O JEITO BIDÊ OU BALDE DE SER
Por Lidiana de Moraes
Da Revista O Grito!, em Porto Alegre
A Bidê ou Balde é daquelas bandas que quando começam a tocar, se você conhece pelo menos um pouquinho sabe que é eles. Não se trata de ser caricato, mas de ter estilo e personalidade. A sonoridade alegre, quase uma mistura de Blitz e Beach Boys dos pampas, conquistou o público que pode relembrar graças a eles que o rock ‘n’ roll brasileiro também é pura diversão.
O nome do EP novo, que serve como aquecimento antes do próximo disco, deixa bem claro o espírito da música desses gaúchos para quem não parece haver tempo ruim: Adeus Segunda Feira Triste. Entre “bahs”, “tus” e “tris”, o vocalista do grupo, Carlinhos Carneiro concedeu entrevista relembrando os mais de 10 anos de estrada, mudanças na formação, problemas com censura e sucessos, além de finalmente colocar um fim, ou quase, para o mistério: afinal de onde veio o nome Bidê ou Balde?
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Crítica do EP Adeus Segunda-Feira Triste
O nome da banda sempre gerou curiosidade. Toda vez que alguém pergunta de onde vocês saíram com Bidê ou Balde, vocês criavam uma história melhor que a outra. Mas qual foi a teoria mais mirabolante que já ouviram sobre o nome?
Nossa… impossível lembrar de todas! Lembro de, em algumas das vezes termos ficado surpresos e comentado na hora mesmo que aquela tinha sido uma boa resposta, que deveriamos lembrar e tal. Mas, claro, esquecemos em segundos. Tem uma, que não é das mais mirabolantes, mas me marca por, anos depois, alguém vir puxar papo como se tivesse acreditado muito: bem no comecinho da banda dissemos que o nome da banda havia sido sugestão do Luís Fernando Veríssimo (assim como dizíamos que havia sido sugestão do Otto Guerra, do Carlos Gerbase, do João Ubaldo Ribeiro, ou até do Frank Black e do Beck – eles, no caso, teriam sugerido ‘Bidet or Bucket’). Ano passado, talvez mais de dez anos depois, um cara, um senhor mais velho, bacanão e despojado, veio falar comigo tri sério, “Pô, e o nome da banda foi sugestão do Veríssimo, né?! Que honra!”, eu não me segurei e tive que desmentir, disse “cada vez a gente inventa uma desculpa diferente, a verdade não é tão legal quanto várias mentiras…” e ele me olhou com uma cara bem decepcionada!
E qual a nova versão de vocês para o nome Bidê ou Balde?
Temos dito a verdade, quase sempre, hoje em dia. Íamos chamar a banda de ‘Utensílios Domésticos’, um dos guris não tava curtindo ou entendendo, e o nosso batera da época, o Sandro, disse “Utensílios Domésticos… Como Bidê, ou Balde”, e o cara respondeu “Bidê ou Balde é bem melhor” e ficou.
O disco É preciso dar vazão aos sentimentos foi vendido nas bancas. Por que vocês escolheram essa forma para lançá-lo, assim como a outra versão disponível para venda nos shows?
A primeira versão do disco (a prateada, que vendemos nos shows) foi com um selo que não se agilizou na distribuição, e logo em seguida ao lançamento recebemos o convite de participar do Acústico MTV Bandas Gaúchas e tivemos que interromper a divulgação e os shows para ensaiar, gravar, e depois divulgar o Acústico. Quando fomos retomar o “Vazão” a nossa relação com o selo que o havia lançado tinha acabado e pintou a oportunidade de lançar pela revista Outracoisa, que era capitaneada pelo Lobão. Aproveitamos a oportunidade para relançá-lo (com os remixes e arte branca) e isso acabou sendo ótimo, deu um novo gás à coisa e fez o nosso som chegar num monte de lugar onde nunca tínhamos ido!
E por que ficaram tanto tempo sem lançar disco?
