Ọnà Dúdú percorre o Bairro do Recife e recupera papel do povo negro em sua construção

O itinerário do projeto explora quatro locais do Recife Antigo nos dias 21, 23 e 27 de março

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Projeto busca recuperar memória do povo negro do Bairro do Recife (Foto: Arthur Canavarro/ Divulgação)

O Ọnà Dúdú é uma itinerância histórico-performativa por quatro estações-territórios negros do Bairro do Recife, nos dias 21, 23 e 27 de março, das 14h às 18h, com recurso de acessibilidade comunicacional (libras e audiodescrição). A excursão local é gratuita, levando 50 pessoas por dia para uma vivência artística na Cruz do Patrão, rua da Guia, rua do Apolo, comunidade do Pilar e Paço do Frevo, que recebe o espetáculo re_Luzir, de Marconi Bispo. O encontro nas localidades do Recife Antigo tem como objetivo a busca pelo compartilhamento das histórias e presenças do povo negro na construção do centro recifense. A primeira edição aconteceu em 2022.

Idealizado pelo ator, dramaturgo, produtor e sacerdote de candomblé Marconi Bispo, o Ọnà Dúdú traz para a programação artistas e coletivos negros. “Os processos histórico-sociais que foram a tessitura para a página escravocrata em Pernambuco carecem de maior publicização e discussão. É importante reconstituir narrativas e o Ọnà Dúdú quer escavar no bairro do Recife essa presença negra que atravessa cinco séculos. Este circuito, que chega a sua 2ª edição”, explica.

A itinerância também celebra os dias 21, Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé (Lei Nº 14.519, de 5 de janeiro de 2023) e Dia Internacional da Luta pela Eliminação da Discriminação Racial e 27 de março, Dia Nacional do Circo e o Dia Mundial do Teatro.

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(Foto: Arthur Canavarro/ Divulgação)

Em sua pesquisa, Marconi elenca dados históricos, entre eles o de que Recife foi a cidade campeã em crianças africanas traficadas, 5º centro mundial e 3º do Brasil de tráfico escravista, e o de Pernambuco ter recebido o 1º navio negreiro em 1560, a pedido de Duarte Coelho, além do número de 853 mil pessoas trazidas escravizadas para Pernambuco e do fato de que o Recife tem na presença africana um dos elementos basilares de sua formação citadina, fato pouco divulgado.

As performances que foram escolhidas para a experiência Ọnà Dúdú no centro do Recife questionam que cidade negra é essa que, a despeito de tanta presença, ainda se faz ignorada e invisibilizada. Marconi, inclusive, apresenta o espetáculo re_Luzir, juntamente com o músico Miguel Mendes, que assina a trilha sonora, e João Guilherme de Paula e André Xavier nas projeções audiovisuais da peça.  

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(Foto: Arthur Canavarro/ Divulgação)

Confira a itinerância – Bairro do Recife

Primeira estação: Cruz do Patrão. O que assombra aquele lugar a não ser esses dados e o triste quinto lugar mundial no tráfico de africanas e africanos? Nossa itinerância começa pela Cruz do Patrão tentando um outro gesto, distante do discurso folclorizado de lugar mal assombrado. A realidade é/foi histórica e a fantasia só nos servirá, aqui, para lembrar: chegamos da África por ali. Vivos, quase-vivos e mortos.

Segunda estação: comunidade do Pilar. Uma Pequena África? Que artistas negres lá residem? O que significa – no meio da comunidade! – uma Igreja Católica do século XVII ensimesmada em seu projeto colonial e circundada, por tudo e portanto, de tanta pobreza? Ao redor do Porto, do Cais, quantas existências negras reclamam uma história quando a própria História se nega a registrá-las?

Terceira estação: Teatro Apolo e rua da Guia. Na obra historiográfica “Òmìnira – mulheres e homens libertos da Costa d’África no Recife [c. 1846 – c. 1890]”, a professora Valéria Gomes Costa [UFPE] reconstruiu trajetórias de pessoas escravizadas no Recife oitocentista, sobretudo, as de “pretos/as minas” que conquistaram a liberdade e tiveram que se reinventar para viver/sobreviver na sociedade escravista de então. No livro, as ruas do Apolo e da Guia aparecem como lugar de trabalho e convívio de muitos negros e negras da África Ocidental, sendo o próprio Teatro Apolo arrolado na vida de um de seus personagens, o Domingos José Machado. Nesta Estação, estas histórias são pontuadas e revividas pelo ator Marconi Bispo e pelo músico Thúlio Xambá.

Quarta estação: espetáculo re_Luzir, do ator Marconi Bispo, no Paço do Frevo. Participa do espetáculo re_Luzir o músico Miguel Mendes, que também assina a trilha sonora original da peça. De outubro de 2016 a março de 2020, Marconi Bispo protagonizou o espetáculo autobiográfico Luzir é Negro!. Foram 39 sessões e, na última, saiu de cena para o isolamento por conta da pandemia, que acarretou o fim do espetáculo e de sua trajetória no grupo Teatro de Fronteira. Em seu novo projeto, a montagem re_Luzir, Marconi inaugura o início de projetos autônomos, fincados na elaboração de uma cena onde suas encruzilhadas afrográficas sejam percurso e performance. E se [nos] indaga: O que um ator negro tem a dizer/fazer/projetar nestes cruzos de tantos desafios, de tantas indefinições, de tantos medos? Quais as implicações destes percursos em sua existência – no tocante à sua subjetividade negra, sobretudo! — e que agora, pelo viés do teatro, torna-se documento para todes nós, “sobreviventes” destes tempos sombrios — mas que nos lançam tanta luz?

Ọ̀NÀ DÚDÚ – Caminhos Negros do bairro do Recife. Itinerância histórico-performativa

21 de março [quinta-feira], das 14h às 18h;
23 de março [sábado], das 14h às 18h;
27 de março [quarta-feira], das 14h às 18h.

Gratuito. Inscrições via e-mail: producao.onadudu@gmail.com