A DIVA EM FAMÍLIA
Rufus Wainwright traz mãe, irmã e cunhado para shows no Brasil e encanta com sua beleza e carisma
Por Mariana Mandelli, em São Paulo Foto: Caró
Rufus Wainwright | São Paulo
Via Funchal – 9 de maio de 2008
A família Wainwright é abençoada. Quem comprou ingresso para ver a apresentação de Rufus Wainwright no Via Funchal em São Paulo, na noite fria do dia 9 de maio, não esperava que o cantor trouxesse na bagagem Kate McGarrigle e Martha Wainwright, ambas cantoras e compositoras e mãe e irmã de Rufus, respectivamente. Brad Albetta, cunhado do cantor e marido de Martha também veio com o resto da trupe, trazendo seu contrabaixo para acompanhar as apresentações. O único membro ausente da família foi o patriarca, Loudon Wainwright.
Antes da atração principal da noite subir ao palco, a bem-humorada Martha fez um breve show de abertura em que impôs sua poderosa voz que mistura tons agudos, roucos e até mesmo infantis em canções como “When the Day Is Short” e “Factory”, de seu primeiro disco, Martha Wainwright (2005), e “Bleeding All Over You”, “Jesus & Mary” e “Tower Song” do novo I Know You’re Married But I’ve Got Feelings Too (2008).
Às dez horas da noite em ponto, o dono de uma das vozes mais bonitas da cena musical da atualidade tomou seu lugar ao piano. Rufus, pela primeira vez no Brasil, abriu o show com “Grey Gardens”, de Poses (2001), seu segundo disco e emendou com “This Love Affair”, de Want Two (2004). Sua voz, assustadoramente poderosa, soa ainda melhor ao vivo do que nos álbuns – fato evidenciado por sua interpretação de “Beauty Mark”, quando chamou sua mãe ao palco para acompanhá-lo.
Cantor apresentou duas músicas inéditas em shows do Brasil
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Com um violão em mãos, Rufus começou a entoar “Sanssouci” quando se perdeu e teve de começar de novo – ele culpou os telões, dizendo que não consegue se concentrar se ficar observando sua própria imagem. Extremamente carismático e descontraído, o cantor, entre uma piada e outra, mandou “Rebel Prince” e “California” de Poses, e “Not Ready to Love”, de Release the Stars (2007) – canção que, segundo ele, é a versão musical de Um Bonde Chamado Desejo (1951). Rufus diz ser a Stella do filme e fez a platéia interpretar Marlon Brando, gritando “Stella, I love you”.
“The Art Teacher”, a nova “Who Are You New York” (que deve estar no próximo disco), “Matinee Idol”, “Nobody’s Off The Hook” e uma belíssima versão de “In My Arms” com Martha e Brad Albetta fizeram as vezes para Kate McGarrigle sentar ao piano e surpreender com seu português tosco, mas dedicado, ao cantar uma versão de “Manhã de Carnaval”, de Luís Bonfá e Antonio Maria, do filme Orfeu Negro (1959), baseado na peça Orfeu da Conceição de Vinicius de Moraes.
Depois da homenagem ao Brasil, Rufus cantou “If Love Were All”, composição Noel Coward famosa na voz de Judy Garland. A faixa faz parte de seu último disco, Rufus Does Judy at Carnegie Hall (2007), um show-tributo à cantora. A lindíssima “Going To A Town” veio em seguida, precedendo “Little Sister”, esta dedicada a “todas as mulheres bonitas e não bonitas presentes”, já que, segundo Rufus, apesar de amar os gays (comunidade da qual ele faz parte e é um dos maiores ícones), são as garotas que mais apoiaram sua carreira nos últimos dez anos.
Fazendo piadas sobre sua beleza, “Garota de Ipanema” e a violência na América do Sul (“fico feliz de ver que vocês são reais e não estão matando uns aos outros”, brincou ao dizer que não se sabe muito sobre os latinos nos Estados Unidos), o showman cantou mais uma inédita, “Zebulon”, e encerrou com “Cigarettes And Chocolate Milk”. O público não arredou o pé e continuou aplaundindo, o que resultou na volta do cantor e em “Poses”, em uma versão belíssima de “Hallelujah”, clássico de Leonard Cohen, junto à Martha nos vocais e no cover de “Somewhere Over the Rainbow” com sua mãe no piano. Rufus se despediu novamente mas acabou voltando, alegando ser egocêntrico demais para desprezar os aplausos, e encerrou definitivamente com “Foolish Love”, um de seus primeiros sucessos.
Rufus na America do Sul: “fico feliz de ver que vocês são reais”. No palco, irmão e irmã, Rufus e Martha Wainwright
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Em uma apresentação praticamente acústica, chamada pela organização de “solo performance” – os únicos instrumentos usados eram violões, piano e o contrabaixo – e privado dos efeitos sonoros e orquestrações que fazem do estilo musical de Rufus quase uma ópera pop, o cantor pôde deixar à mostra seu maior dom: a voz de barítono. Apesar de não ter tocado nada do disco Want One (2003), um dos seus melhores trabalhos, e de alegar que não a platéia não ia ouvir a tão desejada interpretação do hit “One Man Guy”, Rufus fez uma apresentação impecável e extasiada, dando aos presentes o que eles mais queriam: uma amostra de sua impressionante voz e, de quebra, uma banho de simpatia e carisma.