Foto de capa: Carlos Salles/Divulgação.
“É tanto dogma, tanta igreja, o mundo é tão medieval, um lugar de trevas mesmo. Então é impossível não se revoltar, não querer gritar contra”, bradou o cantor Johnny Hooker, ao comentar sobre a “caretice” de muitos setores da sociedade brasileira. O artista realiza uma turnê em homenagem a Marília Mendonça (1995 – 2021). Com repertório de canções da cantora, o show Clube da Sofrência chega ao Recife neste sábado (20), no Armazém 14.
Além de clássicos da “rainha da sofrência”, o artista pernambucano sobe ao palco com sucessos da própria carreira. A proposta é homenagear a obra da cantora, que morreu precocemente em um trágico acidente aéreo, em novembro de 2021.
A ideia inusitada de fazer um show que unisse os repertórios surgiu da vontade de homenagear a vida e a obra da cantora pelo que era conhecida de melhor; “a sofrência”, o famoso subgênero do cancioneiro romântico brasileiro. “Ela até chegou a gravar um vídeo cantando uma música minha, o que já era um indício de que nossas obras conversavam muito entre si”, revela o cantor.
Em meio ao lançamento do seu álbum mais recente, Orgia, Hooker desabafou sobre a indústria musical. “No Brasil o agronegócio engoliu a indústria musical. Você entra no TOP 50 e mais de 80% é agro. Então as barreiras são meio intransponíveis”, observou.
O cantor que ficou conhecido nacionalmente com o sucesso de seu primeiro álbum solo Eu Vou Fazer Uma Macumba pra te Amarrar, Maldito! também já é um velho conhecido do gênero, com sucessos como “Amor Marginal” e “Alma Sebosa”. Esta última tendo até chegado a ganhar uma versão improvisada da própria Marília em seus stories no Instagram em setembro de 2018 após os artistas se conhecerem numa premiação.
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O show que pretende ser uma grande celebração dos “corações partidos” conta ainda com hits surpresa e promete um retorno às raízes românticas do artista, já que continuam no setlist grandes sucessos autorais.
A noite vai contar ainda com a discotecagem de Allana Marques, DJ residente de algumas das festas favoritas do recifense, como a Odara Ôdesce, o Brega Naite e a Maledita.
Em entrevista exclusiva à Revista O Grito!, Johnny Hooker reflete sobre sua arte, sua identificação com o Recife e sobre os desafios de produzir música no Brasil. Confira:
De onde surgiu a ideia de realizar uma apresentação em homenagem à cantora Marília Mendonça?
Já queríamos há algum tempo fazer um show tributo e pensamos em alguns nomes, até que surgiu o de Marília e me pareceu perfeito, pois somos contemporâneos. A conheci e pudemos trocar admiração pelos nossos trabalhos. Ela até chegou a gravar um vídeo cantando uma música minha, o que já era um indício de que nossas obras conversavam muito entre si.
O que Johnny Hooker destacaria ter de Marília Mendonça?
Acho que os dois bebem muito da fonte da música popular, a música da mesa de bar, de dor de cotovelo, fazendo isso de uma maneira muito acessível, com refrões pra cantar junto.
Você mistura ritmos bem populares como o brega, o axé, forró e o frevo com um pop bem contemporâneo. Pode contar um pouco desse seu processo de criação?
Acho que essa mistura é o próprio Brasil. A música popular brasileira já é diversa assim por definição. E essa diversidade é uma das coisas mais valiosas que a gente tem nesse país. Então sai de uma maneira muito natural quando vou puxar do meu arcabouço de referências. Ter crescido em Recife também ajuda.
Johnny, você é aqui do Recife, região extremamente rica culturalmente falando. Apesar disso, os artistas sofrem com muita dificuldade para viabilizar seus projetos e se manter na profissão. Qual sua opinião a respeito?
No Brasil o agronegócio engoliu a indústria musical. Você entra no TOP 50 e mais de 80% é agro. Então as barreiras são meio intransponíveis. Suponho que a única alternativa é seguir em frente e esquecer de sonhos de maior projeção ou alcance. Quem sabe um dia…
O governo anterior destruiu ou menosprezou o setor artístico. O atual governo já demonstra uma postura bem diferente em relação ao tema. Qual sua perspectiva para o governo Lula?
Admiro muito a seriedade e comprometimento das pessoas que estão à frente da pasta da cultura no governo federal. São pessoas com ideias muito boas. Mas acho que é impossível reverter a tomada do agro na música. Seria preciso muita regulação e creio que o dinheiro jamais deixaria isso acontecer. Enquanto não houver um projeto a longo prazo, de soft power, do Brasil como potência cultural mundial, vamos continuar com migalhas de projeção.
Sua música tem um tom libertário muito forte, inspirador. E trabalha questões de gênero e sexualidade que soam provocadores no Brasil cada vez mais conservador de hoje. O que te inspira?
Acho que eu sempre fui um libertário por natureza mesmo. É tanto dogma, tanta igreja, o mundo é tão medieval, um lugar de trevas mesmo. Então é impossível não se revoltar, não querer gritar contra. É uma batalha perdida que a gente luta até o fim por convicção. Vai que a gente planta alguma semente de ideia, de pensamento, de comportamento na cabeça das pessoas e isso tem algum desdobramento no futuro.
O que os fãs podem esperar para essa apresentação no próximo dia 20? O que pode adiantar desse show?
O show tem sido um sucesso de público, as pessoas ficam muito emocionadas com a homenagem e também pela maneira como o roteiro costura minha obra e a dela passando por outros grandes clássicos da “dor de cotovelo”. No Recife a gente vai fazer alguns clássicos do nosso brega também.
Serviço: Johnny Hooker em “Clube da Sofrência – Uma Homenagem a Marília Mendonça”
20 de maio, às 21h
No Armazém 14 (Av. Alfredo Lisboa, s/n, no Bairro do Recife)
Ingressos: R$ 60 (meia-entrada) e R$ 70 + 1kg de alimento não perecível (social), à venda no site Sympla
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