Com o primeiro álbum, Efêmera (2010), a cantora e compositora Tulipa Ruiz colecionava prêmios e era reconhecida pela crítica e principalmente pelo público, que a segue em suas apresentações pelo país e também pelo exterior (ela já excursionou pela Europa e EUA). Hoje, a artista segue como um dos principais nomes da nova geração de artistas brasileiros surgidos nos anos 10 deste século.
Em seguida, Tulipa seguiu explorando as novas sonoridades do pop brasileiros com discos como Dancê (2015), Tu (2017) e chegou até este ano com o single Tulipa Ruiz e João Donato.
Ela enxerga a conjuntura brasileira com pessimismo: “Nunca foi tão foi tão difícil”, avalia. “A nova realidade é um muro. Só se fala em impedimentos, desaparições, ausências.”
Santista mas que viveu sua infância na cidade mineira de São Lourenço, essa libriana de 40 anos mudou-se para São Paulo e se formou em Multimeios. Filha do guitarrista Luiz Chagas (músico da lendária Isca de Polícia, banda de Itamar Assumpção), ela fez parte de bandas de amigos na época da faculdade, estudou canto lírico, mas achava que a música era coisa para o seu pai e seu irmão Gustavo, hoje produtor de seus discos, além de parceiro e músico de sua banda.
Para celebrar toda essa potência, a multiartista floresce no palco do Meca Brennand 2019, que ocorre neste sábado (14), na Oficina Cerâmica Francisco Brennand, no Recife. Esta será a segunda edição do evento na cidade, que conta ainda com Romero Ferro, Noporn, Mombojó, Shevchenko & Elloco e 9K na programação.
Confira o bate-papo com Tulipa:
Seu último álbum, TU, traz novas versões de canções já conhecidas. De onde veio essa vontade de revisitar e renovar as canções já lançadas?
Eu sei que essa é uma tendência natural dos artistas em um certo momento de suas carreiras, mas comigo aconteceu o contrário. Por motivo de praticidade, de economia, nossas primeiras turnês internacionais foram feitas no formato voz e violão. Eu e o meu irmão Gustavo viajamos o mundo nos apresentando assim. TU foi a vontade de registrar esse trabalho e a novidade, ou melhor, a surpresa, foi o surgimento de novas músicas durante o processo.
O trabalho tem um formato “nude”, como você mesma chama. Como assim?
Esse formato, literalmente, tira a roupa das músicas, ou seja, despe as canções dos arranjos criados para serem apresentadas exibindo a estrutura íntima de cada uma. Isso dá uma importância maior para a voz e, naturalmente, para a letra. Ou seria ao contrário, para a letra e, naturalmente, para a voz?
Como descreve a sua música?
Elas são espécies de retratos do dia a dia, o que não implica em algo meramente descritivo, ou para efeito de registro. São momentos com tudo o que isso pode implicar.
Suas composições são pop e as suas letras estão próximas da realidade, com uma boa pitada de humor. O que inspira você?
Como disse o dia a dia. Com todas as suas implicações, ou seja, não é apenas o que eu vivo, mas o que eu leio, o que eu ouço, o que eu lembro, o que contam, o que assisto, o que acontece e o que me acontece.
Você estudou canto lírico e tem pai e irmão músicos. Sempre pensou em trabalhar com música?
Foi algo natural, acordar com meu pai tocando quando era pequena, ou com minha mãe pondo um disco. Disco. O disco, a música, e a capa, o encarte, a arte. O diálogo estabelecido. Não pensava em ser exatamente cantora mas sempre fui fascinada por esse diálogo.
Você nasceu em Santos, mas criou-se em Minas Gerais. Como esses dois lugares habitam em você?
Na verdade eu só nasci em Santos, que acabou se tornando o lugar onde meus avós moravam, não morei lá, passava férias. Minha primeira infância foi em São Paulo, lugar de correria, frio, bronquite, onde meu pai morava. Minas é o que me liga com a natureza, o mato, o sol, o ar puro. E a música estava em todas as ocasiões.
E você gravou com artistas como Lulu Santos, Céu, entre outros… Como é criar música com outros colegas?
Eu poderia dizer que é algo natural. Gustavo é meu irmão, o Criolo, na época de Víbora, meu vizinho. Mandei um e-mail para o Lulu e O Ilhan de Like This, me foi apresentado pelo Sesc. Ava Rocha, Manoel e Felipe Cordeiro se tornaram parceiros durante almoços e reuniões familiares. Vai acontecendo.
Como você enxerga o atual momento político do país? Como tem recebido o impacto nas artes? Está difícil fazer música em 2019?
A nova realidade é um muro. Só se fala em impedimentos, desaparições, ausências. O impacto nas artes, que já era enorme com a crise financeira, se tornou absoluto com o desinteresse do poder público sobre o assunto, com a má vontade, o mau pensamento, nunca foi tão difícil.
Como você vai florescer no palco do Meca Brennand, no Recife?
Recife pra mim é reencontro de muita felicidade, são muitos shows nessa cidade, meus, do meu pai, do meu irmão, dos meus amigos, real Recife!