NOVOS TEMPOS PARA A RAGU
Com boa curadoria e edição, nova edição de antologia recifense faz parte do bom momento que os quadrinhos vivem hoje no País; autores brasileiros são destaque na obra
Por Paulo Floro
As 240 páginas da edição 7 da Ragu são vistosas, pesadas. É um contraste gritante com o gibizinho fino e preto e branco de sua primeira edição, quase dez anos atrás. Se antes, a antologia de autores alternativos era bastante representativa para seu tempo, este retorno da obra às livrarias assume nova importância: introduz seus autores e editores num panorama mundial de quadrinhistas, apresentando novos e velhos nomes do Brasil e da América Latina.
A Ragu surgiu numa época em que a palavra “quadrinhos alternativos brasileiros” não fazia sentido. Excetuando bem-sucedidas séries infantis, todo quadrinhista nacional tinha seu nível de marginalidade. As primeiras edições da Ragu também eram muito próximas das referências da cidade do Recife, onde foi fundada. Ainda estavam vivos os resquícios do mangue-beat, quando a cidade viveu um surto de auto-estima em diversas formas de arte. O fôlego foi diminuindo – sobretudo pela falta de incentivo financeiro – e quase uma década depois a Ragu surge num contexto mais favorável. Hoje, quase todas as editoras dedicam atenção especial às HQ’s. E quadrinhos como a Ragu, vendida como artigo de luxo e bom acabamento geralmente atrai olhares além daqueles acostumados à arte sequencial.
Esta edição 7 tem capa de Guazzelli. Já começa por aí os acertos da curadoria e edição da obra. Mostrando-se antenados, João Lin e Mascaro foram felizes em chamar um dos mais promissores autores dos quadrinhos nacionais hoje. Eloar Guazzelli, autor da adaptação de O Pagador de Promessas (Desiderata) consegue mesclar experimentalismos com uma narrativa que prende a atenção do leitor. Outros destaques entre os convidados desta edição são Allan Sieber e Chiquinha. Sieber vem produzindo ótimos pequenos contos baseados em uma suposta autobiografia. Ele fez parecido com uma pequena história publicada na revista piauí meses atrás. Aqui, ele se transforma em gato para falar de sua relação conturbada com uma mulher e suas diversas divergências sócio-culturais. Chiquinha, colaboradora da Folha de S. Paulo, não fez nada de muito diferente de seus últimos trabalhos, falando das peculiaridades do jovem contemporâneo, usando linguagem nerd e referência pop.
Marcelo D’Salete, que lançou recentemente NoiteLuz (Via Lettera) e se destacou colaborando para a coletânea Front também traz uma boa história com seu estilo bem característico de desenhar. Fábio Zimbres, que retorna às livrarias este mês com a antologia Vida Boa (Zarabatana) completa a nata de autores nacionais presentes na Ragu.
Os convidados estrangeiros não fazem feio, ainda que não tenha nenhum nome de peso. O cubano Frank Arbello, atualmente vivendo na Bolívia talvez o que mais vale a pena destacar. Ele é autor da importante revista Crash!, mas ainda não tem muita força fora do continente. Avril Filomeno, do Peru é uma das vozes femininas dos quadrinhos na América Latina e tem tido repercussão lá fora pelas articulações que tem feito com outras mulheres autoras de HQ’s. A escolha de colocar a tradução dos balões em formato de rodapé foi arriscado, mas deu certo por mostrar a preocupação em manter a versão original das histórias.
Completam a obra, uma série de ilustrações e a obra do designer e ilustrador Daniel Bueno sobre o artista plástico Saul Steinberg no Brasil. Chama atenção pela raridade do registro que só agora vem à tona. Bueno encontrou os trabalhos durante seu mestrado e foi devidamente autorizado para publicação pela fundação Steinberg.
Numa edição tão bem cuidada, o leitor sente falta de uma melhor apresentação dos autores. Já que, uma das razões de existir de uma coletânea é revelar novos nomes e lançar luz sobre seus outros trabalhos. Realizada com recursos do Funcultura, resta torçer para que a Ragu 8 não demore tanto a aparecer e que outras formas de viabilizar uma edição tão importante apareçam até lá.
NOTA: 8,0
CONFIRA ABAIXO ALGUMAS IMAGENS INTERNAS DA RAGU 7