Principalmente em função desse lance entre o ‘Vazão’ e o ‘Acústico’. O relançamento do ‘Vazão’ só rolou em 2006, e a partir daí saímos fazendo um monte de shows. Só fomos parar pra ensaiar material novo no final de 2007 (e daí rolaram duas negociações mal sucedidas com gravadoras, uma em 2008 e outra em 2009) e em 2010 resolvemos lançar algo de qualquer forma e finalizamos o material do EP por nós mesmos e o lançamos no começo desse ano. Mas fomos surpreendidos positivamente: a idéia era finalizarmos e lançarmos o disco ainda esse ano, mas pintaram tantos shows com o EP, que ficou difícil dividir-se em ensaios pra show e gravação, e a finalização do disco acabou sendo mais lenta. Acho que só vamos conseguir lançá-lo no começo do ano que vem, mas antes pretendemos lançar mais um single ou algo do gênero! Coisas da independência, né?!
Vocês lançaram o Adeus, segunda-feira triste como aperitivo para o disco novo. Essas músicas podem ser vistas como uma prévia do CD?
Sim. Na verdade o processo pelo qual chegamos ao material do EP nos inspirou a gravar o disco de um jeito maluco, gravando tudo separado, estrofe, refrão, um de cada vez e em climas bem diferentes que vão se juntando aos poucos no processo de finalização do disco.
Como vocês criam as letras das músicas? “Não Existe Lugar Mais Longe Que o Japão” é uma das letras mais legais que ouvi nos últimos tempos.
Valeu! “Japão” é uma coisa louca. Tínhamos o refrão, e ela poderia ir para o lado romântico, do amor à distância, mas esse tema me parecia batido e resolvi ir para um lado diferente, comecei a pirar em diplomacia, primeiro ministro, essas coisas, esse universo quase que tão secreto e mítico (ao menos pra mim) quanto a Maçonaria. E deu no que deu! Gosto muito dessa letra também. Mas não temos regras nas letras. Pelo contrário, quanto mais a coisa for para um lado que surpreenda a nós mesmos, melhor! Até ser careta, “normal”, e escrever algo simplesmente bonito, pode nos ser atraente.
No disco novo, ao contrário dos anteriores, tem várias letras que não são minhas ou são parcerias. O Pilla, nosso guitarrista, fez músicas excelentes, inteiras ou com umas ajudadas minhas nas letras, e o Frank Jorge ajudou a colocar letra numas bases instrumentais que tínhamos. Mas acho que as pessoas podem nem notar isso, pois todas as músicas e letras mantiveram uma “coisa bidê”, com certeza!
De que forma a mudança de integrantes interferiu na sonoridade da banda?
Na sonoridade rola mudanças, mas nem tanto. Sei lá, isso é complexo! Uma das coisas legais do disco novo são os baixos e baterias, do Pedro Porto e do Marcos Rübenich, que com certeza adicionaram novidades. Mas o jeito de fazer música, de como soar, por mais que se tente fazer diferente ou que se tenham elementos diferentes, tem um “jeito bidê” que eu, o Sá, o Pilla e a Vivi dominamos, conhecemos, e costumamos passar para quem está conosco. Claro que é importante a contribuição de cada um que passa pela banda para a formação desse ‘jeito bidê’. Como eu disse, a coisa é complexa!
As pessoas adoram falar sobre o “rock gaúcho”. No entanto, a Bidê ou Balde, mesmo soando aqui do sul, está meio distante desse rótulo, não achas? Vocês se consideram um grupo de rock ou pop?
Tu que tá dizendo! Há quem diga que somos perfeitos exemplares dessa coisa que chamam de “Rock Gaúcho”. Mas eu acho que o legal do som feito aqui no sul é justamente a variação de estilos e idéias que rolam – o que desabona por completo o rótulo, por pura falta de unidade estética, exceto fora do estado, em Brasília, Curitiba ou Recife, onde há bandas que, de fato, inspiradas pelas bandas daqui, produzem algo que eu realmente poderia chamar de “Rock Gaúcho”.
