Teatro do Parque, Recife (PE)
Com a exibição no Teatro do Parque do aclamado e esperado Sem Coração, de Nara Normande e Tião, a 14ª edição do Janela Internacional de Cinema do Recife deu ontem à noite seu pontapé inicial para sete dias de cinema para todos os gostos. Como nas edições passadas, a mostra traz um cardápio variadíssimo de 60 filmes composto tanto por obras inéditas no Recife, quanto curtas metragens oriundos de todo o planeta, clássicos revisitados e obras cults dedicadas, sobretudo, aos cinéfilos locais. O evento tem ainda como novidade esse ano, apresentações surpresas de drags queens e transformistas pernambucanas antes de algumas sessões. Ontem, foi a vez de Odilex e Sharlene Esse abrilhantarem a festa de abertura com suas famosas interpretações das cantoras Gal Costa e Maria Bethânia.
A sessão de abertura com o filme de Nara e Tião, não poderia ter sido mais apropriada. Sem Coração é uma coprodução Brasil, Itália e França e estreou no Brasil no início de outubro deste ano no 25º Festival do Rio na Première Brasil, onde conquistou o Prêmio Félix de Melhor Filme e o Prêmio Redentor de Melhor Fotografia. Em setembro, ele foi exibido na sessão Horizontes, no 80º Festival de Veneza, na Itália, único filme brasileiro da competição. O longa é uma versão ampliada do curta de mesmo nome, realizado em 2014, que conta a história dos últimos dias de Tamara, uma garota adolescente que cresceu em uma praia do litoral nordestino e está de partida para Brasília.
Sem Coração é um desse filmes que te pega pela forma cativante como a direção te coloca em contato com um mundo aparentemente simples e inocente onde crianças e adolescentes levam uma vida livre e solta, mas que, aos poucos, revela que, mesmo entre brincadeiras à beira-mar, a passagem para a vida adulta tanto é bela, quanto complexa e trágica.
Nara e Tião têm uma trajetória cinematográfica marcada pelo apuro estético e maturidade na construção da narrativa. E desta vez não foi diferente. Com diálogos muito bem elaborados e a incrível espontaneidade apresentada pelo elenco que, apesar de tão jovem, consegue desenvolver uma atuação convincente, eles articularam uma trama capaz de transitar entre a poesia e o real e, ao mesmo tempo, revelar que por trás da vida lúdica de meninas e meninos de diferentes classes sociais que, desprovidos de pré-julgamentos entre si, se unem para brincar, os desejos e conflitos em algum momento eclodem e marcam suas vidas.
O público presente no Parque, preponderantemente jovem, recebeu o filme de forma calorosa. Não é para menos. Além de um bom argumento, o enredo aborda questões atuais de forma sincera e delicada emolduradas em uma fotografia que aproveita a paisagem, extraindo dela não apenas o seu potencial exuberante e solar, mas também captando o lirismo e a alegria de corpos em convívio harmonioso com a natureza.
Na programação de hoje, um dos destaques é a sessão de Os Homens que eu Tive, de Tereza Trautman. Realizado em 1973, ele é considerado o primeiro filme ficcional do cinema moderno dirigido por uma mulher e que teve sua temporada de exibição interrompida pela ditadura militar. A sessão será às 19 horas, no Teatro do Parque e contará com a presença da diretora.
Outro filme interessante é O Auge do Humano 3, uma coprodução Portugal, Argentina, Brasil e Países Baixos, dirigido pelo realizador argentino Eduardo Williams, a ser mostrado no Cinema da Fundação no Derby às 19h30. Filmado em tecnologia 360º, em três países – Sri Lanka, Peru e Taiwan – ele mostra o cotidiano de diferentes grupos de amigos que, para se afastarem de suas atividades deprimentes, perambulam por um mundo chuvoso e escuro.
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