Verissimo
Angelo Defanti
Verissimo, Brasil, 2024, 1h30min, Distribuição: Boulevard Filmes em codistribuição com a Vitrine Filmes e Spcine.
“Eu sou contra a passagem do tempo.”
Há uma beleza quase contemplativa na maneira como a vida cotidiana de um indivíduo pode ser apresentada e documentada com uma abordagem tanto respeitosa quanto curiosa. É com essa perspectiva que Angelo Defanti nos conduz pelos 15 dias que antecedem o aniversário de 80 anos do escritor gaúcho Luis Fernando Verissimo, uma figura tímida e reservada.
Defanti, com sensibilidade de observador perspicaz, escolhe planos que delicadamente estabelecem a distância entre o espectador e a família de Verissimo, conferindo ao documentário um caráter intimista.
A câmera é como um convidado discreto na casa, sentado no sofá da sala de estar ou na área de lazer, capturando os momentos de interação entre Verissimo e seus netos, esposa e amigos. A casa transborda vida, carinho e admiração, criando uma atmosfera de aconchego que envolve o espectador.
É particularmente interessante observar como Verissimo maneja os eventos que o homenageiam e sua interação com admiradores. Suas respostas a perguntas como “qual livro você levaria para uma ilha deserta?” são permeadas de um humor sutil e inteligente — nesse caso, respondendo “Como Construir uma Balsa para Sair dessa Ilha”, seguido de uma risada tímida.
O ritmo do documentário é calmo, quase melódico, desenrolando-se como uma conversa íntima entre velhos amigos. Através da composição visual, Defanti não apenas destaca o ambiente que rodeia Verissimo, mas também sua silenciosa reflexão sobre a própria trajetória. É uma abordagem que honra tanto o homem quanto o legado do escritor.
A interação entre Verissimo e sua esposa Lúcia é talvez um dos pontos mais tocantes do filme. Lúcia, com sua extroversão e sorriso fácil, oferece um contraponto vibrante à reserva de Verissimo. A troca entre eles, cheia de cumplicidade e história compartilhada, oferece um olhar carregado de afeto.
Em um momento durante um dos eventos que participou, ao ser questionado sobre uma frase significativa em sua vida, Verissimo rememora: “quando eu pedi Lúcia em casamento e ela disse sim para mim”.
Em alguns momentos, os diálogos parecem distantes, um pouco difíceis de serem compreendidos. Seja por sons de fundo ou, até mesmo, por escolha própria do diretor, o espectador fica sem saber ao certo o que está sendo dito.
A festa de aniversário é o clímax do documentário. Rodeado de familiares, amigos e colegas, Verissimo observa calmamente o seu mundo com 80 anos. Aliás, comemora com uma caipirinha durante o almoço. “Com cachaça!”, vale lembrar.
Assim, Verissimo não é apenas um registro biográfico, mas uma celebração da vida e do legado de um dos maiores escritores brasileiros contemporâneos. Desde visitas médicas até eventos escolares e até mesmo uma comemoração discreta de um gol durante uma partida de futebol, cada cena reflete camadas da vida e da personalidade do escritor. Para os admiradores, é uma experiência especial.
Leia mais críticas de filmes
- “Wicked”: adaptação do musical da Broadway é tímida, mas deve agradar fãs de Ariana Grande
- “Herege”: com boa premissa, novo suspense da A24 se perde em soluções inconvincentes
- “Gladiador 2” é ambicioso ao explorar os dilemas de uma Roma decadente
- Um “Seu Cavalcanti” para chamar de seu
- “Ainda Estou Aqui”: tomografia de uma família flagelada pela ditadura
