O poeta, escritor e compositor Antônio Cícero faleceu na quarta-feira (23), aos 79 anos, em um procedimento de eutanásia realizado na Suíça, onde a prática é legalizada. O autor sofria de Alzheimer, que o levou a optar por essa forma de morte assistida, devido ao que descreveu como um “esquecimento insuportável”.
A morte foi confirmada pela Academia Brasileira de Letras (ABL), da qual Cícero era membro desde 2017. Em uma carta de despedida, ele expressou seus sentimentos e justificou sua decisão.
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“Queridos amigos,
Encontro-me na Suíça, prestes a praticar eutanásia. O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem.
Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi. Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia. Não consigo me concentrar nem mesmo para ler, que era a coisa de que eu mais gostava no mundo. Apesar de tudo isso, ainda estou lúcido o bastante para reconhecer minha terrível situação.
A convivência com vocês, meus amigos, era uma das coisas — senão a coisa — mais importante da minha vida. Hoje, do jeito em que me encontro, fico até com vergonha de reencontrá-los. Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo. Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade. Eu os amo muito e lhes envio muitos beijos e abraços.”
Nascido no Rio de Janeiro em 6 de outubro de 1945, Antônio Cícero se dedicou à carreira de poeta desde a infância. Ele se formou em filosofia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC | Rio) e pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), além de ter estudado na Universidade de Londres, após um período de exílio durante a ditadura militar brasileira.
Cícero destacou-se tanto na poesia quanto na filosofia, sendo seu poema Guardar (1996) reconhecido como um dos “cem melhores poemas brasileiros do século” por Ítalo Moriconi. Em sua carreira, ele também se tornou um letrista renomado, escrevendo músicas para sua irmã, Marina Lima, como os sucessos Fullgás (1984) e Pra Começar (1986). Ao longo dos anos, sua obra atraiu a atenção de outros artistas da Música Popular Brasileira (MPB), como Lulu Santos, Maria Bethânia e Cláudio Zoli.