A cerimônia do Oscar enfrentou de frente a falta de diversidade de seus indicados. O apresentador Chris Rock foi bastante direto em seu monólogo de abertura ao fazer piada com a decisão da Academia em indicar apenas artistas brancos na categoria de atuação. Foi uma decisão acertada tratar o assunto sem rodeios.
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Ao longo da premiação, a cerimônia fez diversas piadas sobre o #OscarsSoWhite, algumas leves, outras mais duras. Mas todas serviram para denunciar a desigualdade racial não só no Oscar em si, mas na indústria do entretenimento como um todo. “Queremos oportunidade. Queremos que os atores negros tenham as mesmas oportunidades que os brancos”, disse Rock.
Em outro momento ele lembrou os negros assassinados por policiais nos EUA recentemente. “Neste ano, as coisas vão ser diferentes. No segmento In Memorian só aparecerão pessoas negras baleadas por policiais”. Em outra parte deu essa paulada: “Hollywood é uma irmandade universitária racista”. E tirou onda com sua própria escalação. “Se indicassem também os apresentadores, eu não conseguiria este trabalho. Agora vocês estariam vendo Neil Patrick Harris”.
Protesto anulado
Mas as tiradas de Rock tiveram sua cota de controvérsia e algumas piadas soaram tão desnecessárias que poderiam prejudicar a importância de seus ataques ao #OscarSoWhite. Por que atacar Jada Pinkett Smith, atriz que decidiu falar abertamente a favor de um boicote de artistas negros à premiação? “Ela nem foi convidada”, lembrou o apresentador. Também não foi bem recebido quando disse que a comunidade negra nunca protestou pela falta de atores negros nos anos 50 e 60. “Nesse tempo tínhamos coisas reais para protestar, como ser estuprado e linchado pela polícia”.
Esquece Chris Rock que a comunidade negra ainda protesta pelos mesmos problemas dos anos 1950, sobretudo a violência de Estado. O fato de hoje a hipocrisia e racismo de Hollywood estar nos holofotes não inviabiliza outras lutas. Também não pegou bem sua piada racista com asiáticos ao colocar três crianças asiáticas como fiscais da PriceWaterHouseCoopers, fazendo alusão à exploração infantil. Veja a transcrição completa do monólogo no NYTimes (em inglês).
Depois do monólogo inicial ficou claro que a Academia parecia anular o protesto de pessoas como Jada ao se mostrar compreensiva e consciente de suas próprias falhas. Ao elencar diversas estrelas negras como apresentadores de categorias, a grande festa do Oscar estava encobrindo as próprias contradições. Michael B. Jordan, Kerry Washington, Morgan Freeman, Quincy Jones, todos entraram e saíram sem uma linha sobre o assunto. Tudo ensaiado e bonito, mirando a conciliação. Até Spike Lee, que boicotou o prêmio este ano e fez um discurso poderoso contra o racismo na indústria do cinema, foi mostrado no telão com seu Oscar honorário.
Chamou atenção também a apatia dos vencedores, com exceções, em críticar a própria instituição que é a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. Saíram todos dali com a carapuça vestida? As críticas vieram todas da própria cerimônia, que soube se expor suas falhas, mas também se vender como a única mediadora possível para um problema que ela própria trouxe à tona.
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— Chris Rock (@chrisrock) February 29, 2016
A noite teve ainda clipes-montagem sobre racismo e falta de diversidade. Um deles mostrava atores negros ganhando oportunidade em longas indicados. Whoopi Goldberg apareceu como uma faxineira em Joy – O Nome de Sucesso e Leslie Jones (do SNL) como o urso que quase mata o personagem de DiCaprio em O Regresso. Já Chris Rock foi o astronauta negro esquecido em Perdido em Marte.
Em outro clipe, Rock foi até Compton para entrevistar moradores sobre os indicados deste ano. Ficou claro como o Oscar está deslocado da audiência: quase ninguém conhecia os filmes.
O pós-OscarsSoWhite
Em um ano cheio de constrangimentos e onde o racismo foi colocado na berlinda, o Oscar chamou todos os envolvidos na indústria à responsabilidade para mudar este cenário. A presidente da Academia, Cheryl Boone Isaacs, pediu que todos se empenhem para reconhecer o talento de artistas de todas as raças e etnias. Mas há quem diga que, institucionalmente, a Academia poderia fazer mais. Algumas regras já foram mudadas para aumentar a diversidade entre os votantes. Mas será que é suficiente?
Este Oscar entra para a história por se transformar em um palco de debate sobre raça e cultura. Para um evento transmitido para mais de 1 bilhão de pessoas em todo o mundo, é algo de uma força impressionante. Mas o seu maior legado só poderá ser sentido mais à frente, caso alguma mudança efetivamente aconteça em Hollywood. O que ficou claro: seu racismo nunca mais poderá ser ignorado.
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