Charli XCX
BRAT
Atlantic Record, 2024. Gênero: Dance, Pop
Ao longo dos 12 anos de carreira, Charli XCX construiu-se quase como uma figura arquetípica para o público que acompanha seu trabalho, mesmo que fosse de longe. Frenética, misteriosa, irônica, pouco polida e ainda sim sempre glamurosa, a cantora parece ter reimaginado a figura descolada da “party girl” e toda sua excentricidade. Junto de seus amigos e colegas artistas igualmente descolados como A.G. Cook, Danny Harle e Sophie, Charli foi uma figura que esteve no centro desse movimento que reimaginou os limites da EDM e toda a infinidade de sons eletrônicos, tendo como resultado um pop mais experimental e de personalidade.
Na sua discografia Charli XCX se aprofundou cada vez mais nessas experimentações, o que rendeu uma ótima sequência de álbuns desde o Pop 2 (2017), mas que foi interrompida pelo Crash (2022), que se recolheu à tendência da nostalgia oitentista. Dois anos depois (embora pareça muito mais), Charli se reencontra dentro das experimentações com a EDM do hyperpop no BRAT e volta com um álbum que é coerente não apenas na sua estética sonora, mas com a forma que conta a sua história.
Depois de montar a “persona brat” da party girl e toda sua superficialidade – muito bem representada em “360” e “Von Dutch” -, outras faixas do álbum fazem questão de encontrar as brechas nessa personalidade e explorar os vazios e insuficiências do estilo de vida autocentrado.
Da insegurança de “I might say something stupid” e “talk talk”, o ressentimento de “Sympathy is a knife” e “Girl, so confusing”, até os medos existenciais “I tkink about it all the time” e o luto misturado com culpa em “So i” – claramente dedicada à Sophie e um complemento da faixa “It’s Okay To Cry”. Todos esses sentimentos cantados entre produções frenéticas do hyperpop.
A química entre Charli e A.G. Cook como sempre é certeira, já tendo noção de seu histórico de sucessos com os últimos álbuns da cantora. Fora das colaborações da dupla, quem também ganha um destaque no álbum é o espanhol El Guincho, com “Everything is so romantic”.
Todas essas camadas emocionais do disco formam uma narrativa metalinguística em que Charli fala sobre si projetando as suas questões na personagem brat em uma abordagem que fala de questionamentos atuais na vida da cantora, embora a faixa final – “365” – deixe claro que a “party girl” sempre vai prevalecer.
O BRAT é um retorno esperado de Charli aos sons modernosos e experimentais do hyperpop às letras emocionalmente cruas. Honesto, íntimo – até triste em alguns momentos – mas feito para se ouvir dançando. É empolgante ver o refinamento do estilo de Charli, que talvez tenha atingido seu auge agora.
Ouça brat, de Charli XCX
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