Las Vegas

Zumanity (Foto: Divulgação)

No Swing du Cirque
Famosa por seus inúmeros cassinos, milhares de luzes e variados shows sensuais, Vegas não é só o maior playground adulto mas um grande zoológico humano.
Por Tatiana Severo, especial para O Grito!, de Nova York

Sei que meu texto passado foi sobre Nova Iorque e apesar de não ter ou querer necessariamente escrever sobre lugares, como fiz uma viagem atrás da outra, resolvi correr o risco e contar mais essa descoberta que fiz em uma das minhas presepadas. Pode desligar a TV minha senhora, não tem jogo do milhão, pornô soft tarde da noite na Band, CSI ou Marta Suplicy que explique. Mas eu vou tentar. Atóron um perigon.

Vestida com minha camiseta do CSI de dez dólares  e usando meus óculos Rayban  black classic estava me sentindo a própria Catherine ao fazermos um pequeno peeeeety-stop em pleno deserto do Mojave. Sem nenhum cadáver a vista, e tendo me safado de levar uma picada de cobra nas partes,  seguimos em frente em direção  ao que posso apenas comparar com o maior zoológico humano que já vi . Las Vegas. Trilha sonora do CSI tocando whoooo are you who who who who.

Já na cidade das luzes e cores, a primeira sensação é de se estar entrando num grande parque de diversão, construções ultra-modernas misturam-se a hotéis cafonamente temáticos, telões hightech gigantescos mesclam-se a antigos letreiros néon,  típicas famílias de classe média, garotas de aluguel, jogadores compulsivos e casaizinhos  românticos se amontoam nos saguões dos hotéis. De Nova York à Veneza, de Paris ao Egito do deprimente Hooters ao opulente Bellagio.  Lugar de encher os olhos para se ficar e jogar, é o que não falta.  E até mesmo o Belllagio, um dos mais chiques de lá, tem aquele “Q” de bregão, Andy que me perdoe.  Dou mais uma olhadinha no saguão enquanto  meu acompanhante cara-de-pau consegue um upgrade dizendo que iremos nos casar em Vegas. Como diria Chandler de Friends, depois de 8 anos de casados, “we need the stuff” .

Dentro do quarto, nada que salte aos olhos.  Até que as luzes se acendem, as cortinas automaticamente se abrem e uma vista da Torre Eiffel, Arco do Triunfo e da famosa fonte musical daqueles homens com seus segredos. Taça de champanhe geladinho na mão,  o que mais se poderia querer?  Grissom e George!  Nada mais clichê.  Atóron. Haha. Deleta rápido que estou de carona. O jeito foi escolher um show e ligar pro concierge.

De tanto que meu irmão havia me pentelhado para assistir um  Cirque du Soleil e como lá parecia ser onde se tinha maior variedade dos espetáculos deles, decidi me arriscar, já prevendo que iria tirar um bom cochilo  durante os 90 minutos do show. Dentre todos os temas disponíveis do Circo do Sol, escolhi o que, em minha opinião, mais se encaixava com Vegas, já que “O”, que se pronuncia “eau” – água em francês pros menos liguarudos- estava esgotado. Zumanity aqui vamos nós. Ces’t la vie. Com os ingressos em mãos , lá fomos nós.

“Welcome to Disneyworld “disse Mickey Mouse,  quando aos meus doze anos entrei no Magic Kingdom. Tão excitante quanto aquele de quase duas décadas atrás, este welcome foi dado por um par de gêmeas que com seus saltos 20, meia-arrastão, fio dental e um make up beirando circense eram como um delírio erótico de Botero. Do hotel onde o show acontece, uma nova Iorque de mentirinha em pleno estado de Nevada, ao show em si, me sentia com um daqueles cubos mágicos que até hoje não consigo fazer ficar com uma cor só de cada lado.  Uma das gordinhas moulin rouge espremida entre seu avental e as fileiras da platéia vem e me oferece sorridente um moranguinho. Aceito o primeiro e ela diz, “pegue mais que um só não resolve o problema”. Peguei três. Ela estava certa.  Passa o guardanapo que o negócio está ficando suculento.

Circo é aquela coisinha chatinha que a gente vai como criança para ver animais desnutridos mesclando -se a um monte de mini atrações com figurinos desbotados enquanto se mastiga pipocas de isopor .  O do Sol, não tinha nada de infantil ou mofado.  Mas sim um cenário bem elaborado, figurinos e coreografias harmoniosas fundindo sexo e humor com um bom gosto incrível.  Zumanity é uma selva que aguça nossos instintos mais primitivos. E como o próprio nome diz, os animais, estes, éramos nós. De meow! a moooo, todos eram bem-vindos.

Começando com duas acrobatas semi-nuas se entrelaçando em uma gigantesca taça de Martini a dois dançarinos bombados se engalfinhando num tango testoterônico, da acrobata “procurando nemo” em  meio a murmuros em francês a uma orgia babilônica no gran finale,  the human zoo é uma chicotada na hipocrisia e nos paradigmas de nossa sociedade . Nus e crus, poéticos e patéticos, seres humanos e mitológicos se mesclam num ritual de dança e acrobacia quase antropofágicos. Impossível não se ficar com água na boca. Ou babar um pouquinho.

Num malabarismo muito bem planejado, o espetáculo parece uma montanha -russa onde gargalhadas histéricas se agarram a silêncios quase embaraçosos de tesão estapafúrdico. Até quando brinca com os limites do humor pastelão, Zumanity mostra ter classe irreverência e sensualidade como uma Marilyn Monroe. Com ou sem Chanel número 5, Infucktuation total, Mr. President!

Dizem que o que acontece em Vegas, fica em Vegas. Mas como não sou um dos onze, doze, treze homens, para mim, quem guarda segredo é cofre. Portanto, aí está um dos grandes segredos de Vegas e uma das maiores descobertas que se pode fazer, o zoológico humano.  Bastou deixar os pudores de lado, esquecer os cassinos e buffes tristonhos e os mais que sambados shows de gogo girls e mergulhar de cabeça na expedição à selva da libido humana. Me redescubri, sai com um sorriso de durar semanas e  cantarolando Who are you who who who. Não tem melhor “happy ending” que esse.