Um papo com o Boogarins: cena musical BR, turnês no exterior e material inédito

PEDRO MARGHERITO BOOGARINS PROMO2019 45
O rock psicodélico da banda Boogarins retorna ao Recife (Foto: Divulgação)

A banda goiana Boogarins, que recentemente fez turnê nos Estados Unidos, retorna ao Recife neste sábado (5) para apresentar seu quarto disco de estúdio, o elogiado Sombrou Dúvida. A apresentação ocorrerá no Baile Perfumado e contará com a experiência visual projetada para o novo disco com Gabriel Rolim nas projeções. O álbum traz um som super imersivo, transitando entre várias estéticas do rock, pop, de forma bem psicodélica.

Composta por Fernando “Dinho” Almeida (vocais e guitarra rítmica), Benke Ferraz (guitarra solo), Ynaiã Benthroldo (bateria) e Raphael Vaz (contrabaixo), a Boogarins tem se destacado nos cenários nacional e internacional de música alternativa. O último disco do grupo foi gravado entre 2016 e 2018, majoritariamente em Austin, Texas, e foi eleito como um dos 25 melhores álbuns nacionais lançados até a metade de 2019 por veículos especializados.

Em meio a um mercado cada vez mais exigente e diversificado, o guitarrista Benke Ferraz aponta que “os brasileiros são músicos mais completos”. E acrescenta: “acho que estamos muito atrás em termos de desenvolvimento de linguagem/estética própria, sem querer generalizar, mas, pelo menos, falando nesse rolê alternativo/independente”.

Eles já subiram em palcos de festivais pelo mundo inteiro. Além do Rock In Rio, Boogarins já fez shows no South By Southwest, Coachella e Primavera Sound! Conversamos com Benke Ferraz a respeito da carreira, das influências da banda, do novo álbum e da apresentação na capital pernambucana. Confira o bate-papo:

Quais discos vocês mais ouviram durante a composição e gravação e que mais influenciaram o resultado?
Acabamos escutando muito Boogarins mesmo, entre demos e versões diferentes de mixagem, entramos num loop de lapidação das canções que nem sei se é tão saudável assim. Mas apesar de não ter nada em específico que nos guiou no momento da produção do disco, homenageamos sonoridades de vários artistas que admiramos, de My Bloody Valentine até Flying Lotus, do Velvet Underground até o Jorge e Mateus.

Qual a diferença entre esses dois primeiros álbuns e Sombrou Dúvida?
A principal diferença entre o Sombrou e os dois primeiros discos é que agora os sintetizadores aparecem na função do baixo em boa parte das músicas. O nível da produção deu um salto significativo, baterias mais encorpadas valorizando mais a tocada do Ynaiã do que no Lá Vem a Morte.

Mais do que as provocações na parte lírica do trabalho, o que vocês buscavam em termos de som pra esse novo passo do Boogarins?
No geral, as provocações líricas são meras consequências do que rola nas tocadas e do que vamos desenvolvendo enquanto banda/arranjadores. Meu processo enquanto produtor / mix também acabou por ser dominante nesse disco e não é um processo que quero repetir. Passar quase dois anos com essas músicas depois de tê-las gravado, tentando achar “o que está faltando”, não sei se é o caminho ideal para uma banda que produz tanto quanto a gente.

O som de vocês é bem imersivo. Como é levar isso para o palco?
Quando começamos a improvisar mais ao vivo, o caminho era o barulho. As guitarras e o baixo se misturavam em camadas de delay e o Ynaiã segurava o pulso e a intensidade com toda sua técnica. Com o passar do tempo fomos ganhando mais dinâmica e outros níveis de textura, sem falar também do quanto ter uma equipe fixa cuidando do som ajuda nesse processo de tentar tirar o melhor de cada palco. Somos uma banda que ao mesmo tempo toca em grandes festivais e casas de show nas capitais, mas ainda se coloca pra tocar em inferninhos, então não poderíamos ser muito puristas… acho que pelo menos nisso ficamos realmente bons, criar climas e paisagens sonoras imersivas independente do equipamento que estivermos usando.

