ENTRE O RISO E O CHORO
Mostra de curtas louvaram a singeleza dos sentimentos e fez rir com resgate do músico Di Melo e uma pequena aventura nerd
Por Alexandre Figueirôa
Editor da Revista O Grito!, no Recife
O quarto dia da mostra competitiva de curtas do XVI CinePE foi compartilhado por filmes que louvaram a singeleza dos sentimentos e o riso. As Folhas, do paraibano Deleon Souto; Di Melo, o Imorrível, de Alan Oliveira e Rubens Pássaro; e César!, de Gustavo Suzuki animaram a plateia do festival e se não fossem eles a ida ao Centro de Convenções na noite de ontem teria sido em vão, uma vez que o longa Boca, de Flavio Frederico teve a projeção suspensa devido a um erro técnico banal – troca de rolo – algo que poderia ter sido evitado se os organizadores agissem com mais profissionalismo. Fato lamentável que não pode ocorrer num evento com a pretensão de ser um dos maiores do seu gênero no país.
Leia Mais Cine PE
Aura de Jorge Mautner iluminou mostra de curtas
Festival lembra Cidade de Deus
Paraísos Artificiais encerra segunda noite
Filme Boca é cancelado por falha técnica
À Beira do Caminho cheio de fofura
Mas estamos aqui para comentar os curtas exibidos, cujo destaque foi sem dúvida o documentário Di Melo, o Imorrível. O filme conta a trajetória do cantor e compositor Di Melo, autor de um único disco gravado em 1975, depois desaparecido da cena musical. Quem está na casa dos 50 anos deve lembrar o sucesso da música “Klariô” integrante de um long-play curioso e original de gênero musical meio indefinido com canções que flertavam tanto com a soul music quanto com ritmos brasileiros. Hoje, Di Melo vive com a esposa e a filha num bairro da periferia de São Paulo e sobrevive da venda de quadros. Apesar do namoro com a fama no passado e o posterior ostracismo dos últimos 30 anos, o artista permanece uma figura carismática e bem humorada.
O filme embora tenha sido anunciado como sendo de São Paulo, na verdade é uma produção pernambucana rodada naquele estado, mas com recursos da Fundarpe. Os realizadores Alan Oliveira e Rubens Pássaro foram felizes na promoção do resgate do cantor, hoje considerado um precursor de várias experiências musicais que viriam a se tornar corriqueiras nas décadas seguintes. O disco de Di Melo é reverenciado como uma obra cult e finalmente tem o seu valor artístico reconhecido. Ao mesmo tempo, o curta revela as armadilhas da vida artística capazes de lançar ao limbo artistas talentosos cujas carreiras não decolaram. Felizmente Di Melo, mesmo amargando o seu esquecimento, é uma criatura lúcida cujo alto astral o tornam imorrível, como anuncia o título do curta.
Também quem arrancou boas gargalhadas do público foi o curta paulista César!, de César Suzuki. Nele encontramos três garotos nerds tramando um plano mirabolante de vingança contra um colega da escola, um playboy chamado César, cujo maior divertimento é maltratar os demais estudantes. Ao apresentar o filme, Suzuki ressaltou seu gosto pelo gênero cômico e o seu trabalho demonstrou alguém talhado para enveredar com tranquilidade por este caminho. Apesar do filme não trazer inovações para este tipo de narrativa e parecer uma grande brincadeira, Suzuki revelou ter bom timing para a construção dos diálogos, saiu-se bem na direção dos atores e encontrou o ritmo adequado para sua trama.
Já o paraibano As Folhas foi o mais fraco dos três filmes exibidos. O curta de Deleon Souto tem uma temática singela – um garoto relembra a mãe morta a partir das folhas de uma árvore plantada por ela antes de morrer – contudo, não traz nada de novo para este tipo de história. Longos planos silenciosos com o menino em transe diante da árvore no quintal de sua casa, uma música melosa para acompanhar as cenas e um desfecho que não surpreende ninguém dão a sensação de algo já visto milhões de vezes no cinema e na televisão. Tecnicamente, o filme apresenta algumas falhas na montagem e os enquadramentos são pouco criativos não conseguindo estabelecer o clima de mistério e encantamento proposto. Mas como o cinema paraibano tem revelado talentos indiscutíveis, esperamos que Deleon aprimore sua formação e no futuro nos traga filmes mais originais.