O MONSTRO QUE NÃO METE MEDO
Com a importância supervalorizada, novo disco de Lady Gaga expôe suas deficiências musicais, em contraponto à hiperprodução de seu vestuário
Por Paulo Floro
Da Revista O Grito!
Que o pop sempre foi feito de factóides, já é sabido. Isto é sempre lembrado quando alguém se atina a falar de Lady Gaga numa crítica ou reportagem mais analítica. A intitulada “Diva Monster” é o exemplo mais bem acabado de artista da era do remix que corre esses dias. O problema, que fica evidente nesse novo Born This Way, lançado esta semana, é que de tanto reciclar, a cantora chegou num ponto crítico em que nada mais tem profundidade. O estilo “Gaga” de ser, aquele tempero que torna único cada artista pop começa a ficar mais diluído no meio de tantas apropriações.
Se nos dois discos anteriores tínhamos uma cantora criativa em mostrar outros olhares do que já tinha sido tão explorado, neste as ideias parecem não ter mais tanta força. Pra piorar, as expectativas foram frustadas depois de meses fazendo hype do disco, o vendendo como um passo além do que já foi feito no pop. O grande sucesso que ela conquistou nos últimos dois anos também ajudou a aumentar a espera, e colocar ainda mais fé de que continuasse numa curva ascendente.
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Divas em xeque: Lady Gaga
Galeria: As montações de Gaga
Born This Way mostra uma Gaga sem foco. Com 17 faixas, ela vai do dance poperô de boate até às baladas melosas, passando pelo synth-pop, techno, lounge e música eletrônica. Claro, há alguns bons momentos que a livram de cair na total irrelevância, mas a confrontam na sua pecha de visionária. “Marry The Night”, “Scheiße” e “Judas” entram para a coleção de hits memoráveis da cantora. Enquanto isso, diversas outras partes do álbum o fazem cansativo para quem tem tantas opções no concorrido mundo pop de cantoras.
Segundo Gaga, o disco é sobre um estilo de vida, tem pedaços autobiográficos e foi dito que é uma tentativa de transformar em música o seu discurso. Bem, levando em conta que “discurso” no dicionário da cantora é puramente estético, o disco está aquém. Ao contrário de outras artistas como Madonna e mais recentemente, Beyoncé, Lady Gaga não conseguiu tornar crível qualquer postura que fosse. Tenta ser uma porta-voz da comunidade gay, mas é conservadora no quesito sexualidade. Vende uma superficialidade, marcada pela superprodução e faz entender que transgredir é andar feito uma palhaça alienígena com uma privada na cabeça.
Gays que a devotam com uma fé cega de que podem seguir seus passos e ir além são seus defensores, mas nem eles mesmos conseguem transpor em palavras o que ela significa. Com algum conteúdo, Beyoncé consegue criar boas canções sobre emancipação da mulher, ou Madonna que conseguiu capitalizar sua sexualidade após anos de repressão católica. Ninguém é preciso ser conscientizada para fazer boas músicas, mas no caso de Gaga, por sua superexposição, sua importância é valorizada. É divertido ver alguém quebrar protocolos, andar nua no frio europeu, vestir um vestido de carne em uma premiação, ou colocar um chapéu de lagosta, telefone, e mais recentemente, andar com apliques na pele para parecer uma espécie de demônio.
Enquanto sua performance continua encantando fãs e estetas e fazendo rir o resto das pessoas, amantes de boa música pop além da devoção ficam no aguardo de músicas tão marcantes quanto suas roupas. Born This Way ao menos serviu para colocar Lady Gaga em xeque e expôr sua musicalidade pobre e carente de novas ideias. Até o final do ano seremos bombardeados com novos clipes dos singles deste disco, e talvez até lá, pela repetição, estaremos mais acostumados.
LADY GAGA
Born This Way
[Interscope, 2011]
NOTA: 4,0