Por Paulo Floro
Da Revista O Grito!, no Recife
A mostra competitiva do Cine PE chegou ao fim nesta terça (1º), com uma visão inusitada sobre anônimos brasileiros e latinoamericanos que vivem à margem do sistema capitalista e não tem destino certo. Estradeiros, dos diretores pernambucanos Sérgio Oliveira e Renata Pinheiro elevou a qualidade da competição e trouxe uma proposta mais artística em uma edição marcada por produções mais comerciais. A noite ainda teve outro representante do Estado, Na Quadrada das Águas Perdidas, de Wagner Miranda e Marcos Carvalho, estrelado por Matheus Nachtergaele.
Leia Mais: Cine PE
Festival abre a porta do armário, mas deixa diversidade sexual na prateleira
Corda Bamba é singelo e fofo, mas carece de ambições artísticas
Aura de Jorge Mautner iluminou mostra de curtas
Festival lembra Cidade de Deus
Paraísos Artificiais encerra segunda noite
Filme Boca é cancelado por falha técnica
À Beira do Caminho cheio de fofura
Filmes divertidos foram destaque no domingo
Do NE10
Corda Bamba é bastante aplaudido nesta segunda
Estradeiros acompanha pessoas que podem ser consideradas “neo-hippies” numa definição torta, mas próxima da ideologia vivida por eles. Sem rumo, eles transitam por países da América Latina atuando como artistas de rua e vendendo bijuterias como ambulantes. O longa não quer fazer um documento desse estilo de vida, nem contextualizar a situação deles na sociedade contemporânea hoje, mas sim abrir uma janela sobre um mundo que parece desconhecido por muita gente, mesmo estando tão próximo.
A câmera vive à espreita, busca ângulos inusitados, pega a estrada, por vezes registra de longe momentos íntimos, dá closes no rosto. Tudo para criar uma sensação de proximidade com o espectador. Há ainda algumas metáforas, como o enquadramento invertido, que parece querer se ajustar, como o próprio mundo sempre em movimento desses que pegam a estrada como seu entendimento de liberdade. O filme foi gravado na Argentina, Bolívia, Peru e Brasil. Aqui no País, foram para Recife, Olinda, cidades da Paraíba, Rio de Janeiro, entre outros.
As entrevistas trazem à tona diversos aspectos do cotidiano, como o preconceito com americanos de países pobres da América do Sul, a criação dos filhos na estrada, a fabricação das pulseiras e colares que vendem, mas também temas como natureza, liberdade. O público começou a sair do filme antes do final da sessão, talvez pelo adiantado da hora ou por falta de empatia com a proposta do documentário. Antes, foi exibido o longa Na Quadrada das Águas Perdidas, de Wagner Miranda e Marcos Carvalho.
O filme também tem um conceito corajoso ao fazer um monólogo com Matheus Nachtergaele totalmente sem diálogos. Desde o início acompanhamos a travessia do personagem pelo sertão, junto com um cachorro e duas cabras, que estão sendo levadas a um destino ainda desconhecido pelo espectador. É uma viagem atemporal, que tem com objetivo mostrar detalhes da vida do sertanejo que teima em manter-se inalterada, como a relação com a natureza inóspita da região.
O longa rende-se à tentação de enquadrar o que há de mais bonito no Sertão, com destaque para os animais encontrados no caminho, o céu, e até mesmo os casebres de barro. A fotografia pinta uma estética de ensaio de moda de encher os olhos. Com o carisma de Matheus, Na Quadrada… ficou imune à monotonia, mesmo optando por caminhos óbvios para compor sua pequena odisséia sertaneja.