O VAZIO E A CIDADE
O adjetivo “fútil”, largamente utilizado por aqueles que olhavam torto para as aventuras cosmopolitas de Carrie, Miranda, Charlotte e Samantha, agora pode ser aplicado com razão. O filme nada mais é do que um interminável desfile de grifes em meio a atuações pífias e uma história vazia, que nem de longe lembra a inteligência da série. Aqueles que acompanharam fielmente as seis temporadas, episódio a episódio, e vibrou com cada conquista do fab four feminino mais pop da televisão, não encontra nas telonas a mesma acidez, perspicácia e sentimento do seriado. A essência que se conhecia de cada uma das personagens evaporou por completo. Aqui fazemos uma análise comparativa de cada personagem e seu comportamento na série e no filme.
Por Mariana Mandelli
Carrie, a estranha
Os conflitos de Carrie, vivida pela atriz-ícone fashion Sarah Jessica Parker, são romantizados no filme. O clichê de um casamento cancelado à beira do altar por um mal-entendido insípido não corresponde à astúcia de episódios como The Ex and The City (Ep. 30 – 2.ª Temporada), Boy, Girl, Boy, Girl… (Ep. 34 – 3.ª Temporada), The Real Me (ep. 50 – 4.ª Temporada) e A Woman’s Right to Shoes (Ep. 83 – 6ª Temporada). As questões que antes rendiam assunto para suas colunas e papos deliciosos com as amigas, agora aparecem idiotizados. O enredo forçado ajuda a extrair a substância da personagem, deixando a sensação esquisita de que alguma coisa está errada e que a Carrie do seriado não é a mesma do cinema.
Miranda, a chata sem sal
Quanto à Miranda, se você esperava reencontrá-la ácida, workaholic, reclamona e mal-humorada, esqueça. Cynthia Nixon não consegue reviver a chatice encantadora de sua mais marcante personagem – chatice esta que, na série, havia sobrevivido ao casamento e à maternidade. Aqui, ela não convence como mãe, esposa e mulher. A crise conjugal com Steve (David Eigenberg), ótimo mote para a personagem aflorar no filme amarga e ferida, não resolve a situação. As crises de neurose – como quando ela descobre a gravidez, no episódio Coulda, Woulda, Shoulda (Ep. 59 – 4.ª Temporada) – deram lugar a uma mulher sem sal e opaca.
Charlotte e o romance perdido
O mesmo ocorre com Charlotte. A mais chatinha das quatro, romântica e conservadora, passou a série tentando, a todo custo, engravidar – a quarta temporada de sua personagem é basicamente isso. No filme, vemos Charlotte feliz, casada com Harry (Evan Handler), mãe de uma chinesinha adotada e, quem diria, grávida. O que seria motivo de uma comemoração sem fim e de empolgação frenética dela, se transforma em uma vidinha cor-de-rosa totalmente artificial.
Samantha mantém o sexo e o humor intactos
A única personagem que parece ter resistido ao tempo, ao hype do filme e ao roteiro sofrível é Samantha (Kim Cattrall). Suas cenas, comentários e seu conflito (e a “resolução” dele) no filme – permanecer ou não em um relacionamento, coisa que nunca foi do seu feitio – foram trazidos com competência da televisão para o cinema. O mérito é todo da atriz, protagonista das cenas mais bizarras e divertidas da série – quem não se recorda dela com Sônia Braga? Ou namorando um baixinho? E de caso com um adolescente?
Sem Cattrall, o filme seria um fiasco completo, porque a impressão que se tem é que o elenco se esqueceu, em quatro anos depois do fim da série, de como era interpretar os personagens. Chris Noth, o ultracharmoso Mr. Big, pivô das maiores crises sentimentais de Carrie, não tem a mínima graça no filme. As piadas rápidas, os olhares intensos (quem não se lembra das sobrancelhas erguidas?) e a batalha emocional que ele travou consigo mesmo nos seis anos do seriado se perderam em um filme sem brilho.