O livro O Avesso da Pele, de Jeferson Tenório, foi alvo de censura no Rio Grande do Sul depois que a diretora de uma escola do município de Santa Cruz do Sul fez um vídeo criticando o vocabulário “baixo calão” da obra. Vencedor do Prêmio Jabuti, o livro aborda o problema do racismo no Brasil e foi selecionado pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), do Ministério da Educação, recomendado para uso do Ensino Médio.
A Secretaria Estadual de Educação (Seed), do Paraná, iniciou a retirada do livro das escolas estaduais nessa quarta (6). Em nota enviada ao G1, a Seed afirmou que “a obra passará por análise pedagógica e posterior encaminhamento” e que “habitualmente revisa os materiais didáticos incluídos no PNLD” e que a revisão se deu por conta de “expressões, jargões e descrições de cenas inadequadas para menores de 18 anos”.
Mais de 250 artistas e intelectuais protestam contra censura ao O Avesso da Pele
A repercussão do vídeo provocou indignação de escritores, jornalistas, livreiros e entidades de defesa da liberdade. O grupo Liberdade e Literatura composto por nomes como Ailton Krenak, Afonso Borges, Conceição Evaristo, Carla Madeira, Djamila Ribeiro e Denise Fraga saiu em apoio ao escritor. Cerca de 250 artistas e intelectuais fazem parte da iniciativa, que segue aberta para novas adesões.
“Nós, abaixo assinados, escritores, artistas, criadores, educadores, intelectuais, cientistas, e profissionais de todos as áreas do conhecimento, nos preocupamos quando setores reacionários resolvem perseguir um escritor, tentar proibir seu livro, impedir que seja adotado nas escolas. Quando a Censura é permitida, toda a Cultura de um país é agredida. Ferem de morte a democracia, o direito de um autor se expressar, tiram a oportunidade de alunos entrarem em contato com textos escritos que foram observados e selecionados por comissões especializadas e preparadas para levar qualidade ao ensino”, diz o texto da organização, que conta ainda com nomes como Malu Mader, Claudia Lage, Conrado Hubner, Flávia Oliveira, Mia Couto e Noemi Jaffe.
“O avesso da pele é um grande livro, aborda temas relevantes, critica o racismo e tem o poder de proporcionar ao jovem leitor reflexão e crescimento a partir de sua leitura. Desejar cancelá-lo é atitude conservadora, atrasada, própria de mentes não evoluídas. Um absurdo a necessidade de se levantar a voz em defesa de um livro. Deplorável ver pretensos educadores envolvidos em esforço de se proibir a circulação de uma obra”, diz ainda o texto.
O Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná (APP-Sindicato) criticou a retirada. “(…)a deliberação representa um grave ato de censura que deve ser imediatamente contido pelas instituições competentes, pois é intolerável que os absurdos praticados durante a ditadura militar de 1964 sejam repetidos no presente e, principalmente, no ambiente escolar.”.
“Baixo calão” incomodou mais que o racismo, diz Tenório
Nas redes sociais, o autor Jeferson Tenório repudiou a medida, que chamou de “uma violência e uma atitude inconstitucional”.
“O Avesso da pele já foi adotado em centenas de escolas pelo Brasil, venceu o prêmio Jabuti, foi finalistas de outros prêmios, teve direitos de publicação vendidos para mais de 10 países, foi adaptado para o teatro. Além disso, o livro foi avaliado pelo PNLD, em 2021, ainda no governo Bolsonaro. A própria diretora assinou a ata de escolha do livro. As distorções e fake news são estratégias de uma extrema direita que promove a desinformação. O mais curioso é que as palavras de “baixo calão” e os atos sexuais do livro causam mais incômodo do que o racismo, a violência policial e a morte de pessoas negras”, completou Jeferson Tenório.
Junto ao apoio ao escritor e o repúdio contra a censura, diversas fake news, ameaças ao escritor e desinformação também tomaram conta das redes sociais. A editora que publica a obra, a Companhia das Letras, iniciou uma campanha online com a hashtag #emdefesadoslivros. “O avesso da pele é uma narrativa contundente que traz à superfície um país marcado pelo racismo e por um sistema educacional falido, além de um denso relato sobre as relações entre pais e filhos. O que se destaca no livro não é uma cena, tampouco a linguagem, mas sim a categórica denúncia do racismo que interfere em todas as nossas relações, até as mais íntimas”, diz a editora.
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