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Halle Bailey interpreta Ariel no novo filme. (Foto: Divulgação/Walt Disney Pictures).

A Pequena Sereia é uma modernização cativante que honra a essência da clássica animação

O longa de Rob Marshall tem como maior destaque a presença carismática de Halle Bailey, mas o filme sofre com vilã canhestra e personagens animados sem muito charme

A Pequena Sereia é uma modernização cativante que honra a essência da clássica animação
3.5

A Pequena Sereia
Rob Marshall
EUA, 2023, 2h15, Livre. Distribuição: Walt Disney Pictures
Com Halle Bailey, Jonah Hauer-King e Melissa McCarthy
A partir de 25 de maio nos cinemas

Lançado originalmente em 1989, o desenho A Pequena Sereia foi responsável por revitalizar as animações da Disney e inaugurar uma Era de Renascimento para o estúdio, que atravessava um longo período de sucessivos fracassos. Para quem foi criança, pelo menos até o final dos anos 2000, é quase impossível ter passado incólume aos encantos da adaptação infantil do conto de Hans Christian Andersen, com seus personagens carismáticos, uma vilã icônica e canções que permanecem célebres até hoje.

Tudo isso, por si só, já nos dá uma noção da responsabilidade que carrega a ideia de lançar uma releitura moderna em live-action desse clássico para as telas – iniciativa encarada com entusiasmo por uns e com desconfiança por outros. Mas, felizmente, o longa dirigido por Rob Marshall faz valer as expectativas positivas. É que, ainda que não se apresente um divisor de águas para a Disney como foi o original, o remake de A Pequena Sereia chega para trazer algum frescor e longevidade a uma história que, agora, mais de 30 anos depois, soa ultrapassada e obsoleta.

Em suma, o enredo permanece o mesmo. A filha mais nova do Rei Tritão (Javier Bardem), Ariel (Halle Bailey), é uma adolescente fascinada pelo mundo da superfície e, por isso mesmo, acaba se apaixonando pelo humano Príncipe Eric (Jonah Hauer-King). Decidida a abandonar a vida submarina, a sereia recorre à bruxa do mar, Úrsula (Melissa McCarthy), que lhe oferece ajuda, mas impõe algumas condições: para conseguir as tão sonhadas pernas por três dias, Ariel deve abrir mão da sua voz e, caso não consiga o beijo de amor verdadeiro nesse meio tempo, ficará aprisionada à vilã pela eternidade.

A Pequena Sereia.
Melissa McCarthy vive a emblemática vilã Úrsula. (Foto: Divulgação/Walt Disney Pictures).

Porém, nesta versão de 2023, o que vemos é uma Ariel mais independente e inquieta. Enquanto na animação do século passado a busca pelo amor do príncipe é o que a guia cegamente, na readaptação as motivações da sereia aspirante à humana passam a fazer mais sentido: a grande mola propulsora é, enfim, o seu desejo de explorar novos mundos e horizontes. Portanto, não cabe a ela ser somente uma mocinha apaixonada e a protagonista também assume o papel de heroína de si e de todos.

Com cerca de 40 minutos a mais que o desenho dos anos 1980, o live-action renova os ares da trama com adições e reajustes que aprofundam os laços entre os personagens, percorrem novos ambientes e reparam diálogos e representações controversas e problemáticas da produção original. Seguindo esse compasso, a trilha sonora também chega com algumas mudanças, que variam desde leves alterações nas letras de canções clássicas até a inserção de músicas completamente inéditas. E, embora todo o trabalho seja assinado pelo talentoso Lin-Manuel Miranda, é difícil fugir do estranhamento inicial causado pela discrepância em relação às músicas originais.

Contudo, a nova trilha permite que Halle Bailey tenha um espaço maior para demonstrar sua habilidade vocal em comparação com a versão animada, na qual a personagem tinha uma única música. E, certamente, o conjunto da obra não seria o mesmo sem a presença magnética da atriz, que impressiona não apenas com sua voz, mas também com seu carisma em cena. É encantador testemunhar como ela dá vida à Ariel.

Mas o mesmo não podemos dizer da icônica vilã Úrsula. Embora Melissa McCarthy divirta, na maioria do tempo sua interpretação soa dissonante do quadro geral, com uma atuação que flerta com o teatral.

Já em relação aos personagens em CGI, o destaque absoluto recai sobre o caranguejo Sebastião, dublado pelo ator e rapper Daveed Diggs, que está ainda mais carismático e engraçado que sua versão animada, bem como sobre a gaivota Sabidão, que na voz de Awkwafina ganha seu próprio número musical com a divertida e inédita “The Scuttlebutt”. Mas o mérito desses dois personagens não se deve à forma como estão caracterizados na computação gráfica. Na verdade, ambos brilham apesar do CGI e todo o crédito vai para as interpretações de Diggs e Awkwafina.

Mais uma vez, a insistência da Disney em obedecer rigorosamente a lógica do mundo real em seus live-actions prova ser um equívoco. Exemplo mais forte disso é Linguado, dublado pelo ator mirim Jacob Tremblay. O adorável peixinho e melhor amigo de Ariel perde toda sua expressividade e presença na tela, passando despercebido em grande parte das cenas. Em um mar onde ele é só mais um peixe como qualquer outro, fica difícil imprimir algum charme como na animação.

Sem correr grandes riscos, a nova versão de A Pequena Sereia reempacota o clássico com algumas adaptações ao arco narrativo que honram a memória afetiva do público mais antigo, preservando toda a magia e essência do original, ao mesmo tempo em que cativa as novas gerações. Embora represente nada mais do que uma tentativa da Walt Disney de modernizar e lucrar com os antigos clássicos, A Pequena Sereia pode ser considerada a melhor investida do estúdio nesse sentido e pode servir como um guia para futuras adaptações já anunciadas pela empresa.

Ouça a trilha sonora original de A Pequena Sereia (2023), em inglês.

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