Dirigido e roteirizado por Bernard Lessa, O Deserto de Akin narra a história de um médico cubano que, em 2018, atua no Brasil pelo programa Mais Médicos. Sua rotina, marcada pelo trabalho em comunidades indígenas e por relações afetivas construídas com Érica e Sérgio, sofre um impacto profundo com a eleição de Jair Bolsonaro e o fim da cooperação entre Brasil e Cuba. Diante desse cenário, o protagonista precisa decidir entre permanecer no país sem poder exercer a medicina ou retornar a Cuba e deixar para trás os vínculos que criou.
No longa, Guga Patriota interpreta Sérgio, personagem que integra o núcleo íntimo de Akin. Médica e artista não-binária, Patriota descreveu seu processo criativo como fruto de um encontro coletivo. “Para mim, a construção de um personagem é a construção de um olhar coletivo sobre aquele indivíduo. Na medida em que eu me aproximo, eu crio expectativas, faço perguntas, tento respondê-las no decorrer do processo e as acolho”, disse em entrevista à Revista O Grito!. “Tento acolher as questões que surgem a partir dos olhares das pessoas que contracenam comigo, a Ana [Flavia Cavalcanti], o Reynier [Morales], também o Bernard, a Elo, a Rosio, toda a equipe técnica, porque essa equipe também é criativa. É a partir do olhar dessas pessoas que essa personagem vai se tornando palpável para mim e vai existindo para mim mesma”, explica.
Patriota também destacou a importância do convívio e das trocas no set para a consolidação da personagem. Segundo ela, perguntas e inquietações foram sendo respondidas a partir da relação estabelecida com o elenco e a equipe, o que contribuiu para uma construção compartilhada.
A trajetória de Guga está ligada aos processos criativos que exploram o corpo, a presença e o percurso como método-intervenção. Como atriz, assumiu papeis de destaque em longas, séries para TV (Globoplay + canais) e curtas-metragens dirigidos por André Antônio, Bernard Lessa e Hilton Lacerda.
Ao falar sobre a parceria com o protagonista Reinier Morales, intérprete de Akin, a atriz ressaltou a sensibilidade presente tanto no trabalho quanto na vida pessoal do colega. “Trabalhar com o Reynier foi conhecer uma paisagem que não está encerrada e ter acesso a uma sensibilidade muito particular, que é muito bonita e inspiradora. Ele é uma pessoa muito doce. Tem algo que ainda não o decifrei e não pretendo, no olhar, que me inspira muito afeto e muito cuidado”, comentou. Para ela, essa presença se reflete no filme e ultrapassa as telas, tornando-se referência em atuação, amizade e postura no mundo.
Sobre a dimensão política do longa, Patriota observou que o enredo abre espaço para refletir sobre o Brasil recente e sobre tendências políticas globais. “Acredito que o simples fato de o filme trazer um contexto político tão recente, naquele período pré-eleitoral, a um governo que foi o governo Bolsonaro, marcado por políticas de restrição a grupos minorizados e a discursos de violência, abre uma janela para dialogar com os dias de hoje, em que vivemos um governo democrático, mas num mundo cada vez mais governado por governos de extrema-direita”, afirmou. Ela acrescentou que a obra mostra como movimentos políticos macro influenciam as relações afetivas e impactam a vida cotidiana de forma micropolítica.
Por fim, Patriota comentou suas expectativas para a recepção do público. “Espero que as pessoas cheguem às salas de cinema e convidem outras para ver o filme, que saiam com perguntas e um olhar diferente daquele com que entraram, permitindo que suas subjetividades dialoguem com aquilo que a gente fez. É um filme bonito, que conta a história de um homem em busca de pertencimento e de vínculos, diante de forças externas e políticas que influenciam sua vida”, afirmou. Para ela, a experiência deve também despertar sensações afetivas: “Espero que sintam a brisa quente de uma praia no verão e saiam conectadas com aquilo que as move, apesar de qualquer força externa que tente nos convencer do contrário”.
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