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Foto: Divulgação.

Laboratório Audiovisual de Tuparetama que colocar o Sertão do Pajeú no mapa do cinema

Estrutura ligada à Secretaria de Cultura desenvolve ações de capacitação, fomento à produção e articulação regional para fortalecimento da cadeia audiovisual no interior de Pernambuco

O município de Tuparetama, localizado no Sertão do Pajeú, em Pernambuco, abriga desde maio de 2023 uma iniciativa voltada para a profissionalização e interiorização da produção audiovisual. O Laboratório Audiovisual de Tuparetama, ligado à Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esportes, tem como objetivo principal contribuir com o desenvolvimento econômico, educacional e cultural da região por meio da capacitação técnica e da promoção de conteúdos audiovisuais.

O projeto, concebido pelo ator, roteirista e diretor Flávio Rocha, nasceu a partir de uma oficina ministrada em 2020, ainda durante o período mais restritivo da pandemia de Covid-19. A estrutura atual do Laboratório é resultado de um processo de articulação institucional que envolveu diferentes setores da administração municipal, parlamentares e colaboradores externos. O financiamento inicial foi garantido por uma emenda parlamentar de R$ 100 mil, viabilizada pelo então deputado federal Gonzaga Patriota, com apoio do então vice-prefeito Diógenes Patriota.

Processo de criação

O embrião do Laboratório surgiu durante a realização da primeira oficina promovida pela Secretaria de Cultura, com foco na linguagem do documentário. A atividade foi conduzida por Flávio Rocha no Auditório Manoel Filó, na Casa da Cultura de Tuparetama, e teve como resultado final a produção de curtas documentais utilizando apenas celulares.

“Uma das alunas escolheu o tema Emprego em Tuparetama, que abordava a falta de oportunidade de trabalho para os jovens no município. Eu também vivi essa falta de oportunidade na minha época. Foi como um gatilho pra mim. Aí, as coisas se juntaram na minha cabeça: a indústria audiovisual, a produção de conteúdo, a quantidade de trabalho e recursos que ela gera… podem ser uma saída para um problema histórico da formação econômica do Sertão. Não desmata, não polui, não bota veneno, não depende de chuva e é regenerativa… Só precisa de tecnologia, conhecimento e investimento”, afirmou Flávio Rocha, em entrevista à Revista O Grito!.

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Flávio Rocha. (Foto: Divulgação.)

Além do impacto ambiental nulo, o audiovisual foi percebido como alternativa concreta frente ao histórico de escassez de oportunidades na região. Em sua justificativa institucional, o projeto destaca que o município forma anualmente cerca de cem estudantes no ensino médio, sem que o mercado local absorva a maior parte dessa mão de obra. A ausência de um setor industrial robusto, a limitação do comércio e do funcionalismo público e as dificuldades ligadas às atividades agropecuárias motivaram a busca por alternativas sustentáveis de geração de renda.

Oficinas e mobilização local

Após a primeira experiência, outras oficinas foram realizadas com apoio da Secretaria de Cultura e da Secretaria de Assistência Social. Em abril de 2021, foi realizada a oficina Roteiro e Interpretação, cujo resultado foi o curta-metragem O Inimigo Secreto. A repercussão da obra contribuiu para a ampliação do diálogo com gestores municipais e levou à formalização do projeto do Laboratório.

“Foi nesse momento que George Patriota, irmão do vice-prefeito Diógenes, numa conversa no meio da rua, comentou que não imaginava que poderíamos fazer, em Tuparetama, no meio do Sertão, narrativas com aquela qualidade. […] Quando falei do potencial do setor do audiovisual no campo da economia criativa, ele arregalou os olhos e os ouvidos e disse: ‘Se você fizer um projeto, eu vou batalhar por uma verba junto ao meu deputado'”, relatou Flávio Rocha.

Após a aprovação da emenda parlamentar e a realização do processo de licitação dos equipamentos, o município reformou uma sala na Casa da Cultura para sediar o Laboratório. A inauguração ocorreu em maio de 2023, após três anos de atividades prévias que incluíram ainda a realização de uma oficina sobre webséries.

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Foto: Divulgação.

Estrutura institucional e funcionamento atual

Atualmente, o Laboratório Audiovisual de Tuparetama funciona como uma diretoria da Secretaria de Cultura. Sua sede está localizada na Casa da Cultura e conta com o apoio técnico e administrativo da equipe da própria Secretaria, composta por servidores que também atuam em outras frentes da política cultural municipal.

