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Crítica: Jonathan Ferr celebra um novo tempo ao som do urban jazz no disco Liberdade

Álbum conta com participações de artistas como Tuyo, Jesuton e Kaê Guajajara

Crítica: Jonathan Ferr celebra um novo tempo ao som do urban jazz no disco Liberdade
4.5

Jonathan Ferr
Liberdade
Slap/Som Livre, 2023. Gênero: urban jazz, pop

A trajetória musical de Jonathan Ferr quanto a seus álbuns de carreira solo, é interligada, como uma narrativa. Em Trilogia do Amor, dividido nos capítulos: “A Jornada”, “O Renascimento” e “A Revolução”, lançado em 2019, o pianista, cantor e compositor traçou uma linha desbravadora sobre o sentimento que dá título ao trabalho. Em 2021, o álbum Cura, veio com o peso de um período pandêmico evocar esse processo de “curamento”, como se refere o artista ao que seria o trajeto da cura, que não é instantâneo, mas sim um movimento. Este traz composições que protagonizam o piano na intenção de sarar as dores, trazer conforto, renovação. Na poética inspirada de Ferr, depois de Cura, ou seja, depois de ser curado vem a Liberdade, estado de espírito, sentimento e título de seu novo álbum.

O lançamento do trabalho veio acompanhado de um curta-metragem potente e extremamente significativo. A canção “Meu Sol” com Rashid é combustível da narrativa, e faz com que as intenções do novo disco sejam expressas a partir da celebração de um novo tempo que cá está. Contando com a participação do grande Ailton Graça, quem interpreta um representante político preto que assume o poder, assistimos a ilustração mais pura do que é afrofuturismo, na reunião de jovens pretos que festejam o início de um futuro melhor, ao mesmo tempo que retrata corpos marginalizados por um presente opressor.

O videoclipe é a letra em imagens e além de evocar com estrofes da canção tipo “Como um sol que nasce todo dia, meu sol vai nascer também”, traz nas palavras do personagem de Ailton Graça afirmações dessa nova era, como “Vamos voltar a ser felizes!” e “Liberdade é amar sem medo!”

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Nesta energia, Jonathan faz nascer Liberdade, trazendo consigo uma gama de artistas que orbitam no movimento ancestral, afrofuturista, urbano, espiritual, elementos que constituem sua identidade artística. A reunião traz expoentes da nova cena da música contemporânea e popular brasileira. Cada faixa, revela uma participação, promovendo a interação da diversidade de artistas com a atmosfera do urban jazz de Ferr, assim como as trocas de linguagens nascidas de cada colaboração.

O instrumental “Correnteza” é um prelúdio que dá espaço para a faixa homônima, colaboração com Kaê Guajajara e Devaneio Beatz. As influências da música popular originária são percebidas nos sopros pontuais dos passarinhos e na interpretação de Kaê, que canta em sua língua nativa, versando na letra sobre a liberdade dentro de uma relação amorosa.

Com o arco das águas em comum, “Rio Nilo” traz o canto de Luedji Luna e os versos da rapper Stefanie, metaforizando os fluxos das águas de um rio com a vida humana. Enquanto, “Mar Profundo” traz as vozes hipnóticas de Tuyo, revelando o eu lírico como um mar profundo, complexo, onde pode se afogar e assim alcançar a emancipação, a cura, a transmutação. E “Gota” com Blackalquimistas, com os vocais suaves de Tássia Reis, canta otimista sobre mostrar o melhor de si, evocando uma gota que basta para transbordar.

”Lá Fora”, é colaboração com Zudzilla e Coruja. Contando histórias de resiliência, a faixa é uma reflexão sobre dias ruins que vão e vem, bastante carregada pelo flow e os versos certeiros do hip hop. “Preterida” com Luna Falcão e Melly, traz destaque ao piano de Jonathan, onipresente no disco, enquanto as vozes cantam um mantra de auto admissão de sentimentos. 

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Disco de Ferr reverbera consciência social. (Foto: Renan Oliveira/Divulgação).

“We Never Change” é uma surpresa ilustre, em inglês, com a cantora britânica Jesuton em contato com o som de Ferr, numa faixa charmosa e romântica. Já “O Amor Não Morrerá” encera o disco trazendo na voz em vocoder de Ferr, um compilado muito bem feito das intenções do disco. Quase irmã de “Meu Sol”, reforça “O amor é o que liberta” e “Liberdade é não ter medo de amar”.

Jonathan Ferr segue inovando. Sua posição como expoente do urban jazz no Brasil desde Trilogia do Amor é competentemente renovada com Liberdade, à medida em que, de forma muito consciente e social, ele promove essa convergência entre os estilos. Julgado no início da carreira por “não fazer jazz” por profissionais do ramo contaminados de uma moral totalmente elitista do gênero, Jonathan não só faz, como cria o jazz nessa troca de elegâncias do que vem da música clássica com o que é produzido no som das ruas, da periferia. Isso tudo fluindo num discurso político, ancestral e essencial para a arte no país. A sonoridade e as propostas do disco vindas principalmente neste momento de reconstrução democrática que vive o Brasil, expressam, de fato, a liberdade.