Stan Lee, um dos maiores nomes da cultura pop no século 20, morreu aos 95 anos. Criador dos heróis icônicos como Homem-Aranha, X-Men, Pantera Negra, entre outros, ele enfrentava problemas de saúde há vários meses, incluindo pneumonia.
Lee entrou para a história por trazer mudanças profundas no mercado editorial de HQs dos EUA, o que acabou influenciando o mundo todo. Sua visão artística trouxe profundidade e nuances políticas em um ambiente editorial tido como fugaz e abriu espaço para experimentações até então inéditas no meio.
Seus personagens traziam dilemas existenciais e eram próximos de seu leitor, com falhas de caráter e problemas comuns. Além disso, perambulavam por espaços reais, ruas conhecidas de qualquer cidadão americano, um olhar local até então incomum nos gibis de super-heróis. O Homem-Aranha era um jovem nerd envolto em problemas familiares e financeiros que frequentava avenidas nova-iorquinas. Já os X-Men aglutinavam tensões sociais trazidas pelas pautas identitárias dos anos 1960, como a visibilidade LGBT. Eram mutantes enfrentando o preconceito do mundo, mas a analogia com homossexuais era quase instantânea.
Stan Lee, dessa maneira, mudou o paradigma dos gibis de super-heróis ao trazê-los para uma vanguarda discursiva, para um espaço em que pudessem dialogar com questões reais do mundo real. Até então, os personagens criados em meados dos anos 1930 e 40 e que faziam enorme sucesso nos EUA, se baseavam em um ideário grego de seres superpoderosos, quase míticos, a exemplo de Superman, Mulher-Maravilha, ambos da DC. Ou então eram baseados em uma fórmula detetivesca que remonta aos romances de suspense do início do século passado (Fantasma, Zorro).
Os heróis de Lee fizeram sucesso por serem reais, críveis e representarem uma mudança de pensamento que emergia nos EUA e no resto do mundo após as revoluções culturais que se proliferaram a partir dos anos 1960. Como escreveu Gian Danton, Stan Lee “reinventou” os super-heróis. Acrescento que essa reinvenção veio com um entendimento do potencial do gênero para influenciar a cultura pop.
Tal alcance não foi instantâneo e nem foi livre de polêmicas. Livros como Marvel Comics – A História Secreta, de Sean Howe, mostra um outro lado de Lee além do velhinho simpático que vemos nos filmes de Hollywood. Mas, as polêmicas não são o mote desse texto e por isso vamos resumir por baixo dizendo que Stan Lee era antes de tudo um mestre do marketing. Grande parte de suas criações enxergavam uma janela de oportunidade baseado em uma leitura que fazia de anseios e tensões de sua época. É o caso de Pantera Negra, que teve forte influência do grupo político de mesmo nome que lutava pela emancipação da comunidade negra nos EUA.
Nascido Stanley Martin Lieber em 28 de dezembro de 1922, em Nova York, ele tornou-se assistente da Timely Comics assim que saiu do ensino médio, em 1939. Sua estreia se deu em 1941 em uma história do Capitão América. Em 1961 ele criou o Quarteto Fantástico ao lado do colega Jack Kirby. A história de uma família que ganha poderes após uma viagem espacial conquistou os leitores, tanto pelas aventuras quanto pela dinâmica familiar cheia de conflitos.
Com o sucesso ele criou novos personagens, entre eles Homem-Aranha, Hulk e os Vingadores.
Esses personagens começaram a ganhar animações e séries para TV a partir do final dos anos 1970, mas a aclamação veio nos anos 2010 com a criação da Marvel Studios. A inserção de uma pequena participação de Stan Lee em cada uma das produções é um lembrete discreto da importância desse criador que transformou a Marvel em um império midiático e que moldou a cultura pop para sempre. Suas criações serviram de base para um novo modo de criar histórias, o que amadureceu a indústria de HQs de supers e pavimentaram a chegada de novos autores dispostos a levar o gênero adiante.
Stan Lee deixa dois filhos que teve ao lado de sua mulher Joan Lee, que morreu no ano passado.