Entrevista: Apanhador Só, a banda indie mais importante dos anos 10?

apanhador2
Fotos de Roberta Sant'Anna.
Fotos de Roberta Sant’Anna.

Por Maurício Ângelo

Antes Que Tu Conte Outra não só é um dos melhores discos brasileiros do ano, como também um dos mais corajosos. Afinal, com a estreia, o Apanhador cravou seu nome entre mídia e público com um pop que, ao mesmo tempo que era familiar, também soava fresco, inventivo, com composições palatáveis acima da média.

Leia mais
Baixe o disco gratuitamente no site da banda.
O que já publicamos sobre Apanhador Só

Seguir no mesmo caminho, portanto, seria mais do que natural para uma banda que começou tão bem, cativou seu público e precisa solidificar de vez sua posição no mercado, fazer o negócio render, ampliar o alcance. Ao contrário, o Apanhador Só escolheu o caminho mais difícil: entregou uma obra altamente experimental, ousada, calcada em escolas vanguardistas, com estruturas fora do padrão comum do pop, com melodias tortas, ruídos, letras críticas – e cínicas – variações de tempo, usando instrumentos e utensílios diversos na criação de uma parede sonora única, que não encontra par no Brasil.

“A prova do segundo disco”, aqui, soa como um amadurecimento precoce e impressionante. “Mordido”, “Vitta, Ian, Cassales”, “Lá em Casa Tá Pegando Fogo” e “Despirocar”, as quatro primeiras músicas, chegam com o pé na porta do senso comum, do refrão fácil, da melodia copy & paste, da produção em série. Poucas vezes uma banda consegue ser tão experimental e ao mesmo tempo tão equilibrada, concisa, controlando os próprios exageros – nenhuma faixa do álbum ultrapassa 5 minutos e meio – jogando ácido na ferida e assoprando depois.

Ao vivo, como pude conferir em Belo Horizonte na última semana, no Teatro Bradesco, o disco soa melhor ainda. O desafio de reproduzir a liberdade, o tempo e os truques de estúdio no palco é encarado com muita segurança e habilidade pelo Apanhador, que faz uma apresentação focada no novo trabalho ao mesmo tempo em que, a pedido do público, emenda umas 4 músicas do primeiro álbum no bisLeia completo no Movin’Up.

Ali fica evidente o quanto o Apanhador Só caminha para ser a melhor e mais relevante banda indie brasileira dos anos 10. O indie por excelência, de direito bem conquistado. Entrando na linha de frente do que costumamos chamar de “independente” e “alternativo”. Com o Apanhador, este título simbólico está em boas mãos. Não que a banda pareça se preocupar com esses vícios da crítica, que precisa estabelecer ícones, rótulos, gradações e comparações.

apanhador2

Na entrevista a seguir, Alexandre Kumpinski, vocalista e guitarrista do Apanhador, fala sobre os detalhes do disco, que foi bancado via crowdfunding e está disponível para download gratuito no site da banda.

A estreia já demonstrava uma banda experimental mas plenamente consciente da importância da melodia, criando harmonias palatáveis para canções no formato mais tradicional, digamos. “Antes Que Tu Conte Outra” torce e retorce o que era “padrão”, adiciona um sem fim de temperos na panela e prima pela variação dentro de cada música. Podemos considerar a mistura de um caminho natural com uma proposta deliberadamente “livre”?
Alexandre Kumpinski – É muito difícil pra nós conseguir diferenciar o que é deliberado ou não dentro dos processos que geram um disco. Talvez uma forma de simplificar a questão é dizer que, quando a gente se juntou numa casa pra fazer a pré-produção do “Antes que tu conte outra”, o que reinava na atmosfera era uma sensação de liberdade pra fazer o disco que a gente tava afim de fazer, sem se preocupar com o quão diferente ou parecido ele seria com algo que a gente já tivesse produzido antes. E o disco acabou soando do jeito que soa.

Movin’ Up – O “Acústico-Sucateiro” me parece fundamental no processo de usar itens e elementos incomuns para criar texturas próprias para as canções. A experiência dele foi a base para “Antes Que Tu Conte Outra”?
AK – Não só ele. Na verdade, as coisas vão se encadeando como uma rede (mais do que como uma linha), e dentro disso é difícil apontar algo que tenha servido de base principal pro último álbum. Além dos arranjos, mudaram também o tom geral das composições, e até mesmo as nossas visões de mundo e as nossas posturas em relação a elas. Então muitas coisas, talvez até incontáveis ou intangíveis, acabaram sendo a base pra esse disco soar do jeito que soa. Inclusive a experiência com o “Acústico-sucateiro”, que serviu como uma espécie de laboratório onde se expandiram as possibilidades de arranjo pras canções que tínhamos em mãos.