Fela Kuti (Foto: Divulgação)
BLACK ZEPPELIN – OU COMO O ROCK DESEMBARCOU NO CORAÇÃO DA ÁFRICA
Gravadoras inglesas reforçam a demanda por músicas da Nigéria relançando artistas importantes do país
Por Gabriel Gurman
Assim como o Brasil na América do Sul, podemos dizer que a grande locomotora cultural na África é a Nigéria. Grande, não apenas pelo tamanho do país, mas, sim pela intensa produção cultural que lá existe, especialmente em Lagos, sua capital. Se hoje em dia é a indústria cinematográfica que chama a atenção (a chamada Nollywood), em décadas anteriores, foi a música que saiu das ruas de Lagos e invadiu o mundo.
Infelizmente são poucas os discos e vídeos que sobraram de uma época áurea, por volta dos anos 1970 – 80. Aos poucos, alguns trabalhos desses artistas vêm sendo relançados e compilados e na Europa cresce o interesse em descobrir novos velhos sons da Nigéria. Duas gravadoras inglesas, a Strut Records e a Soundway já disponibilizaram coletâneas com essas canções. A coleção da Soundway, ganha maior destaque pelo maravilhoso trabalho gráfico e também por separar em quatro discos os diferentes estilos que marcaram a década de 70, como os já citados rock psicodélico e o Afrobeat e ainda mais dois álbum com foco no blues que, aliás, mantém suas tradições até hoje.
São diversos os fatores que propiciaram e ainda propiciam essa imensa pluralidade artística. O país é dividido por centenas de grupos étnicos que, através da música, mantêm suas tradições e folclores. Além disso, o país possui uma avançada (para os padrões africanos) tecnologia para a gravação de música, que assim como os filmes locais, possuem um custo de produção extremamente barato.
Entre os anos 60 e 70, o rock’n roll já começara a se tornar um fenômeno mundial, principalmente com Beatles e Rolling Stones, e nos Campi de estudantes nigerianos não foi exceção – ainda mais pela influência da colonização britânica. A partir desse momento, começaram a surgir diversas bandas que, aos poucos, saíram dos guetos e passaram a ganhar destaque nacional. Mas foi graças ao produtor Odion Irouje – o mesmo que revelou Fela Kuti para o mundo – que o afro-rock passou a ser ouvido fora dos guetos. Na época trabalhando na EMI Nigeria, Irouje apostou e lançou os LPs das bandas Mono-Mono e a BLO.
Com o sucesso dos discos, Irouje abriu sua própria gravadora, a Afrosia, e passou a lançar, de forma mais barata, diversas outras bandas de rock psicodélico como Voices of Darkness, Joe King Kologbo, Eric Akaeze, entre outras.
É importante notar que este tipo de música estava longe de ser o “som da massa”. Apesar da aceitação e até mesmo do orgulho de ter bandas que estavam conectadas ao que havia de mais moderno no mundo, a cultura musical nigeriana é principalmente voltada à fusão de ritmos populares e genuínos que brotam da miscigenação das diferentes etnias. Com a globalização, foram incorporados elementos de músicas britânicas e americanas. Dessa maneira, surgiu o Afrobeat.
Em 1970, o cantor e compositor nigeriano Fela Kuti retornou de uma turnê pelos Estados Unidos com essa novidade: o funk. Incorporando-o com sua música tipicamente africana, Kuti rebatizou sua banda de Fela Ransome-Kuti & África 70 e o ritmo tomou conta das ruas de Lagos. A noite da cidade se transformou e se tornou referência não apenas na África, mas em todo mundo. Até mesmo aqueles que estavam mais ligados ao rock se renderam ao sucesso do disco-funk. Um exemplo foi Joni Haastrup, antigo líder do Mono-Mono, que em 1978, lançou seu primeiro disco solo, Wake Up Your Mind, pela também antes roqueira gravadora Afrodisia.
Foi exatamente no final da década de 70 que foram lançados aqueles discos considerados clássicos do Afrobeat nigeriano como Enough is Enough, de Jay U Experience, Odejimjim, do Dr. Adolf Ahanotu, Friendship Train, do SJOB Movement, entre muitos outros.
Se você quiser conhecer um pouco mais sobre a cena musical nigeriana na década de 70, segue abaixo uma lista de cinco discos importantes, da esquerda para direita: Nigeria 70: Lagos Jump; Nigeria Rock Especial; Fela Ransome-Kuti & The Africa ’70 (com Ginger Baker – Live!); BLO: Phases e SJOB Movement – A More In The Right Direction.