“Eu Capitão” dá voz, rosto e um passado às vítimas da tragédia

Drama italiano de Marco Garrone, e indicado a Melhor Filme Internacional no Oscar, muda a perspectiva sobre crise migratória na Europa

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Seydou (Seydou Sarr) e Moussa (Moustapha Fall) são primos que sonham com a utopia eurpeia (Foto: Reprodução/ X)
“Eu Capitão” dá voz, rosto e um passado às vítimas da tragédia
4.5

Eu, Capitão
Matteo Garrone
Io Capitano, Itália, Bélgica e França, 2023, 2h, Distribuição: Pandora Filmes


A crise migratória na Europa chegou aos olhos do mundo há quase uma década, quando em 2015 os pedidos de asilo no continente europeu chegaram à marca de 800.000, segundo o governo alemão. Desde então, as notícias exportadas para o mundo – majoritariamente produzidas por veículos europeus – nos mostram a tragédias dos vivos e dos mortos nas praias do mediterrâneo. Ao longo de quase dez anos, a crise humanitária passou a ser representada por números, contagens e porcentagens que nos informavam o volume de migrantes, mas apagavam suas histórias.

Indicado a Melhor Filme Internacional no Oscar, Eu, Capitão, de Matteo Garrone, se propôs a ilustrar essas histórias, dar corpo, voz e passado aos números dos noticiários. Como dito por ele em entrevista à Academia de Cinema Europeu, sua intenção com este era conscientizar, mostrar a humanidade do migrantes ao público mundial.

Com uma direção de técnicas simples e um olhar sensível aos detalhes, Garrone nos apresenta à periferia de Dakar, no Senegal, sob a perspectiva de Seydou (Seydou Sarr) e Moussa (Moustapha Fall), dois adolescentes que vivem o sonho de triunfar na Europa, assim como os jogadores de futebol nos uniformes usados por ambos durante todo o filme – uma maneira esperta de mostrar qual a imagem que a Europa tem nas mentes deles.

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O longa-metragem mantém uma representação realista da jornada de migração (Foto: Divulgação)

Garrone constrói o mundo dos adolescentes em uma rapidez habilidosa. A parte inicial do filme, embora passe rápido, transmite ao espectador a sensação de lar e cuidado que acompanha o olhar de Seydou durante toda a viagem. Sempre que ele se dá conta da situação desesperadora de sua jornada, seu olhar encontra alguma lembrança de casa que lhe devolve a ternura, e o espectador sente quais são esses momentos.

Inclusive, esse é um dos destaques do filme: a atuação de Seydou Sarr. O ator senegalês é mestre na atuação não verbal, e entrega nas expressões uma mescla de sentimentos durante sua jornada migratória. A viagem é bem representada no filme, com planos super abertos no deserto do Saara e no mar Mediterrâneo, uma forma clássica de nos mostrar a fragilidade das pessoas em situações de completo abandono e descaso.

Ao longo do filme, são diversas essas situações nas quais os viajantes estão aquém, e a tensão repetida transmite todo o estresse dos imigrantes ao espectador. Em certo ponto também tememos o próximo destino e quais possíveis perigos ele traz. Ao final, quando a esperança mostra que ainda existe, o peso nos ombros de Seydou, o mesmo nos ombros do espectador, desmorona. A história termina para Garrone no ponto em que ela começa para a mídia ocidental, e a partir daí podemos tirar nossas próprias conclusões sobre a questão.

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