Somos uma banda de rock. Fazemos isso de uma forma pop, gostamos da estética pop e vemos viabilidade pop até em coisas estranhas ou nada pop que nos influenciam, assim como fizeram os artistas da pop art ou os Beatles. Mas existe uma diferença entre a forma que nós entendemos o pop. Não é da maneira Luan Santana e coisa e tal, não é da maneira histérica das FMs e programas jovens de tv, justamente porque olhamos o pop através dos olhos de quem gosta de coisas muito alternativas, gostamos da idéia de fazer pop com essas influências, nos divertimos com isso, e isso é uma postura rock. E como há brechas nas FMs e nos programas jovens de tv para ideias como essa nossa, e muita gente que se identifica com isso, a gente corre atrás destes espaços!
O que vocês têm ouvido de música atualmente?
Cada um ouve um monte de coisa diferente. De atual, acho que MGMT e Broken Bells são coisas que nos unem, e todo mundo curte! Eu curto muito rap, coisas brasileiras como A Cor do Som, e Sonic Youth ou Dinosaur Jr, que nem todos curtem. Todos têm suas idiossincrasias no que se refere a sons que curtimos. Mas alguns clássicos como Beatles, Beach Boys, Kinks, Sonics, T.Rex, Bowie, Sex Pistols, acho que todos nós gostamos!
Se vocês pudessem definir por que alguém deve conhecer o som da Bidê, como o fariam?
Mostraríamos o monte de coisa ruim que tem por aí e diríamos, “confia na gente – somos legais!”.
Além do lançamento do disco, quais são os planos futuros da banda?
Acho que inevitavelmente logo em seguida ao disco lançaremos um DVD. Existem várias idéias sobre como ele seria, mas primeiro vamos finalizar o disco para depois pensar nisso. Uma coisa por vez. Temos também muito material inédito, além do que gravamos para o disco e o EP, de alguma forma vamos querer desovar tudo isso!
Vocês já tiveram a oportunidade de tocar com gente como Marcelo Nova e o Roger do Ultraje. Se pudessem escolher novas parcerias, com quem fariam? E qual é o artista que seria um sonho trabalhar junto?
Fabio Jr ou Erasmo Carlos! Qualquer um dos dois, ou os dois, seria o maior sonho! Entre os amigos-ídolos, eu gostaria de fazer também algo com o Gabriel Thomaz, dos Autoramas, e com o batera Clayton Martin, dos Detetives e do Cidadão Instigado. Uma junção Bidê + Nação Zumbi seria demais também – sou muito fã deles!
A música “E Por Que Não” foi retirada do acústico da MTV em função de processos promovidos por ONGs de proteção a mulher e a criança. Como vocês lidaram com essa situação? Encararam com alguma espécie de censura?
É uma censura. A gente não pode tocar mais ela ao vivo. Ela simplesmente deixou de existir para a gente. Isso é muito chato, o público SEMPRE pede MUITO ela. Mas acatamos isso para não prejudicar a banda e o resto do repertório.
No começo da carreira vocês chegaram a tocar em formaturas. Ainda rola de tocar nesses tipos de eventos?
Claro! Ano passado tocamos num aniversário de 15 anos que foi demais! Foi inclusive a primeira execução ao vivo de “Me Deixa Desafinar”, que ganhou um vídeo muito legal [Veja abaixo].
Vocês são conhecidos por fazerem shows espetaculares, com muita animação. Como estão os planos de turnê pelo Brasil? E qual o show que ficou marcado na memória de vocês?
Estamos em plena turnê e a coisa só tende a crescer e melhorar conforme os materiais novos forem sendo lançados. Nossa agenda tá cheiaça, e todos os shows estão muito legais! Fizemos recentemente SP, Rio, Goiânia, Brasília, Curitiba. Em novembro tem Belém do Pará (que nunca fomos antes), e tem muito mais pintando!
Bah, vários shows ficaram marcados, por razões diversas. Teve um Porão do Rock que fizemos, em Brasília, pra umas 80 mil pessoas, um show no Realengo, no Rio, pra uma multidão enlouquecida, um no ginásio do Canindé em São Paulo, todos os festivais que participamos em Goiânia. Mas pra mim, um show em Porto Alegre foi muito especial, na Rua da Praia, lotada, inacreditável, bem na época que estávamos lançando o nosso primeiro disco! Na real, todos os shows que fizemos ao ar livre em Porto Alegre são muito especiais!
* Lidiana de Moraes é jornalista e dona do blog Receituário Pop.