Escrito pela norte-americana Charlotte Perkins Gilman no final do século 19, o livro O Papel de Parede Amarelo ganha nova edição no Brasil pela editora José Olympio. Lido durante décadas como uma simples narrativa de horror, no melhor estilo de Edgar Allan Poe, a obra foi redescoberta como um clássico feminista.
Com características góticas e drama bem construído, o livro é também um tratado sobre a opressão das mulheres e por isso foi redescoberta por uma geração de teóricas feministas nos anos 1970. Narrado em primeira pessoa, conta a história de uma personagem forçada ao confinamento por seu marido e médico, que pretende curá-la de uma depressão nervosa. Proibida de fazer qualquer esforço físico e mental, ela fica obcecada pela estampa do papel de parede de seu quarto, e, por fim, enlouquece de vez.
Ainda pouco conhecido do público brasileiro, O Papel de Parede Amarelo chega agora às livrarias pela José Olympio. A edição da obra inclui um ensaio de 1973 da educadora Elaine Ryan Hedges, que por anos estudou a contribuição de mulheres americanas nas artes, e um prefácio inédito da filósofa Marcia Tiburi.
“A heroína do conto está entregue ao sofrimento psíquico. O marido, investido da posição de senhor e guia, controla o estado mental e físico da esposa. Médico, ele representa a ciência, o mundo racional, contraposto à irracionalidade da histeria, da qual a heroína seria portadora em ‘grau leve’”, diz Tiburi. “A histeria como doença feminina é a ideologia do homem no contexto de uma evidente política sexual. Nesse contexto, a invalidez da mulher é um fator necessário para o bom funcionamento do controle a ser exercido sobre ela”.
A trama de O Papel de Parede Amarelo foi inspirada em experiências da própria autora, que nos anos 1880 passou por um tratamento semelhante ao de sua personagem. Charlotte estava ainda no primeiro casamento (com Charles Stetson, um artista de Rhode Island) quando foi enviada ao “especialista em nervos” mais proeminente de sua época, o dr. S. Weir Mitchell. Suas angústias, iniciadas após o matrimônio, tinham aumentado com o nascimento da filha. O médico limitou suas atividades ao trabalho doméstico e chegou a impedi-la de escrever.
Em 1887, a autora se divorciou. No ano seguinte, para garantir o próprio sustento, iniciou uma carreira de professora e começou também a dar palestras sobre a situação das mulheres. Em 1900, casou-se novamente, dessa vez com o primo George Houghton Gilman. Publicou diversas obras de ficção e não ficção, entre as quais o clássico tratado Women and Economics, que, traduzido em várias línguas, se tornou uma das bíblias no movimento feminista. Vítima de um câncer de mama que lhe causava grande sofrimento, a autora cometeu suicídio em 1935.