O novo disco de Solange, When I Get Home, reafirma seu estilo: trata-se de um registro de timbres suaves arranjos intimistas e experimentais em canções de R&B com toques de old soul, jazz e hip-hop. O trabalho conta com participações de nomes como Sampha, Gucci Mane e Panda Bear.
Irmã mais nova de Beyoncé, a carreira artística de Solange Knowles começou muita nova. Ela lançou seu primeiro álbum, Solo Star, em 2002. Mas, foi em 2016 que ganhou notoriedade mundial pelo seu álbum A Seat at the Table (eleito Melhor Disco do Ano aqui n’O Grito! e em vários outros veículos). Tanto no trabalho anterior quanto neste fica claro o interesse em tratar do empoderamento feminino e de pautar uma crítica ao racismo na sociedade norte-americana. Falando nas irmães Knowles, Beyoncé também mantém a mesma postura de embate à violência contra os negros e discute questões raciais em trabalhos como Lemonade e The Carters, mas com um apelo mais pop.
O mais novo trabalho de Solange traz um trabalho que investiga nossas origens, questionando o quanto de nós mesmos carregamos conosco, versus o que deixamos para trás na evolução. Isso diz muito sobre ancestralidade dos povos negros que foram e são marginalizados até hoje na sociedade norte-americana, como também da resiliência deles. Não é uma realidade distante do que acontece em outros países, como por exemplo, no Brasil.
O álbum inclui contribuições de Tyler, the Creator, Chassol, Playboi Carti, Standing on the Corner, Panda Bear, Devin the Dude, The-Dream, Pharrell Williams e muito mais. Solange passa os 40 minutos de “When I Get Home” evidenciando o poder do povo negro do qual está inclusiva. Isso fica latente na música “Almeda”: “Estas são coisas de propriedade negra / A fé negra ainda não pode ser lavada / Nem mesmo naquela água da Flórida”.
Essa resistência a partir das questões identitárias já tinha sido abordado no álbum anterior, A Seat At The Table, a exemplo de “Don’t Touch My Hair”. Parceria com o cantor Sampha, a faixa falava sobre o cabelo que carrega toda uma história de luta dos negros e negras que, por muitas décadas, tiveram que alisar seus cabelos para se encaixarem no “padrão de beleza” propagado pela mídia. A analogia do cabelo com a alma é bastante forte. A temática que fala das raízes dos povos negros é fortemente trabalhada por Solange. Nas 13 faixas do seu álbum, ela traz seis interlúdios que se dividem em sons televisivos, diálogos e em poemas, mas que não deixa o trabalho enfadonho ou pesado demais. Em se tratando de um “álbum visual”, ela também pensou propostas audiovisuais para todas as faixas, que estão disponíveis em um filme disponibilizado na Apple Music.
Se aqui é possível expressar de forma mais clara minha opinião sobre o álbum, destaco, dentre as 13 músicas, duas em especial: “I’m a Witness” e “Dreams”. A primeira, que encerra o álbum, fala sobre não desistir. Traz uma mensagem de resiliência e de fortalecimento para os ouvintes, mas também para ela. “Eu não vou parar até que acerte/ Boa noite.” Já na segunda, diz respeito a não perder de vista os ideias e as raízes. “Eu cresci uma menina com / Sonhos, sonhos, sonhos / Sonhos, eles percorrem um longo caminho, não hoje.”
Mensagens como as de lutar contra as adversidades da vida, lembrar das raízes, nunca desistir, de se empoderar a cada dia, são temas abordados por Solange em When I Get Home. Essa maturidade artística fez com que ela pudesse realizar apresentações em celebrados espaços pelo mundo, incluindo o Radio City Music Hall, o Kennedy Center e o Sydney Opera House.
Sem dúvida, Solange Knowles nos entregou um excelente material artístico – ela também é dançarina e artista visual performática. A arte produzida por ela cumpre seu papel: um entretenimento crítico e bem distantes de clichês, superficialidades e alienações.
https://twitter.com/solangeknowles/status/1101611142374477825
SOLANGE When I Get Home [Columbia/Sony, 2019] Produzido por Solange Knowles, Panda Bear, Devonté Hynes, Earl Sweatshirt, Jamire Williams e outros