Entrevista – Gabriel Mascaro: “Boi Neon” quebra clichês do vaqueiro

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Foto: Alexandre Figueirôa/OGrito!.
Foto: Alexandre Figueirôa/OGrito!.

Da Revista O Grito!, em Londres

Boi Neon, de Gabriel Mascaro, e Jia Zhangke, the Guy From Fenyang, de Walter Salles Jr. são os dois filmes brasileiros integrantes da programação desse ano do BFI London Film Festival que até o próximo dia 18 de outubro estará exibindo 235 obras em suas diversas mostras. O filme de Mascaro participa da mostra Dare (Ousadia) e tem sua primeira sessão nessa sexta.

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A história do vaqueiro vivido por Juliano Cazarré que viaja pelo Nordeste trabalhando em vaquejadas enquanto sonha em largar tudo para começar uma carreira como estilista no polo de Confecções do Agreste, foi premiada nos festivais de Veneza, na Itália e em Toronto, no Canadá e tem recebido elogios da crítica internacional, em revistas de renome como a Variety. Mascaro está em Londres para acompanhar a exibição de Boi Neon e conversou com O Grito!.

O GRITO! – Qual a importância para você da exibição de Boi Neon no London Film Festival?
MASCARO – Depois de Veneza e Toronto é bom ver que o filme está conseguindo manter sua energia em festivais muito expressivos. Boi Neon é o tipo de filme que precisa muito desses espaços para conseguir ter contato com públicos diversos, distribuidores e criar uma trajetória.

Esse é teu segundo filme nesse festival?
Sim. No ano passado Ventos de Agosto foi mostrado aqui, mas eu não pude acompanhar a exibição, então estou muito feliz esse ano por estar presente porque esse é um festival que não tem um caráter tão competitivo em relação a outros grandes festivais, mas ele consegue trazer muitos realizadores e cria a possibilidade de encontros e trocas importantes.

Juliano Cazarré em cena de Boi Neon. (Foto: Divulgação.)
Juliano Cazarré em cena de Boi Neon. (Foto: Divulgação.)

Como você viu a participação de Boi Neon nos festivais de Veneza, na Itália e Toronto, no Canadá?
Foi muito especial. A mostra Horizonte em Veneza, em particular, porque foi nela que muitos filmes que para mim são referências, como O Céu de Suely, de Karin Aïnouz foram revelados nela. E a mostra me interessa bastante porque ela tem preferência por filmes com pesquisa de linguagem e sair de lá com o Prêmio do Júri foi um reconhecimento pelo trabalho tanto da equipe quanto dos atores que se entregaram de corpo e alma ao filme.

O que para você tem feito o filme conseguir, a partir de um tema local como a vaquejada, estabelecer um diálogo mais amplo com plateias de outros países?
Pensando nessa direção eu diria que ele é um filme sobre um lugar em transformação. É ai que ele consegue se comunicar com qualquer cultura, porque os processos de mudanças pressupõem a existência de relações humanas tensionadas que afloram nesses momentos. Então a vaquejada mesmo sendo um elemento muito regional funciona como uma alegoria de um país que se desenvolveu muito rapidamente, mas conserva contradições. Então Boi Neon é um filme sobre as ambiguidades desse desenvolvimento, mas ele não olha para esse desenvolvimento de um ponto de vista saudosista nem tão pouco o condena.

O cartaz do filme. (Divulgação).
O cartaz do filme. (Divulgação).

E como isso é mostrado?
Ele cria um mundo possível. Ele mostra uma relação possível das pessoas com esse momento e brinca com as expectativas e a quebra delas que os personagens vão conduzindo. É um filme muito simples sem grandes transformações existenciais dos personagens, um filme de experiência e que busca fazer uso da forma e da linguagem para provocar discussões.

Quais indagações ele propõe?
Quando o conectamos numa escala mais cosmopolita, ele é um filme que tenta ler o Nordeste brasileiro de uma forma suspensa, integrando-o em questões contemporâneas com relação ao conceito de gênero, provocando uma dilatação dessa questão mais do que uma inversão. Ela é proposital, pois quebra os clichês e estereótipos dessas relações pelas expectativas que se tem por exemplo com a figura do vaqueiro e o papel da mulher.

https://www.youtube.com/watch?v=zQ-mjeM8BmM

Vocês já tem perspectivas de distribuição internacional?
Sim, graças a participação em festivais já conseguimos fechar distribuição nos Estados Unidos com o mesmo distribuidor dos filmes do Jia Zhange-ke, e mais Canadá, Finlândia, Suécia, Turquia e Portugal. E aqui em Londres estamos vendo a possibilidade de termos também a Inglaterra nesse circuito.

E no Brasil quando ele estreia?
Ainda não temos data certa. Depois do Festival do Rio estamos vendo como vamos fazer isso. Quem cuidará da distribuição é a Imovision.

E quais são teus projetos daqui pra frente?
Nas próximas semanas estou indo mostrar o filme em festivais em Varsóvia, na Polônia, e em Adelaide, na Austrália, e depois volto para o Brasil para ficar mais perto da minha filha. Depois vou parar um pouco com cinema e trabalhar numa exposição com instalações e fotografias.