O Mar Que Me Acompanha
Priscilla Rosa
Editora Castanha Mecânica, 72 páginas, 2022.
Abrir as páginas da obra O Mar Que Me Acompanha e ler os primeiros versos ali escritos é como deparar-se com um resgate real do sonho de toda menina: ser sereia. Para Priscilla Rosa, mulher negra, potiguara e nordestina, que faz sua estreia na poesia com esta obra publicada pela editora independente Castanha Mecânica, a experiência parece ter verdadeiramente acontecido.
A clara confusão em achar que a poeta é sereia tem justificativa: através de uma obra dividida em três atos distintos — quase como um grande espetáculo teatral — que dialogam entre si, nos damos conta ao longo da leitura que estamos navegando pelo amadurecimento de uma vida. As experiências e sentimentos narrados em versos sinestésicos por vezes acalentam o coração e, em alguns momentos, o fazem bater mais forte.
Na primeira parte do livro, os tempos se misturam: através de passagens que relembram as antepassadas, mulheres sereias que já se foram, Rosa mergulha na percepção de crescer. Tudo é novo: o céu, o mar e o amor, nenhum lugar vai ser jamais igual ao ventre materno e, mesmo assim, a vida vale a pena e o mar é um caminho de volta para casa. Com pitadas de misticidade, os versos entregam experiências reais da mulher nordestina, porém tão pessoais à autora. Com esperança, as estrofes passam a sensação de casa de vó, colo de mãe e mais tarde, de se mudar do lar.
No segundo ato, o grande tema é o amor, porém assim como uma criança que cresce, esse sentimento se torna cada vez mais rubro, mais erótico e mais palpável. Trazendo o cenário romântico como perspectiva, os poemas desafiam a Modernidade Líquida de Bauman e se provam duradouros. Com intensidade e sentimentalismo, as palavras continuam afogando o leitor em um mar turvo de sensações e o medo da perda também aparece nos escritos.
Para concluir a coletânea, a terceira e última parte é menor e se volta ao interior lírico. Quem lê os poemas se encanta com a delicadeza das palavras que soam como lições de vida recitadas por uma avó em uma rede à beira-mar. A obra fecha como abriu, tratando do sentimento afetivo presente nas memórias e nos amores e da beleza de ser sereia e nadar entre o caos.
Priscilla escreve de maneira delicada e forte sobre ser sereia, resgatando a criança e a anciã ao mesmo tempo para uma dança. Se utilizando de recursos estilísticos como a não utilização de letras maiúsculas, quebra de palavras por entre os versos e utilização quase nula de pontuação, O Mar Que Me Acompanha segue moldes modernos na construção dos poemas e atrai o olhar e consequente atenção dos leitores.
A leitura do livro pode ser feita online, gratuitamente no site da editora.