Por Biu, especial para O Grito!
Depois da experiência um tanto quanto inusitada da Rosa dos Ventos no Cinemix passei a chafurdar nos becos da Boa Vista. Tenho um informante muito atento na área que sempre me avisa sobre algo novo no pedaço. Talvez movido por um prazer sórdido, desejando provar para mim mesmo que ao ser testemunha da reedição da lascívia, que em tempos bíblicos provocou a destruição de Sodoma e Gomorra, nada mais estarrecedor poderia ser testemunhado, eis que meu informante com a cara mais inocente do mundo me dá a dica: num cinema GLS da rua Corredor do Bispo (conhecida também como corredor da Bicha) também tem show de sexo ao vivo, só que com rapazes!
A primeira pergunta foi incontornável: Mas, com a platéia participando espontaneamente como no Cinemix? Subindo no palco para transar sob os olhos atentos da platéia? Claro, me respondeu ele. Na minha ingenuidade (sim, sou uma pessoa pura e recatada, apesar de investigar esses baixios das bimbas) achei que ele estava tirando onda com minha cara. Todavia, quando fui ver a Rosa dos Ventos, carreguei comigo a mesma incredulidade e deu no que deu. Não tive dúvida, arregimentei dois companheiros curiosos por estas incursões e lá fomos nós, em plena segunda-feira, tirar a história a limpo.
O Cine Boa Vista é um estabelecimento discreto quando passamos apressados pela Corredor do Bispo. Cerâmica preta e vermelha na fachada e uma pequena entrada que permite vislumbrar um bar e homens passando pra lá e pra cá ao som de música disco. A um passante desavisado apenas mais um bar gay da área. Entramos, depois de nos identificarmos no guichê na portaria a um rapaz atencioso e pegar um cartão com código de barras para registrar o consumo na casa. Para uma segunda-feira, o lugar estava movimentadíssimo. Num pequeno espaço logo na entrada a céu aberto, mesinhas com duplas ou pequenos grupos bebericando e conversando. Virando à esquerda, uma sala com quatro computadores conectados à Internet, sofás fixos com mais homens jovens e senhores conversando e uma televisão colocada num dos cantos. A freqüência aparenta ser mais refinada que a do Cinemix. Um intenso vai-e-vem podia ser observado por uma entrada ao fundo e outra que leva aos banheiros e uma escada espiral que conduz ao primeiro andar.
Pegamos uma cerveja para nos mostrarmos integrados ao ambiente e iniciamos a nossa excursão. A exemplo do Cinemix, o local tem uma sala grande com projeção de filme de sexo hetero; uma menor, no primeiro andar, com sexo gay; cabines para encontros furtivos, sendo que nas cabines da direita um vidro permite que o casal assista ao filme hetero enquanto efetiva sua própria produção. Tem também o famoso dark room, onde só Deus sabe o que rola lá dentro, e mais três suítes que podem ser alugadas e às quais se tem acesso por uma entrada por trás da tela principal. No mais, a mesma situação, rapazes flertando, outros, mais ousados, expondo seus dotes ou, simplesmente, felizes na prática do onanismo no escurinho do cinema diante das cenas de sexo virtual da tela.
Claro, que feita a primeira ronda, nosso interesse se voltou sobre o espetáculo de sexo explícito ao vivo, motivo da visita ao estabelecimento. Um pequeno cartaz colocado na entrada da sala maior mostrava que nossa ida ao cinema não tinha sido em vão. Procuramos saber a hora em que teria início a apresentação. Depois da novela, foi a resposta. Cooomo? Sim, disse um rapaz, habituê do pedaço. Neste exato momento, notamos uma intensa movimentação rumo à sala principal. Seguimos os demais e a sala repleta não desgrudava os olhos da tela. Só que em vez do boquete de uma loura de farmácia em um negro de pênis avantajado, como tínhamos visto há pouco, quem estava lá eram Donatela e Flora. O inusitado da situação era digno de um estudo do Observatório da Mídia ou de alguma pesquisa sociológica sobre a influência da televisão nas sociedades contemporâneas. Durante o capítulo em exibição, notamos que as atividades eróticas do local eram tão intensas quanto as das melhores famílias, ou seja, o grau zero da sensualidade. Bom, fazer o que. O jeito foi esperar.