Quais são as maiores influências de vocês? O que inspiram no processo criativo de vocês?
Na banda a gente se influencia mutuamente. Como falei, ficamos muito enfiados dentro desse nosso universo, em turnês constantemente, toda tentativa que é lançada nos improvisos acabam sendo assimiladas pra nossa performance e depois de estar internalizada e aprovada por todos, acaba virando uma nova ideia de canção – que só surgiu porque os quatro estavam ali juntos. “A Tradição”, quinta faixa do disco, é um exemplo disso. Dinho tinha os versos, mas não tinha uma segunda parte – inventamos essa segunda parte improvisando em cima dos acordes da primeira e a letra surgiu na cabeça de Dinho, enquanto repetimos essa nova “ideia” à exaustão.

Vocês são da cidade de Goiânia. Como foi colocar as referências dessa região dentro do trabalho de vocês?
Acho que a maior influência de Goiânia no trabalho é como no final das contas somos só uma banda de rock. Absorvendo desde as grandes bandas de rock tosco que nunca saíram do estado – mas eram gigantes pra gente – até as grandes bandas de “stoner”, que rodaram Brasil e mundo, influenciando toda uma geração de rockeiros goianos. E é isso, não tem muito de “tropicália” ou “rock progressivo” no que tocamos, só somos uma banda que toca bem junta, sem querer pensar em harmonias e melodias bem elaboradas. São riffs tão legais que podem ser repetidos bem muito, com os ataques feitos bem juntos e isso é que dá o impacto pro “show” acontecer. Quando há um grande baterista por trás de uma engrenagem bem encaixada, a coisa tende a parecer “grandiosa”, mas não é de fato. Talvez seja por isso que muita gente fala que “Boogarins é melhor ao vivo”, porque essa energia de banda de rock fique meio perdida nas experimentações dos discos.

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Capa de Sombrou Dúvida, novo álbum da banda Boogarins.

Vocês circulam em festivais aqui no Brasil e no exterior também. Assim, como vocês enxergam o lugar da nossa música além das fronteiras? E como é conviver nesses dois mercados simultaneamente?
Nossa música é muito bem recebida fora do Brasil, as pessoas ficam envolvidas com molejo diferenciado nos instrumentos. No geral, os brasileiros são músicos mais completos, mas como o acesso a equipamentos é muito diferente daqui pros “Primeiro Mundo” – acho que estamos muito atrás em termos de desenvolvimento de linguagem/estética própria, sem querer generalizar, mas, pelo menos, falando nesse rolê alternativo/independente. Tanto que nenhum som de banda/artistas brasileiros que circulam pelos festivais chega a ter 10% da relevância de qualquer artista de massa que saia da periferia. Enfim, nós somos um bom exemplo disso, temos uma carreira internacional única, músicas legais, mas não devemos tocar diariamente em nenhuma rádio goiana.

Diferente do mercado brasileiro, lá fora há uma percepção mais estabilizada de caminhos e espaços pra se ocupar, uma vez que você consiga ter um diferencial – qualquer que seja ele – a performance maluca, um mini hit, etc. Claro que tudo depende de ser vendável pra uma audiência específica, como tudo no capitalismo, mas no geral, tanto nos EUA, quanto na Europa, se você vende 200 ingressos por cidade, você é uma banda muito bem sucedida. No Brasil, a realidade é outra, se ganha menos, o dinheiro vale menos, as estradas são piores pra viajar, os voos são mais caros e é um caminho relativamente longo até chegar nesses 200 pagantes nas capitais. É só fazer as contas.

Vocês vão tocar no Recife no próximo sábado. Pela sua vivência no cenário, vocês sentem que há um mercado de festivais em expansão no Brasil? Essa é uma iniciativa importante pra formação de público?
Não sei se em expansão, mas bons festivais vem se consolidando, outros decaindo – mas não acho que o momento é de expansão pra ninguém, hehe, muito menos para realizadores de cultura. Mas, com certeza, os festivais são importantes para formação de público, e principalmente para a formação dos artistas. São palcos que inspiram novos artistas e criam “metas”, que são importantes para a manutenção psicológica de projetos musicais, num cenário onde não se é muito claro o que é “fazer sucesso”.

O que podemos esperar da Boogarins nos próximos meses? O que o público pode esperar em breve?
Queremos fazer um registro bem “diferentão” do Sombrou Dúvida, estamos bolando isso ainda, mas também temos muito material inédito pra ser lançado. De repente chega algum presente de Natal pra galera, mas 2020 ainda é ano de #sombrouduvida.