Emma Watson estrela techno-thriller que satiriza Redes Sociais e Cultura Fã

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A universitária Mae Holland (Emma Watson) passa por dificuldades. Seu pai tem esclerose múltipla, ela trabalha com telemarketing numa empresa sem grandes perspectivas, a família é simples e dispõe de poucos recursos para o tratamento. Quando ela menos espera, sua grande amiga Annie (a atriz escocesa Karen Gillan, de Doctor Who) liga para ela dizendo que acaba de indicá-la para um emprego em uma grande empresa internacional. Mae mal pode acreditar, segue para fazer a entrevista, e é aprovada. É assim que ela passa a trabalhar naquela que é considerada a mais poderosa empresa de tecnologia do momento, conhecida por criar um programa chamado You True (Você de verdade).

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O empenho de Mae (Watson) atrai a atenção do chefe Bailey (Hanks).

O filme é baseado no livro O Círculo (The Circle), da autoria de Dave Eggers, que assina o roteiro. A analogia com o You Tube e o mundo Google é inevitável. Aparentemente o longa tem todas as características de uma distopia, mas na verdade, na medida em que a trama avança, percebemos que estamos mais próximos de uma narrativa criminal do que de um filme futurista. Toda a tecnologia exposta no filme está presente em nosso cotidiano, e nada tem de extraordinária, embora seja colocada na tela como se fosse extremamente avançada. E dessa ambiguidade resulta nossa sensação de familiaridade e de desconforto, de estranhamento. O dono da empresa, Bailey (Tom Hanks) lembra em sua composição Steve Jobs. O Grande Irmão (Big Brother) é o mundo das redes. Entretanto, agora ele é real, é o retrato da nossa contemporaneidade, colocada numa situação limite, e suas câmeras não deixam espaço para privacidade num ambiente profissional em que ficar sozinho é uma afronta.
Mae-Watson, a nossa eterna Hermione de Harry Potter, com seu jeitinho politicamente correto, não passa desapercebida por seus novos patrões, e Bailey decide explorar seu potencial de forma desumana e cruel, convertendo sua vida em peça publicitária da empresa. Enquanto vê sua amiga Annie entrar em crise, e seu melhor amigo Mercer, ironicamente interpretado por Ellar Coltrane, o garoto de Boyhood (2014), ser perseguido por haters, Mae vai descobrindo aspectos nada encantadores da grande empresa que mais se assemelha a uma organização criminosa. Nesse processo de revelações, ela tem como eventual aliado o gênio virtual Ty (John Boyega), o criador do You True, que na verdade foi colocado no limbo pela empresa por discordar do encaminhamento dado aos negócios e à ganância de seus proprietários. Boyega, o Fynn de Star Wars –  O Despertar da Força (2015), é subaproveitado no roteiro, que demora a entregar a sua verdadeira identidade.

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O amigo Ty, o gênio da rede que vê na expansão de The Circle uma ameaça à humanidade.

A organização foi fundada por Eamon Bailey (Tom Hanks) e o seu principal produto é o SeeChange, uma pequena câmera que permite aos usuários compartilharem detalhes de suas vidas com o mundo. Bailey propõe a Mae que transforme a sua vida em produto da empresa, e assim ela vê sua liberdade desaparecer da noite para o dia. Transformada em personagem de sua própria existência, sua nova função vai afetar profundamente suas relações afetivas e familiares. Até mesmo seus pais se transformam em parte desse show da vida em que ela não pode mais dormir sem uma câmera, convencida de que seu emprego pode ajudá-los.
O desenvolvimento é interessante, já o desfecho é ambíguo. Não é detectável até que ponto Ty e Mae possuem de fato uma visão crítica da empresa enquanto modelo social, ou se na verdade julgam Bailey um criminoso fascista com veleidades de ditador. Em outras palavras, o sistema não é de todo mal, basta mudar as pessoas que estão na direção. A crítica à sociedade da informação não se aprofunda, pois certamente teria de pisar mais fundo.Problema que já se encontrava de certa forma no livro, classificado como romance “distópico” ao ser lançado em 2013.
O Círculo lembra bastante os episódios de Black Mirror, sobretudo Nosedive (2016), o primeiro episódio da terceira temporada, em que as pessoas se vêm num futuro em que a sociedade trocou a unidade monetária por likes. A interação social e a aceitabilidade funcionam como um mecanismo de rating para frequentar festas, viajar, adquirir bens de consumo, para ser atendido numa agência ou mesmo pegar um avião. Para comprar um carro é necessário ter uma pontuação de likes acima de 4,2 (o máximo é 5 estrelas) e uma desaprovação virtual pode acabar com a carreira e a mobilidade de um cidadão. No episódio televisivo, Lacie Pound (Bryce Dallas Howard) está a caminho do casamento de uma amiga, Naomi (Lacie Eve), mas acaba perdendo a pontuação necessária para participar do evento.
Apesar de traçar um paralelo, criticando a sociedade das redes, o tom de comédia negra de Nosedive está bem distante da caracterização dramática que se coloca em O Círculo, nome da empresa que sonha em instalar câmeras por todo o planeta e administrar até as eleições presidenciais nos Estados Unidos. O filme de James Ponsoldt é um delírio muito próximo da realidade e nada distópico.

Para muita gente, o livro é mais interessante do que o filme, que vem sendo classificado como techno-thriller por criticar as mídias sociais e discutir a legalidade das invasivas redes sociais e da cultura fã, considerada por muitos pesquisadores da atualidade como Henry Jenkins como uma nova forma de relação social, mais democrática. No entanto, suas ideias carecem de uma discussão mais profunda. Ponsoldt deveria ter  “traído” o livro, mas é uma tentativa interessante.

O multiculturalismo do filme é superficial, como as propagandas que caracterizam a sociedade internacional estadunidense. Os personagens de outras etnias estão representados, mas não são protagonistas, exceto por Ty, que não chega a roubar a cena. Já a amizade entre Annie e Mae é explorada de forma muito adequada, e espelha todas as nuances conflituosas de uma relação entre mulheres num ambiente empresarial.

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Annie e Mae se encontram em convenção da empresa The Circle.

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