Segundo Flávio Rocha, ainda é necessário fortalecer a estrutura interna do projeto: “Essa equipe não trabalha exclusivamente para o Laboratório. Trabalha para todo o programa de ações da Secretaria de Cultura, que envolve todos os setores da economia criativa, e o Laboratório é mais um desses setores. […] Uma das nossas batalhas é montar uma equipe exclusiva e permanente.”, afirmou.

O projeto conta ainda com o apoio de colaboradores como Hesdras Souto e Gustavo Felipe, além de parcerias pontuais com universidades e produtoras independentes.

Objetivos estratégicos e áreas de atuação

O Laboratório opera a partir de três pilares principais: aquisição de equipamentos tecnológicos, formação técnica e ética de profissionais e estímulo à produção audiovisual nas linguagens de ficção, documentário, publicidade, jornalismo e entretenimento. O objetivo central é transformar Tuparetama e os municípios do Pajeú em um polo de produção reconhecido no cenário regional e nacional.

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Foto: Divulgação.

Entre os objetivos específicos estabelecidos pelo projeto estão a oferta gratuita de cursos de capacitação técnica em diferentes áreas do audiovisual; produção de conteúdos locais com alto padrão técnico e narrativo e a estruturação de políticas públicas locais voltadas ao setor. O laboratório também propor intercâmbio com outras instituições e parceiros e por isso almeja criar uma infraestrutura para receber de produções externas, além de realizar articulações com outros movimentos de descentralização territorial da produção cultural.

O Laboratório também pretende contribuir para a institucionalização da política pública de audiovisual no município, por meio da criação de uma legislação específica que garanta sua continuidade como programa permanente da administração municipal.

Produções realizadas e parcerias em andamento

Desde sua formalização, o Laboratório participou da produção de obras em parceria com municípios vizinhos e instituições de ensino. Entre os projetos já realizados estão: Oficinas de curta documentário, roteiro e interpretação; Produção da websérie Corpo Seco; Documentários realizados com recursos da Lei Paulo Gustavo em parceria com produções de Ouro Velho (PB) e Tabira (PE); Parceria com estudantes do curso de Cinema da UFPE no projeto Sertão 2138; Desenvolvimento de uma websérie documental e de um curta-metragem com recursos públicos, entre outros.

Segundo Flávio Rocha, “o objetivo geral do Laboratório é fomentar o desenvolvimento da produção audiovisual em Tuparetama e no território expandido do Sertão do Pajeú, promovendo a formação de competências profissionais, orientando a estruturação de produtoras independentes e dando suporte à realização de obras.”

Desafios enfrentados e perspectivas

A sustentabilidade do projeto depende de financiamento contínuo e de maior articulação institucional. As dificuldades relatadas incluem a escassez de recursos financeiros, a necessidade de qualificação técnica em maior escala e a urgência de superar limitações culturais e simbólicas associadas à interiorização da produção audiovisual.

“Desafios de ordem econômica: financiamento para a realização de obras e produtos, financiamento para a formação de competências técnicas e criativas. De ordem mental: acreditar que somos e podemos ser tão bons quanto qualquer indivíduo de qualquer outro lugar do planeta. De ordem política: nos articularmos e nos organizarmos em conjunto, em união multilateral”, afirmou Flávio Rocha.

Projeções e continuidade

O planejamento estratégico do Laboratório inclui o desenvolvimento de serviços voltados à recepção de produções nacionais e internacionais, criação de cineclubes e mostras regionais, ampliação do acesso à formação e estímulo à organização de um ecossistema de produção sustentável no interior do estado.

Enxergamos Tuparetama e o Pajeú como o território que deve se transformar em referência em Pernambuco, no Brasil e no mundo como exemplo de descolonização mental, descolonização econômica e descolonização política. Devemos ter autonomia em todos esses sentidos.

Flávio Rocha
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“O Laboratório planeja transformar o município e o território do Pajeú estendido em uma região de cidades-locação (ambiente film-friendly); preparar e organizar o setor de infraestrutura e serviços para receber produções locais, nacionais e internacionais; e induzir e incentivar a produção de conteúdo local de alta performance”, afirmou Flávio Rocha.

A equipe responsável pelo projeto reconhece que os avanços alcançados até o momento ainda representam uma etapa inicial do processo. A consolidação do Laboratório enquanto política pública e instrumento efetivo de geração de trabalho e renda depende de investimentos contínuos e do fortalecimento das redes de colaboração regional.