Gilú Amaral.
Gilú Amaral.

Gilú Amaral conversa com a música de Pernambuco e do mundo em O Sopro e a Percussão

Marcadas pela percussão, faixas dão destaque a ritmos como frevo, maracatu, caboclinho e jazz

Gilú Amaral conversa com a música de Pernambuco e do mundo em O Sopro e a Percussão
4.5

Gilu Amaral
O Sopro e a Percussão
Independente, 2023. Gênero: Frevo/MPB/Jazz

Para muitas pessoas leigas ou mesmo para aquele ouvinte desatento, a percussão pode soar como um elemento quase coadjuvante do processo de composição instrumental. Como se apenas estivesse ali para dar suporte à melodia encabeçada por instrumentos harmônicos como o violão e o piano, determinando o ritmo e a métrica da canção. Grupos do Maracatu de Pernambuco, toques tradicionais dos terrenos e até mesmo o axé do Olodum na Bahia, provam que instrumentos percussivos tem potência e podem seguir um lugar de protagonismo sem necessariamente ser acompanhante.

É com este sentimento que nasceu O Sopro e a Percussão, novo disco de Gilú Amaral, que traz à cena os toques de instrumentos harmônicos, melódicos, ainda assim subvertendo a lógica da criação, tendo a percussão como a base de tudo.

Gilú Amaral é um dos músicos mais experientes de Pernambuco, trazendo em mais de 26 anos de carreira uma bagagem que registra sua participação na banda Academia da Berlinda e na Orquestra Contemporânea de Olinda.

No retorno aos lançamentos autorais, o músico, inspirado na força da percussão, também destaca aqui a presença marcante dos metais, em diálogo com os tantos toques, batuques e sonoridades que compõem o que há de mais original e único na música pernambucana. Para fazer nascer o álbum, ele se concentrou primeiramente na ornamentação percussiva, para depois inserir os arranjos dos demais instrumentos.

O nosso país Pernambuco entende de música instrumental como ninguém e possui em seu catálogo extenso o frevo de rua como destaque. Gilú Amaral bebe dessa inspiração do frevo, que através de saxofones, surdos, clarinetes, pistões, trombones, tubas, taróis e bombardinos incendeiam multidões. Sentimos este frenesi na faixa “Passeio por Olinda”, remetendo ao que tivemos de mais recente na volta grata do Carnaval, ao mesmo tempo que sentimos referências dos toques do Maracatu. Um passeio pelos ritmos.

Além de um passeio pelo carnaval da cidade histórica através da música, Gilú Amaral também promove uma ida pela mesma festa só que em Nova Orleans, nos Estados Unidos, com inspiração jazz em “Mardi Gras”. Nesta faixa ele conta com o saxofonista Parrô Melo, Deco do Trombone e o trompetista Marcos Oliveira, trazendo o ritmo estrangeiro como referência dentro de uma dinâmica de instrumentos familiares a nós. 

Gilú Amaral
Artista conta com uma gama de instrumentos percussivos nas faixas. Foto: Hermes Costa Neto. (Divulgação).

“Aqualtune” flui como uma saudação à princesa congolesa que lutou contra os invasores portugueses. Como punição pela derrota foi escravizada no Brasil e tornou-se líder quilombola de um dos 11 mocambos do Quilombo dos Palmares. Aqui tambores como ilú, conga, instrumentos como caxixis, maracas entre outros são protagonistas dessa homenagem à força preta de Aqualtune. 

Ainda no rol das viagens, Gilú promove uma ode à Cuba em “Pernambucanos”, encontrando semelhanças entre as musicalidades de Recife e Havana, com muito batuque, a presença discreta de um piano e uma atmosfera mais misteriosa. “Mourisca” experimenta a daburka, membranofone tradicional na música árabe em contraste com um pandeiro bem brasileiro. 

Diversa como todo o trabalho, “Encontros de Culturas” é quase que um diálogo entre pífano e clarinete, em um campo familiar ao caboclinho, com seus sopros que remetem à natureza. Já “Samba as Deusas”, pelo que parece ser palmas no início e pelo berimbau bastante atuante, nos leva a uma roda de capoeira que ao mesmo tempo é palco para um sax agudíssimo e um combo de tambores. Nesta, os arranjos são de Henrique Albino, um dos principais colabores de Amaral na construção do disco.

Gilú Amaral contou com um time de músicos liderado por Henrique Albino, que traz com nomes como Ivan do Espírito Santo, Nilsinho Amarante, Alexandre Rodrigues (Copinha), Alex Santana e Jonatas Gomes. Juntos eles criaram um álbum inovador em técnica e em conteúdo, onde os graves, médios e agudos percussivos com o brilho sibilante dos sopros são seu próprio canto. É um abrir de horizontes para a música pernambucana em diálogo com o que também é tradicional no resto do mundo.

Ouça Gilú Amaral – O Sopro e a Percussão.

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