Joana Coccarelli: culpando a vítima

até agora não soube bem o que dizer sobre o caso do vestidinho rosa da estudante geisy. dizer o que? que foi um dos mais profundos episódios de machismo nacional dos últimos tempos? lugar-comum. eu queria poder traduzir todo o nojo que senti dessa história em particular, e sinto de manifestações misóginas em geral, mas não consegui. curiosamente foi por intermédio da matéria de capa da isto é desta semana que, de uma forma mais ou menos definida, pude comentar aqui o que considero uma das piores violências contra a mulher: a de culpar a vítima.

na visão míope da turba, o linchamento moral e – talvez – físico de geisy seria justificável porque ela “provocou” e “queria causar” – alguns alunos dizem que geisy deu uma puxadinha no vestido para encurtá-lo. culpá-la por ter sido insinuante e ter rebolado, é como responsabilizar uma vítima de estupro pelo crime

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obrigado, isto é. análises como esta nos ajudam a entender que explicar uma situação é muito diferente de justificá-la. explica-se que o tumulto foi gerado por conta de um vestido que impactou rapazes (e moças!) chauvinistas, mas nada, absolutamente nada justifica o furor, o xingamento, as ameaças de estupro que a garota sofreu. ela poderia ter levantado a saia e continuaria não se justificando.

o que aconteceu na uniban pode ser interpretado como a extensão de um comportamento comum nas escolas brasileiras de ensino fundamental e, principalmente, nas de ensino médio. as garotas são proibidas de vestir short ou blusinhas curtas porque, a partir da pré-adolescência, esses trajes podem desconcentrar os meninos. “a opção que se faz é fiscalizar como as meninas e mulheres se vestem e se comportam para que os meninos e os homens não tenham de se controlar”, critica ângela soligo, professora da faculdade de educação da universidade de campinas. “além de perverso, isso é negativo para ambos os sexos porque reprime a mulher e não ajuda o homem a amadurecer.” os muçulmanos exigem que suas mulheres vivam cobertas da cabeça aos pés, em parte, pela crença de que o macho seja incapaz de frear os seus desejos.

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“por mais que a universidade tenha recuado, o gesto está feito. a uniban preferiu expulsar geisy e colocar uma burca sobre ela para que os seus alunos pudessem, oficialmente, seguir se comportando como orangotangos”, afirma a psicanalista diana corso.

isto eu achei genial. eu ando de saco cheio dessa palhaçada vomitante de que o homem não é capaz de segurar seus instintos, e que é papel da mulher ser mais recatada. não é aceitável, simplesmente. é argumento de moleque de dezoito anos tentando convercer a virgem de doze a dar pra ele: “eu sou homem, eu não posso agüentar”.

eu já disse aqui: homem que subjuga a mulher não gosta de mulher. não gosta de mulher. não gosta de mulher.