Crítica: Sex/Life mergulha profundo nas narrativas da segunda temporada, mas no final nada no raso

Divórcio, a volta de um amor antigo e tentativas de recomeço são temas deste segundo ano da série

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Foto: Divulgação/Netflix.
Crítica: Sex/Life mergulha profundo nas narrativas da segunda temporada, mas no final nada no raso
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Na primeira temporada de Sex/Life, criada por Stacy Rukeyser, da Netflix, fomos convidados a entender o que se passava na mente de Billie (Sarah Shahi) através de escritos em seu diário. Casada com Cooper (Mike Vogel) e recentemente mãe de um segundo bebê, ela enfrentava desafios além da maternidade e toda a pressão que vinha com isso, já que a rotina sexual com o marido andava ruim das pernas. Aqui foi possível entender onde estava o coração da série, baseada no livro 4 Homens em 44 Capítulos, de BB Easton, visto que ainda que existam controvérsias, vindas principalmente de um pensamento mais conservador, o sexo era sim a chama acesa que ajudava a manter o matrimônio.

Isso porque, também de forma muito banal, os desejos sexuais dela na adolescência e início da vida adulta sempre foram um norte de suas escolhas e envolvimentos com os homens. O reencontro com o ex-namorado Brad (Adam Demos) que o diga, veio para abalar de vez as estruturas de Billie e Cooper. Ele quem, por sua vez, incubido de um sentimento frágil de sua virilidade se viu dentro de uma competição para reconquistar a esposa, já que através das palavras dela no diário, o sexo com o ex era avassalador e cativante.

O primeiro ano da série parte daí, nos fazendo acompanhar as tantas divagações de Billie pensando no ex, tentando salvar o casamento, enfrentando suas questões com o próprio corpo após as gravidezes e explorando a fundo esta verve erótica, ainda que apenas por flashbacks. A protagonista se viu presa nesta dicotomia, em que em um lado estava seu marido bonzinho e responsável que não lhe supria na cama e do outro, o ex-namorado problemático, quem, vale ressaltar, lhe causou traumas após reagir super mal com a notícia de um aborto que ela sofreu, mas que apesar de tudo, satisfazia seus desejos sexuais.

O erótico aqui, diferentemente de produções da Netflix massacradas pela crítica, como a fraca 365 Dias, é na verdade o motor das relações interpessoais e individuais. Entender como o sexo influencia na vida dos casais e de pessoas adultas, quem já pensam terem construído uma vida e estão num estágio de comodismo, é o propósito da série. Esta missão segue na segunda temporada, partindo dos acontecimentos do desfecho da primeira remessa de episódios.

Após um aparente acerto com Cooper, Billie se deixa levar pela impulsividade e vai atrás de Brad à procura da consumação de tudo o que vinha imaginando com ele. A primeira surpresa do roteiro, é a postura contrária do galã com essa decisão. O mesmo Brad que pediu Billie em casamento, agora lhe rejeita porque já está com outra e mais, será pai (fato mais intenso para a personagem principal visto o histórico do aborto). Com Cooper, ela adentra em um processo de divórcio. O que de início, para ele, parece ser um acontecimento banal, já que sua vida seguiu com Francesca (Li Jun Li), sua também colega e chefe de trabalho.

Sem saber muito em que estágio sua vida está devido às mudanças drásticas, a protagonista ruma para o enfrentamento das consequências de suas decisões ao mesmo tempo que se vê atingida por um novo interesse amoroso, o encantador dono de restaurante Majid (Darius Homayoun). Ainda que leve em consideração todo o trauma que viveu, e diga a si mesma que precisa de um tempo para se recompor, a parte interna de Billie que acredita numa felicidade apenas possível na companhia de um homem, fala bem mais alto. Confusa, ainda impulsiva e nada curada da paixão avassaladora por Brad, ela lida também com o novo envolvimento e com o fato da maternidade influenciar no andamento ou não dessa história.

O roteiro nos acostuma a entender a protagonista como um caso quase que perdido e inesperado, o que felizmente cativa uma maior atenção no desenvolver de Sasha (Margaret Odette), melhor amiga da personagem principal. A escritora, uma mulher preta, quem construiu toda uma carreira de sucesso de forma independente e determinada por sua autonomia ganha um maior destaque com o retorno de um antigo amor, o doutor Kam (Cleo Anthony). É interessante assistir as reflexões que esse retorno causam a personagem, já que a mesma trabalha em seus livros a defesa da mulher desprendida, que não precisa de um homem para nada, entretanto se vê de cara com o amor verdadeiro.

Diferente de Billie, a jornada de Sasha prioriza a própria carreira e após anos anulando um desejo de compartilhar a vida com alguém, enxerga essa possibilidade sem precisar desistir de si mesma. Outro destaque fica para o personagem de Mike Vogel, Cooper. Se no início, soou que o divórcio com Bille não surtia efeito algum, não demora muito para a ideia ser refutada. Um homem ressentido, extremamente culpado (ainda que não reconheça) pelo fracasso do seu casamento traz múltiplas camadas para o personagem retirado ainda mais de sua zona de conforto como um homem apenas bom e responsável.

A ideia de um machismo velado é muito explícita neste núcleo, já que a decepção e a não aceitação de ser um dos motivos da separação, roubam a razão de Cooper e o levam a medidas extremas para provar a si mesmo que não há nada de errado com ele, mas há. Mike Vogel é o ponto alto em atuação aqui.

Porém, ainda que tenha se renovado em trama e dado novos campos para todos os personagens, a série não só parece como regride tudo o que caminhou em seu desfecho. Antes mesmo, a aparição repentina das amigas casadas de Billie e o discurso de que foram influenciadas pelas atitudes dela, e o que se desenvolve de forma superficial com isso já mostraram a fraqueza do roteiro. Entretanto, o que podia ser relevado fica imperdoável com os trajetos que toma o último episódio em específico.

Todos os problemas de todos os núcleos apresentados serem resolvidos e terem um final feliz chega a ser medonho e até preguiçoso a nível de coerência e criatividade. Isso porque, as soluções vieram de forma quase instantânea. O roteiro atropelou tudo o que construiu de novo durante a temporada inteira e estacionou no óbvio. Algumas críticas mencionam a participação discreta de Adam Demos, como Brad, na temporada, mas a verdade é que a chegada mais incisiva do personagem dele e a proposta que carregava foi o que contribuiu para esta decadência.