Censurado pela ditadura, clássico “Onda Nova” retorna restaurado na Mostra de Cinema de SP

Filme produzido na Boca do Lixo foi censurado pelo regime militar e retorna restaurado à Mostra Internacional de Cinema de São Paulo após 40 anos

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Foto: Divulgação.

O longa-metragem Onda Nova, dirigido por Ícaro Martins e José Antonio Garcia, será exibido em cópia restaurada na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que ocorre entre os dias 17 e 30 de outubro de 2024. Produzido na famosa região da Boca do Lixo, o filme teve sua primeira exibição na 7ª edição do mesmo evento em 1983, antes de ser censurado pelo regime militar. A censura prejudicou sua carreira comercial, atrasando o lançamento por quase um ano.

A trama, protagonizada por Carla Camurati e Cristina Mutarelli, acompanha as jogadoras do Gayvotas Futebol Clube, um time feminino de futebol, no ano em que a modalidade foi regulamentada no Brasil, após um banimento de 40 anos, encerrado em 1979. O filme explora questões de gênero e sexualidade, apresentando jogadoras que desafiam a moral vigente da época, enquanto enfrentam conflitos pessoais e familiares. O elenco inclui ainda participações dos jogadores Casagrande, Wladimir e Pitta, da Democracia Corintiana, além de artistas como Caetano Veloso, Regina Casé e o locutor Osmar Santos.

Embora não seja considerado uma “pornochanchada” tradicional, Onda Nova foi produzido de maneira similar às obras do gênero, muito comuns na Boca do Lixo. O lançamento tardio do filme, já no fim desse ciclo, fez com que ele fosse considerado o último dessa vertente cinematográfica. No entanto, a obra de Martins e Garcia se destaca por rejeitar o moralismo sexista dessas produções, abordando o desejo como uma forma de afirmação de identidade.

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“O filme é uma ode ao desejo, que assume o protagonismo e conduz as personagens e a narrativa. Mesmo sem tratar diretamente de política, ao colocar o desejo como afirmação de identidade, Onda Nova se torna uma negação da ditadura vigente na época”, afirmou Ícaro Martins. Segundo o diretor, foi essa abordagem que levou à proibição integral da obra pela censura militar, sendo classificada como “amoral”.

O processo de restauração do filme foi liderado por Julia Duarte, sobrinha de José Antonio Garcia, após a seleção da obra para a seção Histoire(s) du Cinéma do 77º Festival de Cinema de Locarno. A restauração envolveu a digitalização dos negativos originais e a recriação de materiais perdidos, como o trailer e o cartaz, em parceria com a Cinemateca Brasileira e outras instituições. A nova identidade visual foi desenvolvida por Helena Garcia, filha do co-diretor, e o trailer ficou a cargo de Marina Kosa, da Tanto Produções.

Em entrevista concedida em 1984 ao fundador da Mostra, Leon Cakoff, José Antonio Garcia previu que o filme só seria compreendido plenamente dez anos depois. “Talvez tenha demorado um pouco mais, mas ele tinha razão”, concluiu Martins.

Confira o trailer: