Crítica: Duda Beat e a coroação do romantismo indie brasileiro

Duda Beat por Ana Alexandrino 3
Foto: Ana Alexandrino/Divulgação.
8.5

Em meio a um cenário onde as relações amorosas tornam-se cada vez mais fugazes e instigam desapego, tendo os aplicativos de relacionamento como um dos principais fomentadores, Duda Beat faz um manifesto em favor do romantismo em seu álbum de estreia, intitulado Sinto Muito, e lançando no final do semestre passado.

Nascida em Pernambuco e radicada no Rio de Janeiro, a cantora começou a dar seus primeiros passos no cenário musical há dois anos, quando ela apresentou suas letras ao produtor e amigo de infância Tomás Tróia. Foi desse encontro que seu primeiro registro de inéditas foi sendo construído e lapidado até ser entregue ao público.

Um disco carregado de letras sinceras que abordam as dores causadas por expectativas amorosas não-correspondidas, relacionamentos efêmeros e também da entrega aos amores que não são recíprocos. Ainda que os versos sejam curtos e repetitivos, eles são certeiros e sintetizam cada sentimento vivido por qualquer um que tenha passado pelas mesmas decepções narradas nas canções.

É com “Bixinho”, canção que brinca com a malemolência do samba, que a interprete desabafa sobre o próprio não enquadramento nessas relações contemporâneas. Marcada pelos versos “Eu nunca senti/ Desapego por ninguém/ Por você experimentei/ Não resisti.”, Duda encaminha a obra para as confissões de fragilidade e vulnerabilidade que tal experiência a ocasionou. “Pro Mundo Ouvir” narra a espera da cantora por um amor que a atendesse suas necessidades afetivas, mas que, ainda que o tenha encontrado, percebe que não era o amor romântico que tanto ansiou. “Back to Bad” complementa exatamente essa decepção quando os versos “A vida inteira/ Eu quis me dar inteira/ Mas você só queria a metade” são entoados.

Cada canção em Sinto Muito tem a característica de complementar ou aprofundar os sentimentos expostos nas canções anteriores, proporcionando uma viagem pela experiência amarga encarada por Duda e que reflete na vida daqueles que passaram pelo mesmo. É um disco de caráter pessoal, mas que não deixa de dialogar com o ouvinte.

E são com essas dores do passado que Sinto Muito recorre para a construção de um registro carregado de alto astral, fruto da própria superação da interprete, e de uma versatilidade na qual Duda e Tomás transitam entre influências e elementos que vão desde o samba e a bossa nova até aos ritmos nordestinos. Logo na faixa de introdução, o ouvinte mergulha em arranjos sintéticos que abrem caminho para a divertida “Bébi Beat”, segunda faixa do álbum, que apresenta uma mistura de elementos eletrônicos e orgânicos que transformam os demônios vividos por Duda em algo levemente cômico.

É visível a preocupação da pernambucana e seu amigo em não transformar o álbum em uma obra melancólica. Nos versos que expõem tamanha delicadeza acinzentada sobre o amor, a cantora não poupa em apresentar arranjos cheios de energias. Em faixas como “Parece Pouco” e “Derretendo”, a pernambucana radicada no Rio inclina-se para o rap, preenchido por batidas e efeitos eletrônicos; em “Bolo de Rolo” ela flerta com o reggae praiano; já na delicada “Todo Carinho”, o disco encerra com uma bossa-nova adocicada.

Em Sinto Muito, Duda Beat revive as frustrações do passado para se reafirmar como uma mulher antiquada romanticamente, ao preferir aos amores duradouros e intensos ao invés das relações efêmeras. Ainda que as experiências amorosas sejam recorrentes para alimentar a poesia da música de muitos artistas, principalmente brasileiros, a pernambucana inova ao se apropriar de elementos do pop com maestria. Ela brinca com os próprios sentimentos, estabelece um dialogo com aqueles que já sentiram as mesmas decepções e embala tudo isso em arranjos criativos, ecléticos e que passeiam por diversos gêneros e influências.

DUDA BEAT
Sinto Muito
[Independente, 2018]
Produtor: Tomás Tróia

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