Quando começou a última parte da novela, o clima de sala de estar, porém, mudou. Uma certa excitação foi aos poucos se mesclando aos diálogos de Flora e Donatela. Um homem ao microfone, passou a anunciar que depois da Favorita seria a vez dos favoritos. A este sinal corremos para a sala e procuramos um lugar estratégico de modo a não perder nada do que viria a seguir. Foi quando um diálogo na novela deu o tom. Flora fazia palavras cruzadas e lembrou que uma vez Donatela ganhara uma partida com ela num jogo qualquer por conta da palavra OITI. O termo causou, de imediato, um intenso frisson na platéia, sobretudo quando Flora perguntou à outra se oiti se come. Dito isto, cortaram a novela, e uma música disco entrou em cena junto com três rapazes totalmente despidos e mascarados que começaram a passear entre as poltronas, enquanto um sofá era colocado no palco. O apresentador, logo avisou: agora vamos ver como é baque se come um oiti. A partir dali tudo seria possível. E foi.
Com a chegada dos garotos a platéia transformou-se. De cândidos noveleiros, alguns não perderam tempo e passaram a responder com sofreguidão aos estímulos dos mancebos que sem nenhum pudor subiam nos encostos das poltronas e ofereciam seus membros para serem acariciados. Os mais corajosos logo substituíam as mãos pelos lábios e engoliam com sofreguidão os falos dos mascarados. Não demorou muito e já tinha gente da platéia tirando a roupa, colocando a máscara e subindo ao palco para ser devidamente penetrado. À medida que o apresentador estimulava novos adeptos a integrar a suruba que se instalou no sofá, os “boys” transavam sem pudor entre si e depois partiam para os que aderiam ao espetáculo. Alguns tinham dificuldades em manter a ereção, mas com algum esforço logo readquiriam o tônus perdido e tome b…. no c…, uma refestelação sem limites.
Depois de um certo tempo, contudo, o público começou a sumir da sala. Alguns visivelmente excitados com o que testemunharam, mas movidos por pudores, em vez de subir no palco iam aos pares para as cabines. Outros, talvez enfadados pela monotonia da performance dos “atores profissionais” e “amadores” tomaram o rumo do caixa para pagar a conta e ir embora. Foi o nosso caso. Também resolvemos partir. Não sabemos como o tal espetáculo chegou ao seu final. Segundo o apresentador, numa sexta-feira anterior nada menos que 14 voluntários participaram da suruba pública. Preferimos não checar se isto era verdade. Não somos santos, mas, sinceramente, existia algo de muito estranho naquilo tudo. Lembrei do filme Shortbus sobre um clube novaiorquino de sexo grupal e de uma matéria que recentemente li na revista Dom. Porém, ali no Cine Boa Vista, havia algo de perverso. Por trás das máscaras era possível captar os olhares dos participantes do surupembê e confesso não ter gostado do que pressenti. Não se trata de uma recaída moralista ou que, subitamente, eu tenha sido devassado por alguma reminiscência cristã. Posso estar enganado, mas todos os olhares dos que estavam no palco revelavam uma certa inquietação, um incômodo silencioso e por mais que o apresentador do show tentasse pontuar a cena com comentários libidinosos, no final ressoava uma enorme frustração no ar. Apenas um dos intérpretes do espetáculo parecia agir com naturalidade e demonstrava extrair prazer de sua atuação. Fiquei me perguntando o que ainda veremos por aí. Meu informante continua vagando pelas ruas do Recife. Será que ele encontrará algo ainda mais impressionante para me revelar? Vamos aguardar.
Site oficial: www.cineboavista.com
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