morta de sono. morta de sono. o meu medo é morrer de sono e não dormir, sofrer de olhos abertos até o teto-preto da exaustão. normalmente o que se segue são os piores sonos, dos quais se acorda parecendo que não se dormiu.
um saco ter saído insone na vida. preferia ser do tipo escapista, que dorme demais. nas minhas piores crises, atravessava a madrugada dura até a primeira clareza do céu. deprimente, o sol nascendo. então comecei a tomar drogas. as legais, para dormir. doses abusivas de frontal, o mais forte que tinha. pílula e meia, duas. tentei passar pra coisas mais leves, tarjas vermelhas e tal. piada. voltei pro frontal, variei pra lexotan, funcionava médio. às vezes apelava pra vodka do congelador, pra ver se batia aquela tonteira. só me derrubou uma vez.
sono de remédio controlado é esquisito. o corpo descansou, mas você não. é como se você fosse uma máquina, um computador problemático que desliga a cpu, o monitor, mas o sistema operacional continua rodando.
a maravilha do rivotril é a relaxada mental, o distanciamento do medo de não conseguir dormir e, finalmente, o desesperadamente desejado sono. medo de não conseguir dormir é um inferno a mais. você deita e começa. mesmo quando se toma remédio. você toma o remédio e começa a pensar em quanto tempo vai apagar, se não apagar vai ter que aumentar a dose e, aumentando a dose, medo de ficar viciado ou ter um troço. tenho medo, logo não durmo.
não bastasse minha tendência à insônia, ainda sou daquelas que tem um dia de merda se não durmo direito. porque tem aquele povo abençoado que vai dormir às quatro e acorda às sete e meia pro trabalho, e tem um dia razoável. eu não tenho dias razoáveis nessas condições. dias assim só servem para me lembrar a toda hora que eu não dormi. meus ossos reclamam, meus olhos ardem, meu estômago não entende nada. não consigo pensar direito, não sei agir. tomo café, mas nunca confio. às vezes ajuda, muitas vezes não. muitas vezes só me deixa ligada, irritada, e torna a experiência toda um pouco mais degradante.
insônia é um pesadelo que se tem acordado.
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[+] Joana Coccarelli é jornalista, autora do blog Narghee-La e idealizadora do Coccarelli.art, coletivo de artistas, blogueiros e escritores. Escreve nesta coluna sobre estética, design e moda.