Autor de Pantera Negra, Coates é um dos mais importantes pensadores sobre o que é ser negro na América hoje
No modus operandi dos quadrinhos mainstream americanos é necessário uma reformulação a cada doze meses. Soa oportunista (e é), mas também um modelo de negócios já estabelecido. Se você é um leitor de quadrinhos de heróis há pelo menos 20 anos, já deveria ter se acostumado. Por isso tantas guerras secretas, infinitas, civis, renascimentos, etc. E eis que agora a Marvel anuncia mais um recomeço. Mas seus editores garantem que não se trata de mais um “reboot” e sim de um “fresh start”.
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Na prática: vem aí uma nova reformulação de seus títulos e personagens. E tudo bem também. O que importa de verdade é o conjunto de boas histórias que sairão disso aí. Em todos os reboots e recomeços sempre foi possível encontrar bons gibis. E agora, no meio de tantas mudanças a boa notícia é que o escritor Ta-Nehisi Coates, que assina a HQ do Pantera Negra, vai assumir a revista do Capitão América.
Isso é muito, ainda mais se considerarmos o atual contexto político dos EUA. Um dos maiores escritores negros da atualidade escrevendo o personagem que é símbolo dos ideais norte-americanos. O primeiro número será lançado em julho nas comic-shops americanas.
Coates é considerado um dos principais pensadores dos EUA e vem se dedicando a escrever sobre como é ser negro na América hoje. Seu livro Entre o Mundo e Eu foi lançado no Brasil pela Objetiva.
Seu trabalho com o Pantera Negra trouxe ainda mais substrato político para as HQs da Marvel ao mostrar uma trama que trazia a luta por poder no fictício reino de Wakanda.
“Vivemos uma época bem empolgante para que se escreva o Capitão América”, disse Coates em um comunicado da Marvel. “O país está em um lugar interessante e estou ansioso para trabalhar com Steve Rogers como personagem, ele que sempre foi um cara que se sentiu fora do lugar neste mundo. Espero que os leitores estejam empolgados para ler algo diferente do personagem e creio que teremos antigos vilões clássicos que os fãs do herói e da Marvel conhecem muito bem”, disse.
Segundo texto publicado na revista The Atlantic, Coates vai explorar aspectos do herói que o afastem de seus estereótipos. “Aqueles que nunca leram uma HQ do Capitão América ou nunca viram os filmes da Marvel estão perdoados em achar que o personagem é somente um mascote do nacionalismo americano”.
Capitão América, criado por Stan Lee e Jack Kirby, apareceu pela primeira vez durante a Segunda Guerra Mundial, usado como símbolo do patriotismo heroico das tropas americanas. Ao longo dos anos, escritores como Ed Brubaker e Brian Michael Bendis deram mais nuances ao personagem, o colocando como um gerador de conflitos em meio a um mundo corrupto, distante dos ideais de liberdade. Ele esteve contra o registro compulsório de supersseres na saga Guerra Civil, rivalizando com um utilitarista e governista Homem de Ferro.
Nos últimos meses, Capitão América fez parte de uma saga que o mostrava como um dos líderes da Hydra, uma organização fascista que é oriunda dos nazistas. Ainda inédita por aqui, a saga causou muita controvérsia quando foi lançada. “O que é excitante aqui não é algo didático de colocar minhas palavras na cabeça do Capitão América, mas tentar colocar as dele na minha própria”, escreveu Coates. “O que me anima é a possibilidade de exploração, de evitar a repetição”.
A arte da HQ será de artistas como Leinil Francis Yu, que assinará os desenhos e de Alex Ross, que pintará as capas. Captain America #1 sai dia 4 de julho.