Maurício Angelo: O fim e o princípio

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Foto: Beautiful Paper

Senhor,

A primeira grande ironia é que, mesmo quem não “acredita” ou não vive sob os preceitos do cristianismo, está sob a sua chancela do tempo. Que este 2009 traga um pouco de sabedoria para os pobres de espírito. Conhecimento não. Ele também, na verdade. Mas ele só é bem vindo se vier junto da sabedoria. É difícil, eu sei. Algumas das pessoas mais inteligentes que conheço são também as mais ignorantes. Quanto falta para se tornarem “seres humanos” de fato! Não peço piedade a estes. Ao contrário, faça deles o que bem merecerem.

O ano será miserável, tudo indica. O crack só vai ficar maior. Uma série de aumento de impostos já foram anunciados. Nada que abale quem sempre teve grana pra pagar. Quem não conhece o valor do dinheiro, ou jamais teve que se preocupar com ele, na maioria dos casos acaba não dando valor a si mesmo. Conversando com um amigo, estes dias, conversávamos sobre isto. Temos o velho hábito de trocar emails longos. Ardorosos. Intensos. Discordamos frontalmente de quase todos os assuntos que travamos. Mas, no fundo, nutrimos um respeito e uma admiração mútua essencial. Mais que isso, o confronto, a fissura, é que nos dá a oportunidade de ir um pouco além em nossas próprias concepções.

Ele acredita no indivíduo, não na massa. Na mudança de postura, na educação liberal e numa vida espiritual ativa (independente de qual “linha” seja). No auto-conhecimento e a elevação da consciência. Eu também. Em parte, da maneira totalmente diversa. Isso tudo é apenas para ilustrar o quanto eu acho cômico quando duas pessoas simplesmente são incapazes de conviver ou conversar sem cair em agressões gratuitas, estupidez e animosidade. Conheci pouquíssimos debatedores de respeito ao longo da minha vida. Pouquíssimos. Eu mesmo já fui contaminado muitas vezes por essa baixeza de caráter tão ridícula e asquerosa. Tento evitar.

Provavelmente, 95% das pessoas que estão lendo isto aqui não estão interessadas neste tipo de papo. Não o subestimo, leitor. Apesar do meu vício em sempre subestimar alguém de antemão. O que no fundo é positivo. A chance dela me surpreender agradavelmente é consideravelmente alta. A verdade (ohh) é que pra maioria dos mortais ser inteligente é um pecado. É careta, chato, etc e tal. E outra parte que acaba caindo demasiadamente no “academicismo” se acha tão superior que acaba por se tornar mais burra e insuportável que a maioria. Parecem esquecer o quão nojentos são. Basta lembrar do CDF da escola. Para o adolescente, o CDF é o estereótipo do que NÃO se deve ser. É o cara estudioso, “certinho”, que tira notas boas e é ligado em certas coisas que a maioria despreza ou tem vergonha de admitir. Não dá pra esperar nada da educação num país em que a inteligência é motivo de vexame.

A principal resolução para 2009 deveria ser acabar com o maniqueísmo. Só assim dá pra viver num ambiente minimamente razoável. Sem a destruição por completo do maniqueísmo, as pessoas, as conversas, os assuntos, o comportamento, a mídia, as artes, etc, etc, etc, se tornam totalmente insuportáveis. E estéreis. Natimortas. São desinteressantes de berço. Será tão difícil pro homem aprender que o mundo não se baseia SEMPRE em conceitos extremos e opostos? Desconfie profundamente de qualquer tom radical, extremo e maniqueísta. É um sinal inequívoco de ignorância (um pouquinho além daquela a que estamos todos inapelavelmente condenados).

O título deste texto foi chupado diretamente do documentário de mesmo nome de Eduardo Coutinho. Procure saber. Na vida miserável daquelas pessoas do interior da Paraíba há mais saber e genialidade do que em boa parte do resto que tenho contato.

Nada indica que 2009 vá ser melhor. Importa somente que você tenha novas experiências e saiba aproveitá-las. Porque nada adianta encontrar-se com o novo e não extrair absolutamente nada daquilo. Um mal comum. O meu grande amigo Huxley disse uma vez que “experiência não é aquilo que acontece com o homem, mas o que o homem faz com aquilo que lhe acontece”. Tem gente que passa a vida inteira e não “melhora” e “aprende” absolutamente nada.

Novos sabores, lugares, pessoas, desafios… experimentar algo desconhecido. Sem o que não conhecemos o mundo não teria graça alguma. Fiz tanta coisa que nunca havia feito em 2008 que é impossível tentar enumerar. Meu único objetivo em 2009 é, naturalmente, ir aumentando esta lista. Não precisa ser nenhum gênio para perceber que a rotina e a acomodação (mental, espiritual, física, intelectual, financeira, humana, artística…) acaba com qualquer um.

Tudo que nos toca e define está no campo das emoções. Na mente, no sensível, no imaterial. Tudo surge a partir daí. Num mundo onde 2,6 bilhões de pessoas não tem onde fazer suas necessidades, é até…isso não é conversa de Unicef. É realidade. Meu inimigo, se é que posso chamar assim, é quem sempre teve  tudo na mão. Na verdade tenho pena. Profunda pena destes. Provavelmente JAMAIS chegarão a algo que dê para chamar de ser humano.

Esta colcha de retalhos que eu chamo de texto e não tem forma definida (se crônica, se artigo, se divagações…) é a minha despedida de 2008 (que foi absurdamente ótimo, obrigado) e o meu olá a “2009”. A coluna vai entrar em férias. Não por muuuuito tempo. Estarei perto da natureza e de quem amo. NADA é mais importante que isto. Vou lá me reencontrar com o oceano e ver o que, em sua infinita história e conhecimento, ele tem o que me transmitir. Concreto cansa. Toda pessoa saudável deve se cansar.

E eu espero que você esteja fazendo algo muito melhor do que sentar a bunda na frente do computador o dia inteiro. Vá tomar um pouco de ar, por favor. Cuide-se. A gente se vê por aí.

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[+] Maurício Angelo é jornalista e escritor. Atualmente edita os sites Movin’ Up e Crimidéia.