h30; e a Mostra Andreas Hykade, em homenagem ao renomado animador alemão que estará presente presencialmente para um debate com o público. Todas as entradas são gratuitas com retirada de ingresso uma hora antes do início das sessões nos respectivos locais de exibição.