Excessivo, Humanz soa como uma trilha soturna sobre um mundo à beira do caos
Sendo bem direto: o Gorillaz é um dos grupos mais inovadores em atividade hoje no pop. Goste você ou não, o projeto encabeçado por Damon Albarn e o desenhista Jamie Howllet sempre teve o interesse de trabalhar com diversos gêneros, artistas de diferentes estilos e nunca se acomodou a um conceito ou sonoridade. E talvez por isso seus discos nunca foram unanimidade.
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Inquietos, os artistas humanos por trás do Gorillaz em geral soltam discos que soam inacabados, confusos, sempre primando pelo excesso. Damon Albarn é prolífico, soltando faixas e discos do Gorillaz a qualquer oportunidade (além dos álbuns de estúdio a discografia da banda conta com b-sides, discos natalinos, ao vivo, remixes, etc). Humanz, com suas impressionantes 20 faixas (26 na versão deluxe), a impressão é que os produtores não se decidiram sobre o que deixar de fora.
Após seis anos de hiato sem um disco de estúdio, Humanz chega como uma resposta da banda ao momento político atual, mas sem que as letras tragam explicitamente o nome Trump ou algo mais factual. O que fica claro é o tom sombrio, ora melancólico, ora indignado, de faixas como “Carnival” ou “Hallelujah Money”, com Benjamin Clementine. É como a banda quisesse servir de trilha para um apocalipse que se aproxima. É um tom menos divertido que a atmosfera dançante e irônica de Plastic Beach, o último trabalho.
É também o disco com o maior número de participações, com nomes importantes de diversas gerações, de Vince Staples e Jenny Beth (do Savages) a Carly Simon, passando por Rag’n’Bone Man e Pusha T. O pop aqui, como nos outros álbuns, foi buscar influências no R&B, hip hop e eletrônica. Para promover Humanz a banda decidiu pela estratégia de dominar as plataformas de streaming semana a semana, com sete faixas lançadas previamente, “Saturnz Barz”, “We Got The Power”, “Ascension”, “Andromeda”, “Let Me Out”, “The Apprentice” e a primeira, “Hallelujah Money”.
Foram faixas antes do disco propriamente dito que era de se esperar que praticamente não teríamos nada de muito impactante. Mas uma das melhores músicas quase ninguém percebeu, “Submission”, com vocais de Danny Brown e Kelela. Com uma base soturna, mas numa levada animada, a música é uma das melhores da banda. Outro bom momento: “Charger”, com Grace Jones, batida pesada e monótona que combina bem com o duelo vocal de Jones e Damon Albarn.
Ainda que este seja mais um disco irregular, com hits dividindo lugar com faixas menos inspiradas, o Gorillaz merece o mérito de seguir trilhando caminhos difíceis, apostando em produções cheias de ousadia, abrindo espaço para todo tipo de colaboração, se arriscando, enfim. E faz tudo isso dentro de uma estética de desenho animado com narrativa multimídia. Não é pouco.